Onde abundou o pecado...

Onde abundou o pecado...

Magno Aquino · Brasília (DF) · 30/9/2009 04:33 · 12 votos · 2 ·

Nasci em Minas, sou filho de uma professora e costureira que não sei como, mas lecionava os três turnos e costurava de madrugada; eu sempre digo que o homem lá de casa usa saias. Infância feliz, mesmo no início das drogas, lia muito e quando não tínhamos um livro, lia até bula de remédio, curioso, direto na química; os distúrbios de sono de mamãe me atiçavam a curiosidade, fui ler a bula, proibia bebida alcoólica… Eis o começo.

Mais tarde, quando as doses, mesmo aumentadas diariamente não resolviam a fissura, procurei drogas novas, pessoas novas e um novo e complicado mundo; só um viciado é capaz de descrever a falta da droga, eu escrevi tempos atrás que, se acorrentarmos um viciado e deixarmos a droga por perto, ele sacrificará o resto dos dentes roendo.

Chega uma hora, bem cedo, que droga perde a graça, viciado não sente prazer com drogas, ele sofre sem elas e assim usa drogas, a qualquer preço; qualquer custo.

Não há um dia certo pra começar no crime, o meu dia foi após uma surra terrível, sem motivos, aplicada por conhecidos; no hospital conheci o homem que me ofereceu vingança e proteção, topei na hora mesmo sabendo que jamais sairia da gangue; aprendi várias funções, de cão de guarda a cobrador, e tudo que fosse necessário e que nem mesmo viciado devedor quisesse fazer. Era preciso mostrar gratidão; anos seguidos.

Minha vida foi então virada ao avesso quando um dia aceitei um convite pra assistir a um culto dos crentes; apoc3: 20; deixei drogas, gangue, armas e fui morar em outra cidade, era conhecido; depois de virar crente apanhei muito da polícia, apanhei até de gente que apanhava de mim antes de me submeter a Jesus; mudavam-me de lugar, fiquei na rua, até numa igreja eu morei; perambulei por aí.

Belo Horizonte; trabalhava como cinegrafista e dava testemunho em igrejas, escolas; neste tempo, gente como eu era chamada de ralé do céu pelos crentes de nascença; estava deprimido, minha sensação era de ter entendido errado, aquela luta pra ser crente igual aos crentes, não conseguia agradar a ninguém, nem convencer. E DEUS me olhando estranho.

Tentei desistir, era infeliz, mais que antes de me render a Jesus, não queria voltar a ser ladrão nem cão de guarda e pra ser crente eu não servia, nem prestava.

Numa segunda-feira cedo, descendo a rua dos tupis, li na porta de uma igreja enorme: “ Bem de manhã :Venha orar conosco”, na agonia eu entrei, sentei bem atrás, atrás é mais fácil pra ir embora. Gente orando; eu não consegui orar, eu só consegui chorar, amargo e desesperado, lembrando o dia em que aceitei Jesus, querendo descobrir como fui sair de uma vida ruim pra abraçar uma vida triste.

Sem tempo pra fugir, umas pessoas se aproximaram, uma jovem sentou do lado e foi tão gente boa que eu quase esqueci quem eu era, “ralé do céu”. Descansei, parecia menino chegando em casa depois da escola, seguro, era Lúcia Estela do Paulo, amiga até hoje, e Rodrigo da Ivana, o Jonas eu conheci em seguida. Ninguém foi mais feliz que eu.

Por muitos anos frequentei a casa do Paulo e da Lúcia, da família Bonfatti e fui professor de EBD, reeditei o livro “Um Grito no Escuro” e daí, seminário; começa a queda, passei a escolher em qual igreja pregaria, namorava uma moça crente, mas tinha uma incrédula, que nunca levei à igreja, entrei pra “fraternidade do choppinho sem remorso” e em muito pouco tempo o seminário, a igreja na periferia, os empregos, o noivado e tudo virou fumaça.

05 meses, tempo suficiente pra voltar às ruas, sem trabalho fui “manguear” em frente ao SUS – Campos Salles, nova suíça – BH; local onde antes eu distribuía sopa, roupas, medicamentos, evangelizava e de onde tirei vários mendigos; era mendigo onde fora missionário. Ninguém foi mais infeliz que eu.

Cadeia, pneumonia, derrame pleural, surras, chão gelado, estafeta de Barbie e quando agonizava ficava na esquina da rua dos tupis, tentando ouvir um pedaço de hino na Central. Até o dia em que voltei pra igreja, enfermo. Muitos ajudaram, mas ajuda mesmo foi o rev. Edson e Paulo Costa me mandarem para o Centro de recuperação de Mendigos - Missão Vida. Foi aqui, sem glamour nem holofotes que Deus tratou comigo, conheci profundamente o amor e a mão de Deus, amém! É meu quarto ano, sou obreiro de triagem, estudo, escrevo, sirvo e sou feliz. A Missão Vida é o mais antigo e maior centro de recuperação de mendigos do país, 25 anos, 353 vagas em regime de internato, tudo gratuito e de excelente qualidade. O mundo precisa urgente de mais Wildos e Arnaldos.

Eu que passei tantas noites roubando e surrando mendigos, hoje gasto meus dias e noites servindo a estes pequeninos como quem serve ao Senhor em pessoa.

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