Mais um contraste brasileiro - Porque, no caso do Brasil, o aumento dos alfabetizados não reflete a ampliação da leitura de jornais
Nos últimos anos, o Brasil tem mostrado certa maturidade administrativa ao adotar políticas educacionais que buscassem promover a alfabetização de um grande contingente populacional que se encontrava às margens do grande mercado econômico. Alheia a praticamente todos os acontecimentos de ordem nacional ou global, essa parcela da sociedade é resultado direto dos anos de estagnação econômica e social, especialmente da época do regime militar, período em que a liberdade pessoal foi tolhida, condicionada a mero sonho e objeto passível de condenação sumária. Neste sentido, coube aos novos governos, ditos “democráticos” tomarem para si a função de disseminar cursos de alfabetização para todas as faixas etárias, no intuito de minimizar as conseqüências dos anos de pequenez do país.
O número de analfabetos, apesar de ainda ser vergonhoso, caiu. Segundo a Folha de São Paulo em matéria do dia 29/09/2007, o Brasil apresenta, hoje, uma taxa de 11,1% de analfabetos contra 15,3% (população urbana) em 1995. Os anos de instrução também evoluíram, passando de 5,7 anos em 1996 para 7,2 anos em 2006.
No entanto, um dado chama a atenção: apesar de o contingente de brasileiro ditos aptos à leitura e escrita ter aumentado, a tiragem dos jornais brasileiros sofre queda constante. Os principais jornais brasileiros, nos últimos 50 anos, registram um número cada vez menor de impressões de jornais em seus parques gráficos. Para ser ter uma idéia, entre as décadas de 50 e 70, o número de alfabetizados aumenta 15% no país. Entretanto, a tiragem diária de jornais decresce cerca de 40%. Atualmente, o advento de novas tecnologias de impressão e interatividade é responsável pela retomada, ainda que minguada, do crescimento das tiragens.
Sabe-se que a leitura de jornais é uma referência no que diz respeito ao desenvolvimento econômico e social de uma sociedade. Uma população informada torna-se mais atuante, consciente dos seus direitos e deveres referentes aos mais diversos campos que integram a vivência humana: economia, geopolítica, esportes... Evita-se, por exemplo, aderir aos chamados simulacros – a superficialidade da realidade, que é transformada em sonho de acordo com interesses das grandes empresas midiáticas.
O decrescimento do analfabetismo brasileiro não implica amadurecimento da leitura e interpretação textuais por vários motivos. A estrutura fundiária do país, ainda presa aos grandes latifúndios, impede a dedicação ao ato da leitura, prendendo o homem à terra através de uma corrente inquebrável. E quando ocorre o êxodo, a população retirante se entrega às mazelas da cidade grande, que tornam o hábito de ler jornais um luxo que pode ser deixado de lado. As políticas de alfabetização não foram capazes de evitar o analfabetismo funcional, pois simplesmente ensinaram seus alunos a codificar e decodificar signos componentes de orações e períodos. No entanto, o lapso da interpretação de textos mais exigentes assola praticamente todos os novos alfabetizados, que sofrem quando deles são exigidos maiores níveis de dificuldade relacionados a textos de ordem científica, literária, filosófica, por exemplo.
A grande mídia, ao que parece, colabora para que este quadro se perpetue, pois muitas corporações ainda filtram as informações através dos valores consagrados socialmente pela elite. O apego à esta tradição reflete o caráter de exclusão adotado por algumas empresas, cujos produtos são destinados a uma minoria de poder aquisitivo elevado capaz de usufruir tais produtos.
Estudar e refletir sobre este contraste impõe-se como uma dos grandes problemas hoje. Os padrões culturais, sociais, econômicos, dependem e se configuram de acordo com o caráter crítico de análise da realidade por parte dos brasileiros. Um veículo como o jornal torna-se aliado importante neste processo. Segundo o jornalista e professor universitário José Marques de Melo, o jornal significa o laço que ata o indivíduo à sociedade que em que vive e atua, dando-o a consciência de cidadão e agente social capaz de modificar sua realidade de modo que colabore com o bem-estar mútuo e universal.