O Real da Ficção
O fato é que, atualmente, em se tratando de literatua infanto-juvenil, os livros paradidáticos se tornaram apenas instrumentos de avaliação para os jovens, que diante de tanta tecnologia não se sentem motivados para as leituras.
Então, o que adotar para nossas crianças arrastadas pela euforia do século XXI, que vivem "de tudo, com tudo e para tudo" no dia-a-dia?
Quem sabe, talvez, aventura, terror, suspense, namoros envolventes ...?
A princípio, recorri a pesquisa, não só para proporcionar uma leitura prazerosa, como também a temas que abordassem situações até então "impensadas" pelo adolescente, o qual, por vezes, torna-se inseguro diante de decisões definitivas, conflitos desesperadores ...
Após várias leituras, vi-me diante do livro "Depois que você morreu" da autora Márcia Leite. Fiquei surpresa com a resenha que era a seguinte: "A vida de uma adolescente que perde a mãe muito cedo de modo trágico e que vê, subitamente, a revirada brusca de toda uma trajetória. O que fazer? Que rumo tomar?"
Imediatamente, após a leitura da obra pensei "perfeito, nada melhor do que 'sacudir' essa garotada para a questão familiar, o relacionamento e quem sabe a noção de valores até então, desconhecidos ..."
Entusiasmada, levei o livro para a escola e comentei com a turma.
As meninas adoraram, mas os meninos questionaram muito "Por que não aventura, terror, professora?"
Por um momento, desanimei, mas lhes fiz uma proposta: "Que tal fazermos a leitura juntos em sala de aula? Vamos tentar?" E a turma concordou.
Depois de uma semana, percebi que o interesse crescia a cada parágrafo. Os debates surgiam a todo momento. Alguns, até para a minha surpresa, questionaram que na vida apareceriam obstáculos, mas que precisaríamos viver, encontrar caminhos; enquanto outros, diziam que deveríamos tirar proveito de cada momento, vivendo intensamente.
No entanto, percebi que Helena, uma aluna brilhante, interessada, estava separada dos grupos no momento dos debates.
Ao final da aula, chamei-a para uma conversa, fazendo com que aquela menina tão meiga abrisse seu coração. E tal foi a minha surpresa, quando ela me revelou "Professora, perdi minha mãe há seis meses."
Apesar de saber que enfrentaria esse problema, a ficção se tornou realidade e eu fiquei chocada. Ela estava sofrendo muito e eu me sentia responsável.
Fui para casa, tentando encontrar soluções para ajudá-la, pois Helena só tinha treze anos. Mas, o objetivo da leitrua era esse e estava diante de mim ... e agora ...?
Na semana seguinte, voltei a leitura mais confiante, procurando amenizar o sofrimento de Helena e ao mesmo tempo, reanimando-a para encarar com força essa reviravolta que nos pega de surpresa, mostrando que tudo na vida acontece independente do nosso desejo e nessas horas a presença de pessoas amigas nos faz muito bem, tornando-nos firmes para habitar o mundo dos vivos e, também, por concluir que a vida não é um conto de fadas, mas sim, quem sabe, uma fábula que ao final, por vezes, surpreende-nos com uma lição de moral.
Disfarçadamente, olhei para Helena e vi que ao mesmo tempo em que mostrava um sorriso brando, falava com o olhar "Obrigada, professora, eu vou vencer."
Fiquei feliz, muito feliz porque a leitura compartilhada ajudou aquela menina a não se sentir tão carente e abalada.
Passaram-se três anos e hoje sei que Helena trilha um caminho bonito, vivendo dias e noites com muita intensidade, ao passo que eu, 'a adulta', 'experiente', 'sempre pronta...' perdi minha mãe há um ano. E, vivendo o momento, os obstáculos, o dia-a-dia, as subidas e descidas da vida, igualzinho a minha aluna, estou superando a tristeza, porque o livro "Depois que você morreu" faz parte daqueles dias em que bate uma saudade imensa!