Como não tratar o Cliente
Tudo começou em uma oficina de bairro, onde foi identificado que um duto de ar do veículo de uma grande marca francesa precisava ser trocado. Na concessionária, único lugar onde poderia ser encontrada, havia uma única peça em estoque. Foi feito a reserva, no entanto quando foram buscá-la, a resposta foi de que havia sido instalada em outro carro, na própria concessionária. Naquele momento, a única solução foi o pedido de uma nova peça, que poderia chegar em até 4 dias úteis.
Como o veículo apresentou defeito em outra peça, resolvemos levá-lo diretamente à concessionária.
Ainda na recepção, fomos orientados a nos dirigir ao departamento de autopeças, para verificar se as mesmas existem em estoque. Com a informação de que ambas existiam, voltamos à recepção de serviços. Fomos orientados a voltar àquele departamento, para que fosse feito a reserva das peças. Uma vez feito a reserva, havia a necessidade de fazer a reserva para a execução dos serviços, que só poderia acontecer seis dias após, as 07:45. Foi solicitado documento do carro e documento pessoal para fazer tal agendamento. Para nossa quase felicidade, recebemos a informação de que o serviço duraria cerca de trinta minutos, então até a taxa de serviços seria reduzida em 50%.
Seis dias depois, estávamos na recepção pontualmente no horário determinado. O atendente novamente nos solicita ir até o departamento de autopeças, para retirar as peças. No departamento, fomos solicitados ir à recepção, para que fosse aberta uma ordem de serviços, e o mecânico responsável iria fazer a retirada das peças. Depois dos aceitos inconvenientes, solicitamos para que visse com detalhe o agendamento feito anteriormente, e, para nossa surpresa no quadro de agendamento, contemplando dois atendentes, o primeiro horário era 08:00, embora nosso agendamento fosse as 07:45. Obviamente não estava naquele quadro o nosso agendamento, mas numa folha, eficientemente retirada de uma gaveta estava.
Foi aberta a ordem de serviços, e recebemos a informação de que o veículo seria devolvido após quatro horas. Claro que houve mais uma decepção, tendo até solicitado o atendente que apontássemos quem havia dito que o carro seria liberado em trinta minutos. Não apontamos, e se comprometeram a entregar o veículo em um tempo menor: três horas.
Uma vez aceito novamente as condições, foi novamente solicitado os documentos do veículo e pessoal, quando então foi feito o cadastro. Em seguida, foi oferecido o serviço de transporte pessoal, porém recebemos a informação de que tal serviço seria apenas para levar, não sendo possível buscar quando o veículo ficasse pronto. Condições também aceitas.
Interessante foi notar, que a outro Cliente também usuário dos serviços de transporte pessoal foi orientado a aguardar no setor de vendas, onde havia ar-condicionado, cafezinho e água. A mim, e outra senhora, atendidas por outro atendente, foi orientado que aguardássemos onde estávamos, entre a recepção de serviços e a oficina. Enquanto aguardávamos, notei que o veículo foi colocado em um determinado boxe, teve a tampa do motor aberta. Dez minutos após, foi fechado e removido do boxe, sem que qualquer intervenção houvesse sido feito.
No transporte pessoal, o atendimento do motorista foi excelente, inclusive o mesmo teve a boa vontade de tentar justificar o atendimento da empresa, diante de três reclamações dos três Clientes sendo transportados.
Para nossa quase felicidade, antes de completar três horas, recebemos um telefonema, pois o veículo estava pronto.
No entanto, ao chegar na agência, fomos informados de que uma das peças não havia sido trocada, pois a mesma veio do fabricante errada. Estava com o código na caixa correta, porém no seu interior a peça era outra. Novo prazo... Agora de cinco dias úteis para que a peça fosse solicitada e o serviço realizado. Diante de nossa indignação, foi nos dado a possibilidade da peça existir em estoque nos depósitos do fabricante, e a mesma poderia ser trocada em dois ou três dias úteis.
Ao efetuar o pagamento, solicitamos o não pagamento da taxa de serviços na conclusão, fato recusado pelo responsável pela oficina, só alterado pela boa vontade da atendente de caixa, tentando justificar o atendimento da empresa, como o motorista.
Com a propriedade de veículos de mais de cinco marcas diferentes, em mais de trinta anos de habilitação, tendo sido atendido em mais de cinco concessionárias, em nenhuma das possibilidades presenciamos um Cliente se dirigindo ao setor de autopeças para saber se existe, depois para reservar, depois para pegar peças.
Em todas as outras concessionárias frequentadas, existe um setor de serviços rápidos, onde os serviços de trinta minutos podem durar quarenta ou pouco mais, devido ao cadastro do Cliente, emissão de ordem de serviços e faturamento, porém duas horas e meia, nunca.
Também em todas as outras concessionárias há salas de espera aos Clientes, onde, diante de televisor, ou com revistas e jornais, ar-condicionado, sofá confortável, aguardamos todo o processo. Os serviços de transporte pessoal chama-se “Leva e traz”, ou semelhante, que leva e traz o Cliente.
Em todas as concessionárias, foi a primeira vez que uma peça veio errada, como descreveram. Ou se vieram, foram todas trocadas no tempo combinado, sem qualquer prejuízo de tempo ao Cliente.
Outra peculiaridade notada,foi que em uma pequena sala ao lado do atendimento, fechada também em vidro, com ar-condicionado, havia uma placa de “Gerência de Pós Venda”, onde, durante toda a permanência não foi notado presença do possível gerente.
Dois outros episódios interessantes foram notados. Um Cliente compareceu ao atendimento, para reclamar do marcador de temperatura. O mesmo alterava rapidamente, parecendo que o motor superaquecera. O atendente disse que aquilo era uma falha no mostrador, e que não havia necessidade de qualquer intervenção. Com a indignação do Cliente, o atendente informou que para recuperar era algo simples, duraria cerca de uma hora, porém o veículo era novo, podendo ser realizado na próxima manutenção programada. O Cliente, no entanto, fez questão de saber do atendente, se desse algum problema, estaria coberto pela garantia, fato confirmado. Outro Cliente, com seu veículo com apenas quatrocentos quilômetros rodados, tinha uma vibração no volante, acima dos 100 km/h. A solução seria serviços de alinhamento de direção e balanceamento dos pneus. Serviço que provavelmente não havia sido feito após a fabricação, antes da entrega ao Cliente.
Embora a educação e atenção de todos os colaboradores da empresa tenha sido notado, a impressão mais forte foi a completa desorganização na formatação do fluxo de trabalho, se é que existe. Sabemos que, para que educação e atenção no atendimento consiga suprir a deficiência organizacional há a necessidade de algo muito além da boa vontade.
Em um mundo cheio de normatizações (ISO, PNQ e outros), grande quantidade de escolas de Administração de Empresas, onde os administradores, aprendem que sua principal função está na organização e administração dos fluxos de trabalhos, torna-se inaceitável tal situação.
Um fato hoje incontestável, é que além da legislação vigente, com o Código de Defesa do Consumidor, há uma conduta reinante nos nossos tempos, que é a completa atenção ao Cliente.
Mas sempre é tempo de rever, fazer ou refazer todos os processos, para que o prejuízo às marcas, da própria concessionária e da montadora não tenham perda.
O mais irônico é que o torturante episódio aconteceu no dia do Consumidor, aniversário de vinte anos do Código de Defesa do Consumidor.