Comentando as eleições das SETE NOVAS MARAVILHAS DO MUNDO
Há milhares de anos, na Grécia Antiga, os pensadores gregos, baseados em sua própria cultura, elegeram dentre as construções humanas conhecidas da época sete às quais ficaram conhecidas posteriormente como as Sete Maravilhas do Mundo Antigo. Os gregos antigos se limitaram a catalogar as construções que eles próprios conheciam. Além desta limitação geográfica de conhecimento de mundo, vale lembrar que as únicas Maravilhas não-helênicas foram as Pirâmides de Gizé e os lendários Jardins Suspensos da Babilônia. E Petra, conhecida pelos gregos, por sua vez, não foi considerada. Isso demonstra que a elite intelectual grega que elegeu as Sete Maravilhas do Mundo centrou-se em sua própria visão de mundo, limitada pela falta do conhecimento de outras civilizações e pelo etnocentrismo elitista grego.
Com o passar do tempo, a eleição das Sete Maravilhas pelos antigos gregos virou uma lenda e se popularizou na cultura mundial, ainda mais com a permanência histórica apenas de uma delas, justamente as não-helênicas Pirâmides de Gizé. E já por aí vemos que o critério de uma Maravilha não pode ser o de tempo de duração, já que as demais seis foram desmanteladas. Na Modernidade, período em que vivemos, vários pensadores tentaram eleger as Sete Novas Maravilhas no Mundo Moderno, em homenagem à tradição grega da Sete Antigas. Várias construções humanas passaram pela análise de peritos em tecnologia, a fim de que as Sete eleitas representassem a maior expressão da habilidade humana em se superar em grandiosidade e beleza, porém, todas as eleições que ocorreram não se tornaram populares, tampouco unânimes. Assim sendo, por que repetir o erro grego de permitir que uma elite intelectual decida quais merecem o título de Maravilhas se não vivemos mais em um período dividido em Gregos e Bárbaros? Desta forma, a fundação New7Wonders, em parceria com a Unesco, se utilizou do método mais moderno de se eleger algo: a votação democrática moderna. Assim, toda a população mundial foi convidada para um gesto único na história universal: participar de uma eleição mundial, ou seja, qualquer pessoa com acesso à mais essa tecnologia da Modernidade, a Internet, poderia votar aos candidatos de sua preferência individual. O resultado se daria pela maioria de votos, do primeiro mais votado ao sétimo mais votado. Simples assim.
Da forma mais democrática possível, ou seja, a forma mais moderna, mais avançada para se eleger algo, foram eleitas, por fim, e reveladas ao dia sete do mês sete de dois mil e sete, as Sete Novas Maravilhas do Mundo. Contudo, é preciso analisar agora o merecimento histórico da eleição de cada Maravilha.
Já vimos que a eleição não poderia ser mais justa do que uma eleição popular individual, um verdadeiro e literal Sufrágio Universal, sem acepção de qualquer critério social. Portanto, debater sobre a forma eletiva será inútil: as mais votadas ganharam. Mas elas mereceram isto, digamos, falando em História Universal?
Ainda mais um ponto gostaria de ressaltar. Não devemos chamar as Sete Novas Maravilhas de Maravilhas DO Mundo Moderno. Erro gravíssimo! Com a exceção da estátua do Cristo Redentor, nenhuma das demais Maravilhas foi construída na Modernidade: Petra, o Coliseu e os templos maias são construções da Antigüidade; e Machu Picchu e o Taj Mahal foram erigidas em plena Idade Média, da história universal, e a Grande Muralha foi construída ao longo de muitas dinastias, levando séculos para ser concluída. O Cristo é o único monumento literalmente moderno. Neste sentido, o correto é dizer: As Sete Maravilhas NO Mundo Moderno. O que nos leva ao ponto seguinte: mediante tantas construções da mais alta tecnologia DO mundo moderno, qual foi o critério para que as Novas Maravilhas fossem eleitas? Qual seu significado para a história universal humana? Qual sua importância cultural? Realmente expressa a manutenção elevada de uma civilização? Estas foram as perguntas imediatas quando foram anunciadas as Novas Maravilhas, principalmente quando se nota a mais discrepante, aparentemente, dentre elas: a estátua do Cristo Redentor.
E então por uma primeira observação se notam construções que ultrapassaram a extinção de suas civilizações, como o Coliseu, as ruínas do império Inca, as ruínas da civilização Maia, e um mausoléu que pode ser considerado a maior e mais luxuosa prova material de amor entre duas pessoas, por exemplo. E lá está o Cristo Redentor, construído há menos de cem anos! É tempo suficiente para acumular um significado histórico de civilização? E é, melhor dizendo, o símbolo de uma civilização? Eu respondo que sim. Na verdade, é o segundo monumento mais significativo dentre as Sete Novas Maravilhas.
As concorrentes às Sete Novas Maravilhas no Mundo Moderno foram escolhidas com o critério de representarem um monumento da humanidade e que representasse a história da própria humanidade (se bem que as ruínas de Machu Picchu e de Petra não são ruínas de monumentos, mas de cidades). Contudo, desta forma, é o Coliseu o monumento que mais representa esta história, porque o Coliseu é um símbolo de Roma, e Roma foi o império responsável pelas bases da civilização ocidental. Todo o ocidente hoje, antes de ser capitalista-judaico-cristão-industrial-europeizado, é um ocidente romanizado. Desta forma, o Coliseu é um símbolo não somente da civilização romana antiga, mas de toda uma civilização ocidental, que ultrapassa os limites fronteiriços dos países dentro e fora da Europa.
O segundo símbolo, dentre as Sete Maravilhas, de igual representação, mas posterior ao império romano, é justamente a estátua do Cristo Redentor. E por quê? Ora, quem é a figura histórica óbvia representada na estátua? É o judeu Jesus Cristo, o precursor do cristianismo, mais um aspecto da civilização ocidental. Na verdade, nem o Cristo judeu nem Roma representam a Idade Moderna em que vivemos, mas o que representa a Idade Moderna é o ocidente judaizado-cristianizado e romanizado. Assim, somente o Coliseu e o Cristo Redentor representam uma civilização que subsiste até hoje e se mundializou: a civilização ocidental, que superou, em terreno e em tempo, qualquer civilização antiga, por mais maravilhosa e rica que tenha sido. E como observação, se a Estátua da Liberdade fosse eleita, o que creio que merecia, pelo seu significado político, ela seria a terceira Maravilha de maior significado, por representar a liberdade, a democria constitucionalizada e o individualismo modernos, fechando, desta forma, tudo o que representa a civilização ocidental. Contudo, ficamos sem esta.
Após estes monumentos, temos aqueles que representam a passagem de uma grande civilização localizada, que não se mundializou, mas que deixou sua marca como uma elevação do espírito humano. E temos então aí as Muralhas da China, as ruínas de Petra, as ruínas de Machu Picchu, e as pirâmides maias. Neste critério de grandes civilizações não tão expansionistas quanto a civilização ocidental - e que não mais existem, com exceção dos resquícios de uma cultura maia, com seus descendentes, e da China, que ainda existe, mas não é a mesma do tempo de suas muralhas -, outras construções ficaram de fora, como as misteriosas estátuas da Ilha de Páscoa, ou até mesmo Stonehenge, na Inglaterra.
E, por fim, temos a eleição de uma construção particular que não teve a intenção de representar sua civilização, mas sim foi uma grande superação individual do espírito humano, e simboliza uma das maiores provas de amor na história da humanidade, que é o Taj Mahal. O Taj Mahal não representa a civilização indiana, ou hindu - ou mesmo a civilização oriental, do contrário de Petra, ou da Muralha. Na verdade, obstante ser o monumento mais belo e suntuoso das Novas Sete, é ele o monumento mais discrepante dentre os eleitos, embora, ao mesmo tempo, seja o mais próximo, junto com as pirâmides maias, dos critérios adotados pelos gregos antigos.
Mais um critério importante de ser analisado é o de que uma Maravilha deve ser um monumento original, de difícil ou mesmo impossível reprodução, e que tenha sido erigido de forma sublime. É aí que pode surgir a crítica mais plausível contra a eleição do Cristo Redentor como uma Maravilha. De certo, construir o Cristo Redentor não foi mais difícil que construir um Taj Mahal, além disso, com a tecnologia que possuímos é possível construir várias estátuas do Cristo em diversos lugares do mundo, até mesmo maiores. Contudo, se este for um critério a ser discutido, quem prova que quaisquer das Maravilhas Antigas também não puderam ser reproduzidas? Quer dizer que não há mesmo nenhum paralelo entre as pirâmides egípcias e as pirâmides maias? E quanto ao Colosso de Rhodes (que só perdurou por pouco mais de 50 anos e só não foi construído outro devido a um oráculo proibitivo) e a Estátua da Liberdade? E quanto ao Mausoléu de Halicarnasso e o Taj Mahal (muito maior que Halicarnasso)? E quanto ao Farol de Alexandria e a Torre Eifel? E quanto ao Templo de Ártemis e a Capela Sistina? E quanto aos Jardins Suspensos da Babilônia e Machu Picchu? Ou mesmo quanto à Estátua de Zeus e a Estátua do Cristo Redentor? Imaginem se pudéssemos transportar do passado os intelectuais gregos que elegeram as Sete Maravilhas Antigas e os colocássemos diante de cada Nova Maravilha, eles não teriam concordado com pelo menos a maioria das eleitas? Será que se os levássemos para diante da Estátua do Cristo Redentor, a mais de 700 metros de altura, diante da visão panorâmica da Baía de Guanabara, eles teriam realmente alguma dúvida, alguma crítica a fazer? Ou seja, há muitos critérios a serem debatidos, e em qualquer critério que se adote para definir o merecimento histórico de cada monumento surge um novo impasse. Portanto, a questão principal é definir qual é o significado político histórico de cada monumento em relação à história humana universal.
Por isso, é interessante observar que a eleição das Sete Novas Maravilhas do Mundo foi uma eleição política de compensação. Basta notar que os monumentos eleitos estão localizados em países marginalizados na evidência da participação dentro da história universal humana moderna: México, Peru, Brasil, Índia, Jordânia, e China. O Coliseu é o único monumento não só na Europa, como em um país dito de Primeiro Mundo, visto ainda que a última manifestação da Itália em evidência na história universal após o Renascimento do século XVI foi sua participação negativa na II Guerra Mundial, no chamado Eixo do mal.
Desta forma, os países detentores das localidades das Novas Maravilhas poderão usufruir de sua nova ostentação política como uma compensação pela marginalização da evidência na história universal, legada pelos países mais poderosos, que, aliás, criticaram fortemente a eleição, chamando-a de injusta - como se a eleição das Maravilhas Antigas tivesse sido justa. Porém, a crítica se deu porque seus próprios monumentos turísticos não foram eleitos em detrimento dos monumentos situados no dito Terceiro Mundo, ou seja, aplicam como argumento o mesmo argumento etnocêntrico elitista dos gregos antigos.
Mais alguns pontos. Temos que a eleição das Novas Sete Maravilhas também foi um evento comercial, um espetáculo de marketing. Até aí nenhuma crítica, nada mais moderno e ocidental. E também podemos observar que, com relação ao sistema de votação, os países mais populosos tiveram vantagens sobre os países menos populosos, o que acarretou num favorecimento de votos para os monumentos localizados naqueles países, como o caso do Brasil, do México, da Índia e da China. Bem, assim funciona a democracia mesmo, é o voto da maioria, é o sistema da democracia moderna, foram as “regras do jogo”.
Por outro lado, temos ainda países que não foram representados nesta competição, mas cuja sociedade é ela própria uma maravilha, no sentido da elevação do espírito humano, como é o caso do Canadá, Austrália, Islândia, Noruega, Suécia, Dinamarca e Finlândia, com as melhores qualidades de vida do planeta, índices quase nulos de analfabetismo, violência e desigualdade social, sendo eles próprios maravilhas vivas da humanidade na terra. Estes não precisam de um símbolo político de afirmação perante a história universal. Por isso, reitero, as Sete Novas Maravilhas são um símbolo de compensação e têm um significado histórico e universal político muito maior do que as Sete Maravilhas Antigas, por tudo o quanto foi explanado neste artigo. E se a preocupação for com a popularidade das Novas Sete fica a dúvida se as Sete Antigas também encontraram dificuldades em ser populares e justas com as demais civilizações de sua época ou se elas levaram séculos para se tornarem uma tradição a ser seguida.
Vitor Paulo Pereira Junior