CARTA AO MEU PAI
CARTA AO MEU PAI
Por Aderson Machado
A lembrança que tenho do meu pai é muito grande, e se torna mais intensa no mês de agosto – mês em que ele fazia aniversário.
A propósito, o meu pai nunca deu a mínima importância para esse tipo de comemoração, mesmo em se tratando de seu próprio aniversário. Com efeito, se ninguém de casa lembrasse a data, ele não dizia nada. Isso fazia parte de sua idiossincrasia. Pra ele havia coisas mais importantes para se preocupar – a labuta diária que consumia todo o seu tempo. Praticamente não sabia o que era laser. Trabalhou a vida inteira para criar e educar os seus filhos. Para isso, abdicou de qualquer tipo de luxo. Sequer possuiu um automóvel, mesmo um Jeep, que era um carro pé-duro e muito adequado à região onde vivia.
Lembro-me de alguns traços marcantes de meu pai. A sinceridade era um deles. Da honestidade não abria mão.
Ele sempre foi comedido em suas atitudes. Quer dizer, só fazia o que estava a seu alcance. Não fazia malabarismos nem artifícios de qualquer espécie para possuir as coisas. O pouco que possuía foi conseguido com muito suor e trabalho. Jamais deveu um tostão a qualquer pessoa. Porém, a recíproca não era verdadeira. Fora credor de muitas pessoas desonestas, até que um dia ele “caiu na real”. Sendo sabedor de que uma determinada pessoa que morava na sua região era do tipo que não pagava nem promessa de areia, mesmo morando na praia, ele ficou em alerta. Não demorou, e o dito-cujo veio pedir dinheiro emprestado a meu pai, prometendo-lhe quitar a dívida o mais rápido possível. Diante dessa proposta ‘indecente’, o meu pai foi curto e grosso: “O dinheiro que você está me pedindo eu tenho e não me faria falta. Porém não vou emprestá-lo porque, se o fizer, irei perder o dinheiro e o ‘amigo’. Nesse caso prefiro perder o último”.
Meu pai era um autodidata. Gostava muito de ler. No entanto, era avesso à escrita. A propósito, só agora me dei conta que nunca lhe escrevi uma carta. A recíproca era verdadeira. Quando me ausentei de casa por motivo dos estudos, sempre endereçava as minhas missivas à minha mãe. Ela, sim, gostava de escrever, mas, paradoxalmente, não tinha o hábito da leitura. Era o inverso de meu pai.
O velho Firmino, como era conhecido o meu genitor, gostava deveras de conversar. Sobre qualquer assunto. Como lia bastante e era um bom ouvinte de rádio, não lhe faltava assunto. As suas conversas eram por demais sadias, e até as piadas que contava não eram picantes. Pelo menos diante de nós, meninos, ele procedia dessa forma.
Já com relação à disciplina familiar, era rigoroso ao extremo. Não admitia qualquer tipo de indisciplina de seus filhos. Com efeito, ainda me lembro que quando menino, o meu pai, na hora do jantar, levava um chicote para a mesa com a finalidade de, pelo menos, nos intimidar, posto que costumávamos, nessa hora, fazer muito barulho quando estávamos à mesa, o que tirava o meu pai do sério completamente.
Por outro lado, como bom pai, preocupava-se com o futuro dos filhos – éramos sete! Que sacrifício para nos manter nos colégios! Mormente para quem, naquela época, morando na zona rural, quando tudo era difícil no intento de se garantir uma educação formal. Para concretizar esse objetivo, teve que comprar casa na cidade, porquanto o ensino na zona rural, àquela época, praticamente não existia.
Mas, no frigir dos ovos, o meu pai foi um vencedor! Conseguiu criar e educar todos os filhos. Era esse o seu objetivo maior.
Por isso todos somos eternamente gratos a ele.