ENTRE A CRUZ E A ESPADA

ENTRE A CRUZ E A ESPADA

Muito comum se usar expressões que designam uma situação dúbia: se ficar o bicho pega, se correr o bicho come. Eis aí a questão. Pensa que vai ajudar e atrapalha e o inverso também é válido. Vejamos.

O indivíduo, desejando prejudicar o outro, intriga-o junto ao patrão e ele é despedido. A intenção era de prejudicar. Todavia ele em saindo daquele emprego, consegue outro melhor, trabalha menos (sábado livre), ganha mais. Houve mérito ao malfeitor? Nenhum, pois a intenção era de prejudicar. Outra pessoa, vendo o homem se afogando num lago profundo, joga uma corda que envolve o pescoço da vítima e ao içá-lo o mata asfixiado. Teria ele culpa desse ato? A intenção era salvar, todavia matou.

Nós costumamos querer ajudar alguém que às vezes não quer ser ajudado. É o caso da senhora idosa que estava numa esquina, como quem aguardasse oportunidade para atravessar, quando um bem intencionado cavalheiro, lhe pegou pelo braço, ela relutante, e a fez atravessar a rua. Do outro lado ela lhe deu uma sombrinhada na cabeça, ela num queria atravessar a rua, estava apenas esperando ali naquele ponto um filho.

O lixo sempre incomoda, seja o nosso, seja o do vizinho e tem sido sério problema a todos. Tem-se visto pessoas que oram, à hora de dormir, pedindo a Deus que venha dele o Reino na Terra, todavia no dia seguinte estão brigando com a vizinha porque lhe varreu o lixo na porta. Há alguns anos a imprensa noticiou um homicídio: o vizinho colocou o saco do lixo defronte a casa dele e ele lhe deu um fulminante tiro.

Temos resíduos de construções e como soe acontecer na vida, nascem profissões e ocupações, no progresso que se vai tendo. Uns costumes desaparecem, outros se cria. É o caso das caçambas coletadoras de lixo na porta da casa. Acontece que o preço se elevou tanto que, sendo pouco o resíduo a pessoa acaba concordando com os catadores de sucata e permitem que por uns trocados eles levem a soca, de qualquer tipo, em geral, de reformar ou construções.

Dia desses, estando efetuando pequena reforma na casa, houve resíduos a serem retirados. Aguardando se acumulassem mais para fretar uma caçamba, permitimos que um desses catadores levasse o pouco resíduo ali jogado na calçada a beira do muro. Perguntamos-lhe onde jogaria aquilo e a resposta foi: onde encontrar vaga.

Ficamos meditando. Achamos feio e sempre a imprensa critica, acumular-se lixo à beira de avenidas, em vários bairros, outros afirmando que os responsáveis por aquilo o fazem à noitinha, às escondidas. Aí lembramos dessas tais vagas citadas pelo catador. Onde já tem um pouco de sucata, que mal se jogar mais um pouco e cada um jogando um pouquinho logo se tem material suficiente para lotar um caminhão responsável pela limpeza pública.

Assim pensando, deixamos de permitir que o catador transporte aquela sucata, pois a vaga que ele vai achar certamente aumentará o entulho em algum canto da cidade. Mas ele, ao fazer aquele serviço, limpando aqui e sujando ali, está ganhando o sustendo da família.

Dia desses, um domingo, foi o dia em que passou um catador querendo retirar um pouco do entulho, o suficiente para encher um carrinho desses feitos com caixa de geladeira descartada. Quanto você quer pelo trabalho, perguntei. Dez reais. Não havia pensado nesse aspecto do “se ficar o bicho come”, permiti-lhe retirasse o restinho de uma reforma. E foi aí que, conversador como sou, dialogando com ele, soube que jogaria numa vaga, que no momento num pensei qual seria, me disse que morava no Jardim Aeroporto, era casado, sua residência um barraco, onde tinha mulher e duas filhas. Havia começado cedo naquele domingo para conseguir o suficiente para o alimento do dia.

E agora, José? Se você ajuda, acaba atrapalhando, notando-se que esse lixo vai ser jogado num terreno baldio enfeando a cidade, tornando-se motivo de crítica. Sai dessa.

Antonio Luiz Cabral – 090106 – alacalado@hotmail.com.