OS OLHARES DAS GAROTAS DOS OUTDOORS
“ Um olhar amigo significa muito. Enriquece quem o recebe, sem empobrecer quem o oferece; dura apenas um segundo, mas a sua recordação, por vezes, nunca se apaga”
Autor desconhecido
Computador é um negócio muito bom: mas só quando funciona.
Ficar sem uma impressora por motivos técnicos causa tanto desespero quanto ficar sem o carro: ambos são imprescindíveis nos dias de hoje.
Tendo que imprimir alguns relatórios, atas de reuniões e cartas vi-me , de repente, sem tinta preta no cartucho de minha impressora. Ato contínuo, passei a imprimir todo o material usando um cinza escuro, utilizando o cartucho em cores: era um quebra galho, que resistiu até esgotar-se , também, o conteúdo em cores.
Parei meu trabalho, e, no dia seguinte, reciclei ambos os cartuchos, com a intenção de continuar meus afazeres domésticos à noite: ledo engano.
Ao colocar os cartuchos reciclados, deparei com um travamento tão geral da impressora que nem um técnico em informática soube dizer o que estava acontecendo: devia ser problema de cabo, e orientou-me a levar a referida ao local onde adquiri os cartuchos, a fim de que se fizesse um teste com o conjunto.
Uma nova manhã tinha início acompanhada de velhos problemas : uma impressora que não queria imprimir.
Comecei a divagar como o humorista José Vasconcelos, na piada sobre o italiano e o macaco, imaginando, por antecipação, como seria atendido pelas funcionárias da empresa de reciclagem de cartuchos: diriam elas que o problema não era o cartucho, diriam que o problema era com a minha impressora e que eles não consertavam esse tipo de equipamento, não saberiam me dizer a quem me dirigir, ou, então , examinariam a máquina, trocariam o cabo, cobrar-me-iam uma quantia exagerada, eu não poderia reclamar porque não havia tido tempo para eu pedir um orçamento, eu ficaria muito aborrecido e ameaçaria nunca mais reciclar cartuchos naquela espelunca onde eu acabava de ser mal atendido.
Nisso, saindo abruptamente dos meus belicosos pensamentos, freio o carro quase em cima do da frente, volto à realidade, e minha atenção é atraída para um outdoor, mais precisamente para os olhos da garota de um outdoor.
Nós nos encaramos mutuamente, e percebo que, mesmo quando o carro entra em movimento, seu olhar continua a me acompanhar: ela é toda atenção somente para mim, parecendo desconhecer as dezenas de outros motoristas que lotam a avenida naquele manhã.
Chegando à empresa de reciclagem de cartuchos fiz a primeira pergunta: vocês consertam impressoras ?
Diante do sim incondicional e inesperado, contei rapidamente a história dos cartuchos adquiridos e desenrolei uma avalanche de perguntas. Tudo foi ouvido pela jovem que me atendeu com um sorriso simpático, atenciosamente, e sempre me passando a impressão de que meu problema não existia: ela e sua empresa eram as cores de que eu precisava no quadro em branco e preto que eu havia pintado para aquele meu dia: ela me recebia com o mesmo olhar especial e individualizado da moça do outdoor.
Mesmo depois que eu soube que o problema da minha impressora era a existência de um dispositivo especial que a travava quando o cartucho utilizado era um reciclado — para mim, uma sacanagem de uma indústria internacionalmente conhecida, que não se importa com as dificuldades econômicas de nossa realidade e quer nos impor a compra de caríssimos cartuchos novos — não consegui mais ficar irritado: o mundo para ficar melhor só precisa de alguns sorrisos de garotas de outdoor.