IMPUNIDADE: UMA DESGRAÇA NACIONAL
O jogador de futebol Edmundo, o animal, chuta violentamente, num treino, um jovem colega de profissão recentemente promovido para a categoria profissional: o agredido é retirado do treino, e o agressor nem ao menos é repreendido verbalmente.
O presidente do Congresso tem uma filha com a amante, tem suas contas pagas por uma empreiteira e, por pouco, não é considerado vítima indefesa de uma mulher sem caráter: a esposa o defende e políticos tentam blindá-lo.
Um adolescente de 14 anos queima o cabelo da professora com um isqueiro e não recebe nenhuma punição por isso: o caso foi considerado de “pequena proporção” pela diretoria da escola.
Cinco jovens universitários agridem violentamente uma empregada doméstica num ponto de ônibus do Rio de Janeiro: o pai de um deles declara que os pais não têm culpa, e que acha um absurdo “crianças” estarem presas por esse simples motivo.
Meu Deus, onde estamos ?
Trabalho diariamente com jovens estudantes adolescentes. Sou Orientador Educacional — uma profissão de risco, como a de professor, que pode ser agredido a qualquer momento , verbal ou fisicamente — e preciso trabalhar tendo como base valores éticos, princípios de respeito ao próximo, determinação de limites, buscando sempre refletir sobre fatos que costumam ocorrer, seja com pais conscientes, seja com desnorteados, e também com alunos maduros ou completamente agressivos e mal educados.
E como fazer isso instalado e mergulhado num universo que apresenta contra-exemplos a cada dia , a cada notícia nos jornais, a cada minuto da televisão ?
Onde buscar reforço para advertir — já nem digo punir — um aluno que agride seu colega de sala, diante da reação (ou falta dela) do treinador do Edmundo ( um ídolo para muitos jovens e crianças ) ante uma agressão covarde e desnecessária ?
Como falar sobre respeito ao próximo a um aluno que desrespeita seu professor, mesmo que verbalmente, quando uma Secretaria Estadual de Educação informa que nenhuma atitude será tomada no caso em questão porque foram queimados somente “alguns fios de cabelo “ ?
Como orientar um jovem para que respeite sua esposa e sua família, não mantendo relações amorosas fora do casamento, quando a esposa de um Senador o defende em cadeia nacional, dizendo que ele é somente mais uma vítima de mulheres fáceis a procura de ganho fácil ?
Como ensinar o respeito ao próximo e às minorias quando domésticas são agredidas violentamente por universitários e um índio é queimado impunemente nas ruas, por jovens abastados, cujos pais consideram tudo isso brincadeiras de crianças ?
Estamos , enfim , mergulhando num mundo onde volta a imperar a lei do mais forte, um mundo em que ética e valores são relativos, um lugar em que a palavra empatia desapareceu da vida de cada um e dos dicionários: estamos ficando piores do que os animais.
Sinto náuseas diante desses sinais de fim dos tempos em que os pais, os principais responsáveis por aquilo em que se transformaram seus filhos, não passam de neo-Pilatos: vivem lavando as mãos e culpando o governo, a escola, a sociedade e, quando não conseguem argumentos palpáveis para defender as más atitudes dos filhos, terminam a conversa dizendo : concordo com que ele não esteja agindo bem, mas não fez nada de mais sério, e nós não gostamos do jeito como você falou conosco — tornando, assim, qualquer contra-argumento subjetivo e inútil pois só se 4quer discutir o invólucro e não o conteúdo.
É preciso, com urgência, perceberem que não pode mais ser proibido proibir: é preciso ter a coragem de educar sem medo.
ANTÔNIO CARLOS TÓRTORO