“AMARÁS O SENHOR, TEU DEUS, DE TODO O TEU CORAÇÃO, DE TODA A TUA ALMA, DE TODA A TUA MENTE E COM TODAS AS TUAS FORÇAS”
Não há cristão, nem outro homem religioso, que não afirme amar a Deus do modo como vem expresso nestas luminosas palavras do divino Mestre.
Entretanto, vai nisto, quase sempre, uma grande ilusão. Por quê?
Porque é absolutamente impossível amar, real e intensamente, um Ser do qual não se tenha experiência direta e imediata. A imensa maioria dos homens religiosos apenas crê em Deus. Ora, o objeto da nossa crença ou fé nunca pode ser objeto de um verdadeiro amor. Ninguém pode amar uma doutrina, um dogma, um artigo de fé. O crente, quando muito, quer amar, mas não ama de fato. Querer amar é um ato volitivo, uma prova de boa vontade, mas não é amar. O amor, assim como Jesus o descreve nas palavras acima, não é apenas um ato de boa vontade, mas é o resultado de uma profunda, misteriosa e fascinante experiência vital do homem em toda a sua plenitude – alma, coração, mente e corpo. Ninguém pode amar um ser ausente, do qual ouviu falar, no qual crê apenas volitivamente. O Deus da nossa crença é um Deus longínquo, transcendente – ao passo que o Deus do nosso amor é um Deus propínquo, imanente. Quem apenas crê num Deus distante, transcendente pode, sim, querer amá-lo, mas não o pode amar de fato. O amor real é algo intensamente próximo, íntimo, ardente; é uma verdadeira fusão do amante e do amado – “eu e o Pai somos um”, “o Pai está em mim, e eu estou no Pai”.
De maneira que, em última análise, há só uma classe de homens que, de fato, amam a Deus – são os verdadeiros místicos, os intuitivos, os videntes do mundo da Divindade, os que têm de Deus uma experiência vital, imediata; são os que sabem o que é Deus, em virtude de um contato direto, de uma vivência oni-ponetrante. São estes os únicos que amam a Deus de todo o coração, de toda a alma, de toda a mente e com todas as forças do seu corpo.
Mas, como os verdadeiros místicos são raros, bem poucos são os homens que, realmente, amam a Deus de acordo com as palavras de Jesus. Talvez que, até à presente data, um só homem tenha atingido as culminâncias desse amor integral. E era precisamente esta a razão por que possuía “todo o poder no céu e na terra”, porquanto, o verdadeiro amor é onipotente por sua própria natureza.
Quem tudo compreende tudo ama.
Quem tudo ama tudo pode.
Compreender, amar e poder – estas três coisas são, na realidade, uma só.
Enquanto o homem ignora qualquer coisa não ama ainda integralmente, porque o seu amor está limitado àqueles seres que se acham dentro do luminoso círculo da sua compreensão não são nem podem ser objetos do seu amor.
Amor universal supõe compreensão universal.
E, uma vez que o homem tudo compreende, e tudo ama – que limite, poderia haver ainda para o seu poder?
Se sem limites é o seu compreender e o seu amor, sem limites tem de ser, necessariamente, o seu poder.
O que no Evangelho de Jesus se chama “fé” é, de fato, uma experiência e uma direta vivência da suprema Realidade; mas, o que as nossas teologias, geralmente, entendem por “fé” não passa de um entender e esse querer, esse crer, ou esse querer-crer, não pode deixar de ser fraco e insatisfatório; nada tem uma força irresistível de um profundo e fascinante compreender e viver.
No momento em que o homem transpõe a fronteira do seu velho e débil “crer”, entrando na zona de um novo e forte “compreender”, sabe ele pela primeira vez o que Jesus quis dizer com as tão conhecidas e tão desconhecidas palavras: “Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma, de toda a tua mente e com todas as tuas forças”.
Alma, coração, mente, forças corpóreas – o homem integral!
Compreendemos que o homem possa amar a Deus com a alma, o espírito, porque Deus é espírito.
Como posso amar, afetiva, intelectual e até fisicamente, um Ser que é puro espírito? Como podem o coração, a mente, o corpo atingir esse objeto de amor?
De fato, se Deus fosse apenas um Deus transcendente, puro espírito abstrato, só os puros espíritos o poderiam amar; mas, sendo que Deus, além de transcendente às suas obras, é também imanente em cada uma das suas criaturas, é possível que o amemos também com o coração, com a mente e com o corpo........................................................................................................
Enquanto o “amar a Deus” é apenas um preceito ético, um dever, um imperativo categórico da consciência moral, não despertou ainda a alma do amor; só quando esse “amar a Deus” deixa de ser um compulsório dever e se transforma num espontâneo querer numa luminosa compreensão, num irresistível entusiasmo – então é que o homem entra no “gozo de seu Senhor”.
Este texto foi extraído da coleção Huberto Rohden, Volume 12 – “ASSIM DIZIA O MESTRE”
Huberto Rohden nasceu em São Ludgero, 31 de dezembro de 1893 e morreu aos 87 anos de idade. Foi um filósofo, educador e teólogo catarinense. Precursor do espiritualismo universalista, escreveu mais de 100 obras (ao final da vida, condensadas em 65 livros).
Prazerosamente permito-me assinalar nesse ensejo, o que me levou a conhecer a doutrina de Huberto Rohden foi o festejado Sermão da Montanha, Segundo Volume da “SABERDORIA DO EVANGELHO”, Sétima Edição. Adquirido em 27 de julho de 1986.