O que é (mesmo!) conhecimento?
Luiz Luna*
Manoel Bento não é nome fictício. Morador do município de Queimadas, distante 120km da Capital, é um exemplo de vida. Próximo dos setenta anos, ainda consegue dar conta de um sítio urbano, muito visitado e conhecido na “cidade das pedras”. Embora não tenha sido freqüentador efetivo dos bancos escolares, dois dos seus filhos são artistas plásticos. Não é exagero dizer que conversar com Manoel é uma bênção.
Durante o tempo em que morei naquela localidade, era freqüentador assíduo do sítio da Família Bento. Inicialmente, conheci Renilda, que morou no Rio de Janeiro e por lá fez muita amizade com sua arte de pintar. Gostei dos seus quadros, mas me encantei mesmo quando fui convidado para almoçar, num domingo, em sua residência e conheci Manoel Bento. Figura simples, mas de uma receptividade invejável e de uma facilidade de comunicação de impressionar qualquer dito letrado. Era década de 90 e fiquei curioso com a cultura demonstrada por aquele cidadão que conseguia, num terreno considerado pequeno, conciliar culturas diversas, a exemplo de cana-de-açúcar, coco, jabuticaba, coentro, alface, mamão e tantas outras. E mais: naquela época, ele já realizava experimentos em árvores frutíferas (enxertos e outros), conseguindo que elas dessem frutos num tempo considerado rápido. Ele ainda tinha em suas terras um sistema de irrigação e um lago onde criava peixes (muito divertido pescar lá, pois o anzol não demorava sem fisgar). Técnicos da Emater sempre iam prosear com o ancião com o objetivo de implantar suas técnicas em outras propriedades. Com todas essas habilidades, Seu Bento sequer concluiu a primeira fase do primeiro grau.
Conhecido na região, sempre era consultado quando alguém queria uma dica sobre determinada cultura ou a implantação de sistemas de irrigação, bem como sobre o extermínio de pragas que atacam lavouras, pois ele utilizava um inseticida natural, de fabricação própria. Seu talento e criatividade até serviu de inspiração para uma das crônicas do jornalista e radialista Wilson Maux.
Sustentar a família com os recursos da propriedade sempre foi mais do que motivo de satisfação. Realizado, o agricultor ainda nutria a mania de observar os diversos pássaros que freqüentavam seu pomar. Certa feita, ele me falava da importância do beija-flor para a polinização. Com ele, aprendi muito mais do que possa descrever, pois sempre demonstrou humildade, paciência, didática e uma forma sempre positiva de ver a vida. Falava-me também de projetos, como o de Queimadas transformar-se numa cidade turística, explorando suas paisagens naturais e a habilidade de sua gente. Então, percebemos que Manoel Bento é, sem muita analogia, um sonhador. Porém, em um mundo como o nosso, onde o ter é muito mais importante do que o ser, pessoas como ele são discriminadas.
Muitas vezes, o preconceito é tão sutil que sequer percebemos. Cultuadores da aparência, costumamos ser cruéis com aqueles que não ostentam títulos, mas que conseguiram perceber a sutileza e a simplicidade da vida, que conquistaram felicidade. De sorte que o mundo gira e aí é que surgem as mudanças, inclusive de mentalidade. Então, que aprendamos a ter orgulho de nossa gente. Viva o Brasil e sua cultura!
* Jornalista e especialista em gestão de pessoas. Contatos: www.luizluna.zip.net