UM HOMEM SEM DIGITAIS
Mais uma vez passei alguns dias de minhas férias na Colônia dos Empregados no Comércio do Estado de São Paulo, uma excursão comandada com muita competência pela Cristina: um pedaço de céu instalado na Estância de Praia Grande.
Com uma gerência sempre muito atuante e que busca o melhor atendimento possível ao público que se instala no local, fui surpreendido com um “fichamento” digital, ainda sem descarregar as malas no apartamento, logo no início de minha, infelizmente, curta estada.
Coloquei meu dedo indicador sobre um tipo de mouse: e minha digital não foi capturada pelo aparelho. Tentei com o polegar da mão direita: nada. Tentei com o polegar da mão esquerda: e o aparelho aparentemente aceitou-o, talvez pressionado pelo minha insistência e pela fila de pessoas , já com dedos em riste, prontos para serem identificadas.
Mas, no primeiro momento, quando tentei entrar na colônia, voltando da praia — sujo de areia, carregando cadeiras, guarda-sóis e esteiras — em que tive que experimentar essa tecnologia digital, me contorcendo em cima da roleta, tendo em vista ter sido ela construída para pessoas normais, com digitais no dedo indicador da mão direita, o equipamento não me reconheceu e tive que contar com o sorriso compreensivo do funcionário — aliás, todos eles sempre sorridentes e solícitos, durante todo o tempo — que liberou meu ingresso: e voltou a acontecer na hora de cada almoço, na hora de cada jantar, na hora de cada entrada na colônia.
E, ante os desafios das novas tecnologias, passamos, minha família e eu, seis dias de mar, vento, areia, mulheres e homens queimados pelo sol, cerveja, caipirosca, camarões, piscina, sauna — enfiando e retirando cartões magnéticos para abrir portas, colocando o dedo para entrar, almoçar e jantar.
Rodeados pela atenção dos jovens Anderson, Érica, Lucas da Barraca da Linda e do André, — que cavavam a areia para colocação dos nossos guarda-sóis, preparavam as batidas, abriam os cocos gelados, serviam os pastéis, cervejas e refrigerantes — capturamos imagens incríveis com nossa D70, já imaginando como ficariam sob os efeitos do Photoshop, entramos dezenas de vezes no mar calmo, sob o olhar atento, ao fundo, da Serra do Mar, visitamos diariamente a enorme imagem de Iemanjá, guardiã das praias da divisa entre a Cidade Ocian e Vila Mirim.
Infelizmente, chegamos ao último dia e, na despedida do mar, notamos que ele estava irrequieto, agitado, quase furioso, propiciando-nos um momento em que o chumbo do céu contrastava com o prateado reflexo do sol nas suas águas: ambos metalicamente belos.
Parecia, como nós, estar triste com a despedida.
Numa tarde de terça-feira, renovados e energizados com a força do mar, após um fim de semana inesquecível, e com a força do vento, com a força do sol, com a força da areia, com a força das matas, com a força das águas, com a força da pedra-da-lua, subimos a serra, sob as bênçãos de Iemanjá —Obrigado, meu Deus e Iemanjá , Odoiá, Odoiá, Rainha do mar — para enfrentarmos, aparentemente sem as minhas impressões digitais, os desafios de mais um ano : 2007.