FOTO E POESIA
“O poema é um lance de dados que jamais eliminará o acaso”
Mallarmé
Ferreira Gullar escreveu, em um de seus artigos para a Folha: “O poema não é a expressão do que se viveu ou experimentou. Se eu sinto um cheiro de jasmim na noite e escrevo um poema sobre esse fato, o que faço não é expressar tal experiência, mas, na verdade, usá-la como impulso para inventar uma coisa que não existia antes: o poema, o qual se somará a todas as galáxias, planetas, cometas, oceanos e tudo o mais que exista no universo. E o universo será, a partir de então, tudo o que já era, mais aquele pequeno agregado de palavras, nascido de um perfume”.
É assim o processo que ocorre em mim quando me proponho a escrever textos poéticos, tendo como motivação o trabalho dos fotógrafos do grupo Amigos da Fotografia, de Ribeirão Preto.
Penso que as pessoas que visitam essas exposições de textos e fotos não deveriam se ater ao texto antes de admirarem as fotos, porque o texto revela o que eu, seu criador, senti , sem que, necessariamente, todas as pessoas tenham que sentir a mesma coisa : os poemas não têm uma forma inevitável.
Se, em algum momento , durante o processo de criação , eu tiver que pensar no que os visitantes da exposição pensarão sobre a foto, para tentar buscar uma coerência única possível entre foto e texto , abortarei de tal modo o processo, no seu nascedouro, que não conseguirei escrever um verso sequer.
É tão aleatório o resultado dessa criação que , a mesma foto, dependendo do momento em que eu escrever o texto, conterá em si nuances de sentimentos , às vezes, até diametralmente opostos: posso chorar, rir , ficar indignado e até mesmo ignorar uma mesma foto , dependendo do meu estado de espírito naquele momento, e isso tudo porque a foto na qual me inspiro também é , para mim , intuitivamente, arte: e esse não é o momento de se discutir se fotografia é ou não arte porque nenhuma teoria, ( essencialista, estético-psicológica, da indefinibilidade da Arte, institucional, simbólica, de Goodman, etc) conseguiu definir o que é arte e nem quando há arte.
Escrever textos poéticos para as fotos dos meus amigos do grupo é fonte de prazer estético, aquele prazer que sentimos ao ler um bom livro, ao observar um quadro, ao ouvir uma música, ou seja, quando nos sensibilizamos e experimentamos um estado emotivo ou lírico diante de algo que consideramos belo.
Enfim, tenho sentido nas pessoas que visitam nossas exposições a manifestação de duplo prazer proporcionados por texto e foto , ambos produzindo, isoladamente ou em conjunto, momentos de êxtase e satisfação àqueles que têm olhos e corações sensíveis, e mentes abertas para a interpretação do mundo feita pelos seus semelhantes, em consonância ou não com as suas.
Pretendo, enquanto me for possível, continuar juntando meus agregados de palavras às imagens clicadas por meus amigos, e , assim, somar algo ao universo já existente, brincar de Deus.