O HOMEM QUE GANHA A VIDA ENGRAXANDO SAPATOS

Pergunte para qualquer pessoa que mora em Goianésia onde encontrar Santino dos Santos Cunha. Possivelmente, ninguém saberá de quem se trata. Agora se a procura for por Regaço, o engraxate, todos saberão e informarão com detalhes.

Aos 43 anos de idade, 25 deles dedicados ao ofício de engraxar sapatos, Regaço é uma figura muito popular e querida pelo povo da cidade. Nascido na zona rural do vizinho município de Santa Rita do Novo Destino (na época pertencente a Barro Alto), ele é o terceiro mais velho de uma família de dez irmãos.

Homem simples de índole e de hábitos, Regaço trabalha de domingo a domingo para colocar o pão de cada dia em sua casa, onde mora sozinho. “Não constituí família ainda porque não quis. Acho que já me acostumei a cuidar de mim mesmo, de fazer as minhas coisas”, justifica.

Ele conta que ganha em média de R$ 1.100,00 a R$ 1.200,00 por mês com a atividade. “Tudo que tenho na vida foi tirado da graxa. Tudo veio do suor do meu rosto”, conta, com a simplicidade que lhe é peculiar. “Esta é a profissão que sei exercer. Já tentei trabalhar na lavoura, mas mal dava para comer. Prefiro engraxar sapatos”.

Regaço não tem uma vida de luxo. Mas também não conhece a miséria. Da graxa conseguiu construir sua casa, comprar moto e carro. “Além de me manter, sem nunca pedir nada para ninguém. Tenho orgulho do meu trabalho”, acrescenta.

Ele admite que já foi alvo de preconceitos. “Tem gente que fala que isso é trabalho de criança. Mas não ligo. É uma profissão digna como outra qualquer”.

Amizades

Regaço é muito conhecido e conhece muita gente. “Tenho amigos demais. Sou uma pessoa que gosta de fazer amizades. Não olho a posição social. Se me tratam com educação, retribuo”, explica.

Já rodou toda a cidade com sua caixa de engraxate nas costas. Há dez anos ganhou do então prefeito Otavinho (PSDB) um pequeno cômodo no coreto da Praça Laurentino Martins, a principal de Goianésia. Lá guarda seus materiais e atende sua vasta clientela, que vai de pessoas comuns a juiz, prefeito e deputado.

“Tenho entre meus clientes o prefeito Jalles Fontoura (PSDB), os ex-prefeitos Otavinho, Helio de Sousa (DEM, hoje deputado estadual) e Gilberto Naves (PMDB), o juiz André Lacerda, empresários, gerentes de bancos. Já lustrei sapato até do [cantor] Amado Batista. Mas o forte mesmo são as pessoas comuns, do dia a dia”, conta.

O apelido, revela, o acompanha desde que era criança. “Alguém me chamou de Regaço e a alcunha pegou. Hoje ninguém me conhece pelo nome. Mas se falar Regaço todos sabem quem é”, revela.

Política

Atualmente, Regaço não cultiva uma participação ativa na vida política de Goianésia. É um pacato cidadão à paisana, que acompanha os fatos, fazendo do trabalho seu passaporte para o desenvolvimento da cidade.

Mas nem sempre foi assim. Foi filiado ao PMDB por 18 anos. “Passei na convenção em 1996 para ser candidato a vereador, mas na última hora o então prefeito Gilberto Naves me pediu para ocupar uma função importante, que não me permitiu disputar o pleito. Aceitei e não fui candidato”, lembra. “Depois disso já me convidaram umas três vezes, mas não aceitei. Acho que passou o momento”.

Foi fiel ao PMDB até 2008, quando se aproximou do grupo político de Jalles e Otavinho. “Senti-me desvalorizado onde eu estava. Não pelo Gilberto, que sempre me tratou bem, mas por algumas lideranças. Não pedi nada, a única coisa que quero é ser respeitado”, desabafou.

Mas, de acordo com Regaço, são águas passadas. “Sou amigo de todos eles e hoje não tenho militância política”, garante. “Só tenho a agradecer ao povo de Goianésia por acreditar no meu trabalho. Sou grato também à Câmara Municipal por, em 2009, ter me concedido título de cidadão goianesiense”, relata. “É uma grande emoção ser conhecido oficialmente como filho de Goianésia”, finaliza.

Sempre com um sorriso no rosto, Regaço não vê tempo ruim. Exerce seu ofício como se cumpre um sacerdócio. Seu trabalho é deixar os sapatos de quem o procura brilhando e dignos. E isso ele faz com a grandeza de um artista.

Anderson Alcântara
Enviado por Anderson Alcântara em 24/01/2015
Código do texto: T5112169
Classificação de conteúdo: seguro