QUARENTA ANOS DE SILÊNCIO
Símbolo da resistência à ditadura militar e herói da luta camponesa em Trombas e Formoso na década de 1950, José Porfírio de Souza continua oficialmente desaparecido. Na sexta-feira (7) completou 40 anos desde que ele saiu da prisão em Brasília (DF). Entre as muitas possibilidades do que aconteceu com o líder a mais robusta é a de que ele tenha sido vítima dos monstros da ditadura militar, instaurada no País em 1964 e que durou, oficialmente, até 1985.
Porfírio, que chegou a se eleger e exercer parte do cargo de deputado estadual nos anos 60, é um dos 15 mortos ou desaparecidos do regime de chumbo em Goiás. A Comissão Nacional da Verdade (CNV), criada para investigar violações aos direitos humanos ocorridas entre 1946 e 1988, tenta garimpar algumas pistas sobre sua história.
Algumas versões povoam os arquivos da CNV. Em uma delas, Porfírio teria deixado a prisão, acompanhado de uma advogada em 7 de junho de 1973, ido de ônibus até Goiânia, dormido na casa de um amigo e, no dia seguinte, sacado dinheiro em um banco e sumido no mundo. Em outra versão, ele nem teria chegado à rodoviária de Brasília.
Nos anos que se seguiram, sua família recebeu algumas “pistas” de onde ele estaria. Nenhuma se revelou verdadeira. Quem acompanhou sua história descarta totalmente a hipótese de Porfírio ter sobrevivido. No imaginário geral, ele foi assassinado pelos militares. Não se sabe quando, onde e como exatamente. Nem há qualquer pista sobre seu corpo.
Uma vida de lutas
José Porfírio de Souza nasceu em 27 de julho de 1912, em Pedro Afonso (MA). No final da década de 1940, com a esposa Rosa Amélia de Farias e filhos, José Porfírio mudou-se para o norte de Goiás, influenciado pela campanha Marcha para o Oeste.
A intenção do Governo Vargas, com esta campanha, era promover a ocupação das "terras sem homens" do Centro-Oeste brasileiro através da criação de colônias agrícolas. No entanto, ao chegar em Ceres, José Porfírio e sua família não puderam se estabelecer na colônia, uma vez que esta já se encontrava lotada. Partiram, então, para a região de Uruaçu, onde se localizavam os povoados de Trombas e Formoso (hoje municípios).
Após dois anos de ocupações das terras devolutas, o grupo de posseiros de Porfírio enfrentou diversas disputas com grileiros de terra. O espaço havia se valorizado graças à construção de Brasília e da BR-153. Houve um banho de sangue. Diversos conflitos armados entre as duas partes chamaram a atenção de todo o País. Com a vitória dos camponeses, Porfírio tornou-se uma grande liderança política. Em 1962, a consagração: é eleito deputado estadual, atrás apenas de Iris Rezende que chegaria a ser governador por duas vezes.
Em 9 de abril de 1964, com a publicação do Ato Institucional número 1, o A1, Porfírio teve seu mandato cassado e virou alvo dos militares. Os homens de farda chegaram ao absurdo de tentarem capturá-lo na Assembleia Legislativa. Ele escapou e viveu oito anos na clandestinidade. Fugindo a pé, a canoa por estradas ermas e matagais, percorreu mais de mil quilômetros até ser capturado pelas forças do governo. Ele ficou preso durante seis meses no Pelotão de Investigações Criminais do Exército (PIC), em Brasília. Foi condenado por integrar o Partido Revolucionário dos Trabalhadores (PRT), acusado de ser subversivo. A porta de saída da prisão pode ter sido a sua porta de entrada para a morte.