Raízes da minha identidade profissional: exemplo corporificado.*
*texto apresentado no VI Colóquio Internacional Paulo Freire
realizado no Campus da UFPE(30/08 a 02/09 de 2007) na vivência de Círculos de Cultura, com foco no sub tema "Ensinar exige o reconhecimento e a assunção da identidade cultural".
Nos espaços de educação em que atuo (formação de professores, Conselho Municipal de Educação, fórum de EJA...) e nos que já atuei, tenho realizado um exercício recorrente: relatar minha experiência de leitora e de aluna, com o propósito de demonstrar que minhas vivências pessoais aliadas a experiências vividas na escola de minha infância, foram determinantes para minha escolha profissional e para minha prática como professora. Embora já passadas mais de três décadas, avalio-a como uma experiência que merece ser compartilhada e difundida entre alunos e educadores.
Afirmo que aquela pequena escola do interior, de classe multisseriada, de professora leiga, de condições pedagógicas mínimas, ensinou-me algo fundamental no meu processo de crescimento: reconhecer-me, assumir quem sou, de que lugar eu venho, quais as referências sobre as quais se assentam meu projeto de vida pessoal e de identidade profissional.
Meu relato é pautado na memória. As interações que estabeleci na rotina pedagógica daquele lugar estão categorizadas por mim como experiências de aprendizagens extremamente significativas na construção de Ser. Meu primeiro destaque é a lembrança que guardo, do quanto aquela escola acolhia nossas diferenças e respeitava o jeito de ser de cada um e cada uma, possibilitando a busca da autonomia cognitiva.
Um segundo destaque é que, talvez, pela fragilidade intelectual das professoras da escola à época em que cursava as séries iniciais, não havia muita ênfase nos conteúdos escolares. Em compensação, li todos os livros que me interessavam da modesta estante/biblioteca da escola. O aprendizado dos livros e da convivência com diferentes níveis de aprendizagem dentro de uma única sala proporcionou-me experiências muito interessantes, abrindo-me as portas de um novo mundo. Minha curiosidade, instigada por tantas relações e interações que se estabeleciam e por tantas leituras de meu interesse, foi determinante para as escolhas que fiz posteriormente.
A simplicidade dos gestos das professoras sempre dispostas a acolher, a partilhar o conhecimento que dispunham, a bronquear quando necessário foram importantíssimos como exemplos de profissionais, seres generosos e amorosos, disponíveis para atender as nossas necessidades. Um fato curioso era como se dava o atendimento ao aluno: sempre perguntava a professora se tinha "dever de casa" e ela os fazia para mim. Meus colegas não perguntavam e não levavam o "para casa" e eu achava aquilo muito natural. Compreendia que a “necessidade” de “ fazer o dever de casa " era minha e não deles.
Assumir-me como ser "pensante, mobilizador, criador e realizador de sonhos" tem em sua raiz a organização pedagógica de uma escola que incluía, que levava em consideração a subjetividade de cada um e de cada uma, materializando essa inclusão na oferta de experiências educativas em que todas e todos pudessem expressar-se, socializando e produzindo conhecimentos. Exemplo disso é que, como sempre gostei de vivenciar situações e atividades ligadas a Arte de um modo geral, sempre cantava, representava, lia histórias e poesias em momentos pedagógicos organizados pelas professoras, pelos colegas e por mim.
Outras experiências vivenciadas, embora limitadas pela conjuntura da realidade do lugar e do contexto pedagógico da época, tiveram o sabor da aventura de aprender. Eram os piqueniques à beira do rio, as comemorações das datas cívicas e religiosas importantes para o calendário do lugar, as festas de encerramento do ano letivo. Cada uma delas era a oportunidade para aprender as tramas, os rituais, o vocabulário referente, geralmente oriundo do universo popular.
Ser professora, ser educadora torna-se desejo e projeto a partir das experiências vivenciadas naquele espaço de extrema pobreza material, porém imensamente rico do ponto de vista da promoção humana, da afirmação de valores éticos e estéticos, da garantia da boniteza de cada um e cada uma serem reconhecidos como seres inacabados, em permanente busca do reconhecimento de sua subjetividade e, conseqüentemente, de sua identidade cultural.
Edna Maria Lopes do Nascimento
Maceió Alagoas
edna-lopes@hotmail.com
**Livro-base para a organização desse círculo: Pedagogia da Autonomia, de Paulo Freire.
realizado no Campus da UFPE(30/08 a 02/09 de 2007) na vivência de Círculos de Cultura, com foco no sub tema "Ensinar exige o reconhecimento e a assunção da identidade cultural".
Nos espaços de educação em que atuo (formação de professores, Conselho Municipal de Educação, fórum de EJA...) e nos que já atuei, tenho realizado um exercício recorrente: relatar minha experiência de leitora e de aluna, com o propósito de demonstrar que minhas vivências pessoais aliadas a experiências vividas na escola de minha infância, foram determinantes para minha escolha profissional e para minha prática como professora. Embora já passadas mais de três décadas, avalio-a como uma experiência que merece ser compartilhada e difundida entre alunos e educadores.
Afirmo que aquela pequena escola do interior, de classe multisseriada, de professora leiga, de condições pedagógicas mínimas, ensinou-me algo fundamental no meu processo de crescimento: reconhecer-me, assumir quem sou, de que lugar eu venho, quais as referências sobre as quais se assentam meu projeto de vida pessoal e de identidade profissional.
Meu relato é pautado na memória. As interações que estabeleci na rotina pedagógica daquele lugar estão categorizadas por mim como experiências de aprendizagens extremamente significativas na construção de Ser. Meu primeiro destaque é a lembrança que guardo, do quanto aquela escola acolhia nossas diferenças e respeitava o jeito de ser de cada um e cada uma, possibilitando a busca da autonomia cognitiva.
Um segundo destaque é que, talvez, pela fragilidade intelectual das professoras da escola à época em que cursava as séries iniciais, não havia muita ênfase nos conteúdos escolares. Em compensação, li todos os livros que me interessavam da modesta estante/biblioteca da escola. O aprendizado dos livros e da convivência com diferentes níveis de aprendizagem dentro de uma única sala proporcionou-me experiências muito interessantes, abrindo-me as portas de um novo mundo. Minha curiosidade, instigada por tantas relações e interações que se estabeleciam e por tantas leituras de meu interesse, foi determinante para as escolhas que fiz posteriormente.
A simplicidade dos gestos das professoras sempre dispostas a acolher, a partilhar o conhecimento que dispunham, a bronquear quando necessário foram importantíssimos como exemplos de profissionais, seres generosos e amorosos, disponíveis para atender as nossas necessidades. Um fato curioso era como se dava o atendimento ao aluno: sempre perguntava a professora se tinha "dever de casa" e ela os fazia para mim. Meus colegas não perguntavam e não levavam o "para casa" e eu achava aquilo muito natural. Compreendia que a “necessidade” de “ fazer o dever de casa " era minha e não deles.
Assumir-me como ser "pensante, mobilizador, criador e realizador de sonhos" tem em sua raiz a organização pedagógica de uma escola que incluía, que levava em consideração a subjetividade de cada um e de cada uma, materializando essa inclusão na oferta de experiências educativas em que todas e todos pudessem expressar-se, socializando e produzindo conhecimentos. Exemplo disso é que, como sempre gostei de vivenciar situações e atividades ligadas a Arte de um modo geral, sempre cantava, representava, lia histórias e poesias em momentos pedagógicos organizados pelas professoras, pelos colegas e por mim.
Outras experiências vivenciadas, embora limitadas pela conjuntura da realidade do lugar e do contexto pedagógico da época, tiveram o sabor da aventura de aprender. Eram os piqueniques à beira do rio, as comemorações das datas cívicas e religiosas importantes para o calendário do lugar, as festas de encerramento do ano letivo. Cada uma delas era a oportunidade para aprender as tramas, os rituais, o vocabulário referente, geralmente oriundo do universo popular.
Ser professora, ser educadora torna-se desejo e projeto a partir das experiências vivenciadas naquele espaço de extrema pobreza material, porém imensamente rico do ponto de vista da promoção humana, da afirmação de valores éticos e estéticos, da garantia da boniteza de cada um e cada uma serem reconhecidos como seres inacabados, em permanente busca do reconhecimento de sua subjetividade e, conseqüentemente, de sua identidade cultural.
Edna Maria Lopes do Nascimento
Maceió Alagoas
edna-lopes@hotmail.com
**Livro-base para a organização desse círculo: Pedagogia da Autonomia, de Paulo Freire.