A rosa de Giselda Morais
Os poemas de Giselda Morais em seu livro Rosa no tempo (2003) e o reencontro com a poeta nas sessões da Academia Sergipana de Letras suscitam em mim uma lembrança. O primeiro poema que li de Giselda era um de “braços horizontais” que se, por acaso, sofressem uma perda só conhecida pela escritora, esses braços não se ergueriam jamais e seriam “eternamente verticais”.
Giselda, obrigada pela Rosa no tempo, ela está aqui comigo, no meu tempo-espaço.
Escolhi alguns poemas-botões que se abrem nas páginas de sua obra. Não os escolhi porque são melhores do que outros, mas por algum motivo o fiz e isto não vem ao caso.
Rosa no tempo é um livro que chama de imediato a atenção pela capa de intenso vermelho dissolvido no negro. E, depois, vem a calma dos poemas, da palavra lançada na folha, junto com outras, todas vivas, falantes, conscientes do próprio poder-palavra.
O poema Partida para o eterno chove na alma. Chora a inexatidão e o vazio de significado da palavra-susto perante o signo da morte, “a eterna viagem / eterna eternidade”.
Coloquei a poesia para dormir enquanto o sol se escondia, acalentei-a pelas estradas, dentro de um ônibus. E você pede silêncio, velando o sono da noite que dorme em poemas chorosos e latentes. Latejam no seu Poema as palavras descobertas, nuas, bandeiras.
Precisamos ler Giselda para descobrir que temos liberdades paradoxais de ouvir e de calar, de construir presídios, de destruir escolas, de trancar crianças, de deixá-las famintas enquanto luxamos, pecamos, cantamos e até lemos poemas. Tudo ao mesmo tempo em que a Natureza, revoltada em liberdades paradoxais, contrai o vírus da modernidade e do capitalismo, desmancha geleiras, seca rios, abala o solo, anuvia a atmosfera.
Quem diria melhor o que é o homem e o que é o mundo a não ser o poeta? No vai-e-vem da vida, “o mundo é o mesmo / o homem não; “o homem é o mundo / e o mundo não”
Senhora poeta, o mundo é cão, por isto zomba, finge, faz a menina chorar, pois “há uma dor e uma pena / e retratos de mortos nas paredes”.
Os retratos dos mortos na parede tentam com seus olhares indefiníveis avisar que um dia morreremos também numa parede qualquer. O olhar dos mortos na parede achou, enfim, um lugar para se afogar e “se afogou nos olhos dela”.
A vida promove encontros e desencontros, até chegar o dia da clarividência. Possa cada um notar, nesse dia, a humana dimensão e concluir: “tenho uma roupa esquisita / e uns olhos de praça morta”.