O EU é uma mentira( ! ) ?

Estas linhas tortas, mal escritas, resumidas, são de relevância reflexiva apenas e não devem ser tomadas inteiramente por verídicas! Há um certo embaraço e desconexão aparente de idéias no texto em geral, porém isso é fruto do meu raciocínio que funciona ilogicamente sem seguir um padrão comum. Tudo deve ser lido de acordo com a pontuação! Pare... respire e inspire o conteúdo a cada período. Utilizo-me de excessivas interpelações pois o objetivo primordial dessa análise é suscitar o Pensar de cada um e que vós podereis tirar conclusões próprias acerca do assunto.

Em minhas indagações subjetivas, desprovidas de qualquer base científica/filosófica, pude conceber com total clareza que: o que sou neste exato momento não é mais este quem escreve estas últimas palavras. A imediatez do Eu ficou no tempo em que se revelou como o Este perante a Coisa(objeto) numa mediação já existente na certeza sensível. Não quero parodiar a dialética hegeliana por isso tentarei explicar a confusão que acabei de provocar.

Vejamos: a cada segundo decorrido uma parte de nosso corpo é afetada por estímulos externos; a todo instante, no interior do nosso corpo, há uma contínua variação de etapas ocorrendo no organismo tais como o fluxo sanguíneo, pulsação do coração, reprodução e fenecimento de células e bactérias, produção de proteínas, lipídios, enzimas, bílis...isso acarreta –a mim pelo menos –concluir que, simultaneamente à essas diversificações que ocorrem dentro ou fora de mim, sou diferente(me modifico) no suceder desses acontecimentos.

Heráclito, que viveu em Éfeso lá pelos séculos VI e V a.C, já crera na mudança contínua do indivíduo ocorrendo a cada segundo. Ele o chamava de devir e se recusava acreditar em algo como sendo Absoluto e imutável, pois para ele tudo está em movimento, nada permanece o mesmo a cada ação, há mudança o tempo inteiro ocorrendo no Ser.O fogo é o elemento arquetipal dessa modalidade na matéria e na natureza.

Aristóteles( 384-322 a.C) também encontrara a não-imutabilidade nos seres. Para ele a substância sofre mutação a partir do momento em que há geração(assumir uma forma) e corrupção(deteriorização, perda da forma) . Ele fizera a distinção de que a Alma é forma e matéria é Potência. Potência é o vir-a-ser, aquilo que possivelmente se tornará ato. O ato é a realização daquilo que estava apenas na dimensão da probabilidade. A matéria está sempre em mudança, tanta em qualidade, quantidade como em lugar, relação...

Exemplo: Em Potência sou um cadáver destinado a necrópole mais lamuriante; quando eu morrer serei um defunto e este será ato. Não tenho conhecimento suficiente para afirmar que Aristóteles tivera completa postura dogmática sobre o movimento como sendo parte inerente ao Ser. Só sei que ele propulsionou mais ainda a idéia de que o imutável, o Uno, o Movente Não-Movido, Ato Puro só existiria fora desse mundo onde reina a Potência, a mudança.

Saindo das concepções clássicas, voltarei ao que estava desenvolvendo inicialmente. Existem algumas coisas perceptíveis e outras imperceptíveis acontecendo conosco. É desse jeito porque o nosso cérebro ao realizar certa atividade, se fixa num único tipo de ação, numa idéia ou numa circunstância particular; ele não racionaliza simultaneamente sobre coisas distintas; acontecimentos isolados são entendidos em suas singularidades, situações são armazenadas separadamente. Nada é inferido ao mesmo tempo a não ser que haja algum tipo de relação entre as partes percebidas. Tente somar 10 + 5 e multiplicar 20 x 18! Consegue fazer as duas operações ao mesmo tempo? Para mim isso é impossível; primeiro fazemos uma conta e depois a outra.

Muitas de nossas ações e reações são mecânicas, " inconscientes ", involuntárias(contração muscular, respiração). Acho pouco provável termos noção exata de cada atividade que realizamos no intervalo de dez segundos. Digo no sentido físico externo, no fisiológico interno e mental/cerebral. Não é possível sentir e entender tudo que permeia nosso Ser, mas quando iniciada a fase fálica e chegado por completo na adulta parece que conseguimos discernir sem escrúpulos sobre nossa conduta, nossas decisões, perspectivas, nossos desejos. Temos a completa noção do que sentimos – nem sempre – sabemos quem somos e como nos comportar de acordo com essa certeza: a do Eu. O Eu é apenas uma parte da personalidade; o diferencial existente entre os seres humanos, a subjetividade consciente de cada um.

Mas, e se tudo aquilo que tomamos como parte do nosso caráter não passa de Reforçamento da idéia daquilo que pensamos ser?

Tu não és Tu porque nasceu assim e sim porque o fizeram assim.

Desde o nascimento já se está estabelecido na criança gerada o gênero dela, quais atitudes inerentes a ela... todo estereótipo social que determina a sua sexualidade: ser homem ou mulher. O que é certo, aceitável, digno de aplausos, errado etc. também já está determinado pelas Tábuas da moralidade/bom costume.

Se há realmente um Eu consciente, intelectual esse nada mais é que uma síntese de conhecimentos, aspectos empíricos desenvolvidos e interiorizados ao longo do tempo vivido. Na transição dos anos aprendemos regras, comportamentos, recebemos informações, conhecimentos(Todo o conhecimento que possuímos se baseia em algo já estabelecido, existente. Não importa o quanto sábios, eruditos, geniais possamos ser, não tiramos nada de nós mesmos, tudo está aí, apenas agrupamos, julgamos e concluímos sobre as coisas).

Criamos ou, sob uma ótica mais anarquista, criaram – para nós – um Tipo de Pessoa em que certas características são permanentes e devem ser Dessa forma até o perecimento. Claro que duas pessoas não vivem as mesmas ocorrências ao curso da vida e nem reagem igualmente nessas circunstâncias ocorridas. Emoções, afetos, lembranças e experiências podem ser atribuídas à um indivíduo abstrato e esse até pode ser impulsionado por tais aspectos; porém há algo de fora(meio social/cultural) que entra no processo de formação individual. E é justamente isso o determinante na formação do Eu. Todas as frustrações, alegrias, remorsos, e acontecimentos em geral ocorridos na infância e adolescência, assim como o meio em que se vive e convive com familiares, colegas de escola ou da rua em que se viveu nesse períodos são o ponto de partida na criação de alicerces daquilo que nos tornaremos como pessoa.

Se fôssemos apenas o resultado das emoções, afetos, experiências sensíveis... se fôssemos livres dos valores morais, da racionalização de nossas atitudes... se não possuíssemos a linguagem escrita e falada de hoje –tão pormenorizada e recheada de regras –, acaso seríamos os mesmos que somos nesse ambiente em que vivemos? É claro que não! O que viríamos a ser então, Homo Erectus, Homem de Neanderthal, de Cro-Magnon? Teríamos personalidades ou esta só é real a partir do momento em que é racional o pensado pelo indivíduo que a tem? Os loucos puros têm personalidade?

O "nosso" Eu está vinculado à rotina; mantemos o Eu rijo no imutável dia-a-dia. Caso ocorra – o que eu não desejo ver para comprovar –uma tragédia, algo catastrófico a alguém( perda da visão, ficar paraplégico, perda de alguém que ama intensamente) será que ele não sofreria nenhuma alteração psicológica? Se numa nação vir a ocorrer uma guerra, peste, cataclismos... será que os habitantes da mesma –atingidos por essas moléstias –não mudariam os seus hábitos, os seus costumes ou perspectivas?

É mais certo afirmar que o indivíduo não possui em si somente um Eu total e único e sim vários “EU”. Corriqueiramente o indivíduo utiliza-se daquele caráter ligado aos fatos de sua vida diária. Todavia, usualmente – de forma obscura(em seus pensamentos principalmente) –ele desvia-se desse caráter que adotou como sendo componente indissociável do seu Eu.

Eis um exemplo:

" Sou Padre! Minha aliança é com Deus; estou acima de vós pois não corrompo minha carne com qualquer ato pecaminoso e nem sou tentado pelos demônios da luxúria. Meu espírito é sacro! "

Assim profere o Padre aos ouvintes extasiados com tamanha Santidade. Após dizer tão louváveis palavras esse mesmo padre pensa silente:

" Nossa! Como aquele garotinho tem a pele tão clara, os olhos brilham cheios de ternura e candidez, os lábios são tão finos, devem ser tão doces."

E sentindo uma calidez percorrendo-lhe o corpo, logo sente a bata elevando-se abaixo da cintura. Surge então um devaneio sórdido, algo que há pouco declarava como sendo inóspito em sua índole pura.

Para não parecer que sou antipático à religião católica(com certeza eu sou) e evitar comentários fanáticos darei outro exemplo. Se bem que o já mencionado dá um direcionamento onde pretendo chegar. Esqueçamos outro exemplo então!

Retornando: é explicitamente comum a todos nós – às vezes, ou melhor, todo dia – pensarmos realizando uma ação contrária àquilo que defendemos, principalmente em momentos de tristeza, excitação sexual... O simples fato d'eu não efetivar um pensamento antagônico não é o suficiente para negar que fugi dos meus princípios.

Ora, é só na prática que o meu Eu torna-se verdadeiro? Só aquilo que é observável tanto por mim quanto pelos olhos alheios é o que pode ser genuinamente atribuído à minha Pessoa, meu caráter?

Se assim é, então somos apenas a manifestação individual praticável. Tudo o que permeia o cérebro/ mente (abstrações visuais, ideais, vontades) e não esteja em relação com o espaço não passa de ilusão, devaneio descartável, conjecturas.

Os pensamentos mais diversos e inconfessáveis são apenas forças pertinazes que não se desvinculam de nós, do nosso Eu benévolo, correto, compassivo, solidário? Somos efetivamente aquilo que temos coragem de ser ou é o meio quem propicia a espécie de pessoa que nos tornamos?

O adultério, o crime, o homicídio por vingança ou ódio, a libertinagem etc.quando imagens mentais apenas não fazem parte de nós só porque não às temos em conduta pragmática?

Eu sou o que penso ou o que faço?

E a hereditariedade, até que ponto ela influencia o comportamento do Eu? Superficialmente pesquisei as teorias da personalidade e acredito que todas, ao se cruzarem, estão corretas. Freud e sua teoria psicanalítica, Jung e sua psicologia analítica, Fromm e todos os psicanalístas das teorias psicossociólogicas; Carl Rogers, Maslow, Piaget etc. todos podem dar alguma explicação certeira sobre boa parte da nossa personalidade. Mas ainda não encontrei nenhuma resposta que satisfaça o incógnita que me perturba:

O que é o Eu?

Continuarei com essa dúvida, mas em vez de me debater em busca dum saber que possa por fim a essa questão, simplesmente nego o Eu e sua eternidade. Eu poderia atingir um sublime e niilista estado de nirvana para poder fugir do meu próprio Eu.

Não sei o que é o Eu mas sei quem sou agora. Posso fazer coisas boas, altruístas, bem planejadas hoje; amanhã – oposto ao dia anterior – posso fazer o mal, agir espontaneamente sem pensar, isolar-me em meu egocentrismo. Isso dependerá das circunstâncias, se elas não mudam então não mudarei minha inclinação! Serei sempre o mesmo enquanto o meio em que me encontro permanece estável.

Mas:

" O beijo, amigo, é a véspera do escarro,

A mão que afaga é a mesma que apedreja "

Augusto dos Anjos, Versos íntimos.