Paulo Martins aborta manifesto democrático
Numa tentativa de conter uma previsível vitória oposicionista nas eleições de 1978, o general Ernesto Geisel apertou o cerco e em 1977, após fechar o Congresso por duas semanas, introduziu uma série de medidas conhecidas como o “pacote de abril”, alterando as regras eleitorais com intuito de beneficiar o partido do governo (Arena).
Inconformado com estas medidas Beliamino Júlio Miotto, diretor da Rádio Colméia, da cidade de Cascavel, no Paraná, mandou divulgar uma nota escrita pelo jornalista Leopoldo Sefrin Filho, que por meio de metáforas repudiava as novas medidas ditadas pelo ditador.
Ao tomar conhecimento que o texto seria lido pelos locutores da Colméia durante a programação, o então gerente da emissora Paulo Martins, ativo informante dos órgãos de repressão, foi até o estúdio e recolheu o documento, levando-o para o chefe da 2ª Seção, do Grupamento do Exército em Cascavel.
Este fato está registrado entre os milhares de documentos que fazem parte do acervo do arquivo da Polícia Federal de Foz do Iguaçu. Anexado a papelada que trata do caso está o texto que teve sua leitura abortada: “Acaba de falecer esta manhã a respeitável senhora democracia, vítima de mal ainda desconhecido, após recesso parlamentar. Segundo fontes oficiais, a senhora democracia foi acometida possivelmente de um vírus denominado fechamento de questão em torno do caso.
A defunta está sendo velada no lado de fora do salão do Congresso Nacional, após o Presidente da República ter levado um “pacote” de velas ao santuário judicial esta manhã.”
3. Texto de Rui Pires foi parar nas mãos de delegado
Outro caso envolvendo jornalista, aconteceu com Rui Pires, que em 1975 trabalhava na Rádio Matelândia. Num certo dia de outubro, indignado com a situação do País, ele escreveu uma nota que lhe rendeu muitos aborrecimentos. O texto escrito numa máquina Remington da redação era um protesto contra a supressão de eleições nas capitais e municípios localizados nas áreas consideradas de segurança nacional. “O atual regime se diz democrático. Por que então a supressão de autonomia das capitais e dos municípios da fronteira, quando o artigo 1º da Constituição afirma que “todo o poder emana do povo e em seu nome será exercido”, escreveu Pires.
Pois bem, o jornalista esqueceu sobre sua mesa folha de papel datilografada e ela foi parar nas mãos do Delegado de Polícia, 2º sargento PM Benedito Camargo, que a encaminhou ao major responsável pela 2ª Seção do Batalhão.
Rui Pires foi intimado para depor, demitido da Rádio Matelândia e durante anos seus passos passaram a ser controlados pelos agentes dos serviços de informações. Mais tarde foi para Marechal Cândido Rondon, onde se destacou trabalhando na imprensa local e ocupando cargos relevantes na prefeitura local.
4. Baixo meretrício e comunismo internacional
Os arquivos da repressão estão repletos de casos semelhantes aos narrados acima. Vale ainda registrar uma reportagem publicada pelo jornal Hoje Rondon , que era dirigido pelo jornalista Sefrin Filho, e que movimentou a 2ª Seção do 1º Batalhão de Fronteira e deu origem a extensos relatórios.
A matéria que deixou os militares arrepiados foi sobre as condições de vida das mulheres que viviam na Zona de Baixo Meretrício de Rondon. Algumas mulheres foram entrevistadas e contaram para a reportagem a sua origem e como foram parar na prostituição. Quase todas as moradoras da ZBM declararam que eram oriundas do campo.
Apesar da matéria registrar um problema social, real e contemporâneo os militares redigiram o Encaminhamento nº 9S2-78, de 26 de abril de 1978. Diz o documento oficial que “A reportagem do Hoje Rondon – Este jornal foi pra Zona de Meretrício – causou uma reação de revolta e muitas críticas por parte da população do município, tendo em vista o seu teor desagregador da família e em acordo com o esquema subversivo elaborado e preconizado pelo Movimento Comunista Internacional.”
Outro veículo de imprensa, a revista Painel, decana da imprensa iguaçuense, também foi investigada pelos órgãos de repressão. Os olhos e ouvidos dos arapongas estiveram voltados para a revista de José Vicente Tezza por conta dos incisivos e corajosos artigos do advogado Antônio Vanderli Moreira, então presidente do Diretório Municipal do MDB.
Devido as suas vigorosas críticas ao regime discricionário e também pela sua militância social, como foi a heróica defesa dos colonos desapropriados de Santo Alberto, Antônio possui polpudos prontuários nos órgãos de repressão política de Foz do Iguaçu.