O PIANISTA
Alguns pais não conseguem ver como investimento o dinheiro utilizado com uma formação escolar de primeira qualidade.
Ao primeiro sinal de dificuldades do filho em conseguir boas notas no decorrer do ano letivo, alguns pais buscam como alternativa a transferência do aluno para uma escola em que as exigências e os gastos sejam menores.
Um exemplo concreto do valor de uma substancial formação me foi dado conhecer quando ainda lecionava na Escola SENAI.
Um aluno, cujos pais eram parte da elite de um governo deposto da América Central, contava para professores e colegas que sua família havia deixado tudo para trás, mas que a sobrevivência no Brasil só havia sido possível porque seu pai havia feito um curso de mecânico de aviões, e esse conhecimento que, no país de origem nada valia, tendo em vista o alto cargo que exercia, agora representava a possibilidade uma vida digna num país estranho.
Recentemente, assistindo ao filme “O Pianista” , drama sob a direção de Roman Polanski, revi a cena em que Adrien Brody , no papel do pianista clássico, o polonês Wladyslaw Szpilman, é descoberto pelo Capitão Wilm Hosenfeld ( Thomas Kretschmann), num dos muitos prédios abandonados espalhados pelo Gueto de Varsóvia, devido à 2ª. Guerra Mundial, e consegue alimento e ajuda quando se declara pianista e, maltrapilho, faminto e tomado pelo medo, senta-se ao piano oferecido a ele pelo nazista, e inicia a execução de uma peça clássica.
Naquele instante, ele nada possuía de bens materiais, sua figura somente inspirava repulsa e desprezo, mas, ao som dos primeiros acordes, sua dignidade humana foi imediatamente restaurada.
É uma história real como muitas outras, em que vale o que se sabe e não o que se tem, em que vale a cultura e a educação e não o dinheiro, em que vale o espírito e não a matéria.
Nesse momento em que nossos governantes reduzem a média necessária para aprovação para cinco, com arredondamentos de quaisquer décimos para o valor inteiro mais próximo acima, e em que a aprovação é automática, fica patente a falta de compromisso do governo com a qualidade de cidadão que será colocado no mercado de trabalho: um bando de semi-analfabetos que não conseguirão assinar devidamente nem o próprio nome.
Paulo Freire, em seu livro “Pedagogia da Esperança” , afirma que pensar que a esperança sozinha transforma o mundo e atuar movido por tal ingenuidade é um modo excelente de tombar na desesperança, no pessimismo, no fatalismo, mas prescindir da esperança na luta para melhorar o mundo, como se a luta se pudesse reduzir a atos calculados apenas, à pura cientificidade, é frívola ilusão.
Por isso é preciso associar a pedagogia da esperança, como concepção da educação, à pedagogia da luta: a educação deve ser mais um ato de construção de conhecimentos do que a simples transmissão de informações.
É preciso insistir na permanência do aluno em uma escola que exija do educando luta e persistência na busca de seus objetivos, e que tenha compromissos com o seu futuro: precisamos de pianistas.
ANTÔNIO CARLOS TÓRTORO