Um pouco de lógica
“Isto não é uma questão religiosa, é uma questão de Saúde Pública.”
Taí uma frase que o governo não cansa de repetir, especialmente pela boca do nosso querido Ministro da Saúde. Em geral essa frase é usada para “fechar” suas declarações sobre tudo que envolve anticoncepção e, principalmente, aborto.
Mas... o que será que eles querem dizer com isso? Não me parece muito simples de entender, sabe...
Vamos pensar.
Quando dizem que o aborto “não é uma questão religiosa”, estão se referindo, logicamente, aos religiosos que são contra sua prática. Portanto, não se trata de uma questão puramente religiosa, como seria por exemplo a crença em divindades superiores, em destino, vida após a morte, etc. Trata-se de uma questão de atitude moral ligada a crenças religiosas, do tipo “porque eu acredito em Deus, eu sou contra o aborto”.
Mas ora vejam, seria esta uma atitude característica e exclusiva dos religiosos? Acho que não... Dizem até que a maioria dos brasileiros sem religião (incluindo os ateus) são contra o aborto, por questões, dizem, puramente éticas. E, estranhamente, há grupos “religiosos” que se declaram a favor do aborto. Não é, portanto, uma simples questão religiosa.
Então, acho que o que eles querem dizer, na verdade, é:
“Isto não é uma questão moral, ética”
Hum... e quanto à tal da Saúde Pública?
Em geral, eles se referem aos “grandes números” de mulheres que morreriam em decorrência de abortos clandestinos, e às conseqüências sociais do grande número de gravidezes não-planejadas.
Ora, o simples fato de os abortos serem clandestinos faz com que qualquer estimativa deste número seja, no mínimo, uma mera especulação (você sabe como se faz para pesquisar os prontuários de uma clínica de aborto?), razão pra muita gente séria denunciar que esses números astronômicos sejam simplesmente falsos. Ou seja, considerá-los preocupação de saúde pública é uma questão de opinião, uma questão de escolha. Certo?
Sem falar na visão do governo sobre planejamento familiar, de dar dinheiro pras famílias pobres de acordo com o número de filhos, e depois achar que é só sair distribuindo camisinha e pílula que tudo se ajeita. Ora, é óbvio que há vários outros pontos de vista sobre uma política de planejamento familiar realmente voltada para a saúde integral do ser humano, não é? Poxa, acho então que isto também não é uma questão tão óbvia assim sobre saúde pública...
Ou seja, na verdade eles estão dizendo o seguinte:
“Isto é uma questão da política de saúde que resolvemos adotar”
Vamos mesclar as duas frases?
“Isto não é uma questão ética. É uma questão política”.
Aê!!...
Hum... vamos além? Que tal usar uma lógica simples:
A questão não é ética, é política.
LOGO,
A política não necessariamente depende da ética.
LOGO,
"A política está acima da ética".
Ah, agora sim. Claro como água.
Gabriel Resgala - 01.02.08
PS: a versão original do texto, com links explicativos, está em www.humanando.blogspot.com.
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