NAVEGANDO EM COPAS DE ÁRVORES
Muitas vezes já usei este espaço para falar das águas. Desde a mais tenra idade o amazônida aprende a conviver com a água. No interior, aprende que na seca é mais fácil pescar, uma vez que os peixes ficam “confinados” ao leito do rio e que na infalível cheia é muito fácil caçar, porque o espaço dos animais fica “restrito” às áreas não alagadas. Esses parêntesis são para mostrar que nada é pouco ou pequeno quando falamos de Amazônia.
O fato de estarmos acostumados a essa natureza nos faz esquecer de explicar isso aos que não a conhecem. Lá fora, longe da planície amazônica, o imaginário das pessoas associa cheias com enxurradas catastróficas. Nas áreas descobertas de vegetação por este mundo afora, os rios costumam reagir rapidamente às chuvas, uma vez que as águas pluviais não têm o filtro das árvores para absorver e liberar a água devagar. Qual uma cidade asfaltada, as águas das chuvas correm diretamente aos rios, mudando-lhes a cor, aumentando repentinamente seu nível e a velocidade da corrente.
No Amazonas não é assim. Aqui, onde a variação de nível entre a vazante e a cheia, em relação à queda de água é menos de 10 milionésimos, não há aumento de velocidade dos rios. Pelo menos não que valha a pena ser mencionada. As águas não aumentam de velocidade, apenas de volume. E o aumento é lento e previsível. Os rios vão subindo, alguns centímetros por dia, até chegarem ao topo das árvores que ficam no baixio.
Este espetáculo único nos permite navegar por entre árvores, muitas vezes por cima delas. Alcançamos lugares onde fica difícil ir durante o período da seca, mesmo a pé. Sem contar a beleza que isso nos proporciona bem como a indizível sensação que a natureza nos transmite.
Os hábitos amazonenses fazem com que veja a chuva como um estorvo, a cheia como castigo. Contudo, visto com o olhar externo, a cheia é uma excelente oportunidade de exploração turística. Em nenhum lugar do mundo alguém consegue navegar calmamente entre as copas das árvores em águas tão calmas que sequer se sabe pra que lado corre o rio.
Um europeu, americano ou asiático, acostumados a um frio enregelante, não se importam em encharcar suas roupas na chuva com uma temperatura de 30 graus. Um turista alemão explicou isso muito bem. Depois de passar três semanas na selva, ele constatou: “Todo dia eu me embarcava. E isso era agradável.”
Toda a região tem suas características. Nos Alpes Suíços o frio e o gelo, que outrora confinavam as pessoas por meses, hoje são turisticamente explorados gerando altas rendas para todos. Talvez esteja na hora de pararmos com as lamúrias sobre as cheias cíclicas e as aproveitarmos para gerar negócios.
Luiz Lauschner – Escritor e empresário
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