UM ANJO CHAMADO LOURIVAL

“Governar é retificar”

Confúcio

Segunda semana de um janeiro mormacento, clima de férias, trânsito calmo num final de tarde.

Eu me aproximo da esquina, diminuo a velocidade a quase zero, e automaticamente, piso na embreagem para engatar a segunda.

Mas só deu tempo de pisar no freio.

Parado, numa fração de décimos de segundo, vi aproximar-se rapidamente do meu Siena um misto de jovem com bicicleta.

O vulto em alta velocidade estourou num baque seco, cabeça e peito no capô, e voou sobre meu carro, caindo do meu lado esquerdo após tentativa inútil de segurar-se no retrovisor.

Ainda imobilizado pelo inesperado do choque, vi um rapaz, sangrando copiosamente, pelos estilhaços do que era, há poucos segundos, o pára-brisa do meu carro.

Automaticamente peguei meu celular e liguei para o 193, depois para o 190: o jovem tresloucado, deitado, lavava a calçada com um vermelho vivo e denso.

O terceiro telefonema, ainda com a adrenalina saindo pelos poros, liguei para minha seguradora: e lá estava, como sempre, o Lourival, presente aos momentos mais complicados de minha vida de cuidadoso motorista, que arrisca todo dia a integridade física e mental nesse mar de loucos e apressados do trânsito de Ribeirão Preto.

Depois de longos e intermináveis dez minutos, os bombeiros do SAMU já prestavam os primeiros socorros à vítima que pagava , com sangue , juros e correção monetária, o preço por sua irresponsabilidade ao entrar numa preferencial, sem os devidos cuidados, e, ainda mais, na minha mão de direção: caracterizados excesso de velocidade e desrespeito às normas básicas de trânsito.

Quanto ao Lourival, como um anjo da guarda, corpo presente, cuidou de tudo: boletim de ocorrência, comunicação de sinistro na seguradora, encaminhamento para oficina especializada e providenciou carro reserva para quinze dias.

Tudo encaminhado resta saber quem pagará pelo prejuízo material.

Com absoluta certeza: eu.

Habilitado há 36 anos, sem ter sofrido uma única multa, segurado, vou gastar com franquia e perda temporária do meu veículo, porque o ciclista apressado não tinha documentos, a bicicleta não possuía nenhuma placa que a identificasse, e, com certeza , ele não teria possibilidade de indenizar-me com seu salário de servente de pedreiro, como fui informado posteriormente.

Pergunto: onde estão as autoridades que não coíbem o livre trânsito desse tipo de indivíduos ?

Não seria o momento de se tornar obrigatória a identificação e o pagamento de algum tipo de seguro, para qualquer veículo que transitasse pelas nossas ruas e avenidas?

Esse jovem ciclista, assim como muitos outros, soltos em alta velocidade e não identificados, são verdadeiros 007, com licença para matar ou morrer: são tão ou mais perigosos que armas de fogo em mãos irresponsáveis e inexperientes.

O anjos da guarda, como o Lourival, só podem amenizar as conseqüências.

ANTÔNIO CARLOS TÓRTORO

ancartor@yahoo.com

Tórtoro
Enviado por Tórtoro em 14/01/2008
Código do texto: T816529