Dos reclamadores.
Quem nunca ouviu alguém reclamar das músicas que se toca, e que se ouve, nas rádios, nas tevês, e nas lojas, e nas casas?! Quem nunca ouviu alguém reclamar dos filmes que hoje se vê nos cinemas, nas tevês por assinatura?! Quem nunca ouviu alguém reclamar… Quanta reclamação, meu Deus! Reclama-se de tudo. E quem que já ouviu alguém reclamar das músicas, dos filmes, de tudo, enfim, jamais ouviu deste alguém que seja uma palavra de elogio a uma boa música, a um bom filme, a uma escultura extraordinária?! Eu, que sou meio lerdo das idéias, reconheço, sem falsa modéstia, já percebi tal fenômeno, mais comum do que se pensa. De que adianta viver de reclamar, se não se move um dedo, que seja o mindinho, para melhorar o que tem de ser melhorado?! De que ainda viver a esbravejar contra as imundícies musicais, cinematográficas, literárias, e etcetera, e tal, e a disparar perdigotos mal-humorados para todos os lados, se não se dá a conhecer às pessoas ao seu redor boas músicas, boas pinturas, bons filmes, bons livros?! De que ainda tal postura?! Que se faça, então, um esforço, para, primeiro, conhecer o que há de bom e que merece ser conhecido, e, depois, apresentá-lo aos de seu convívio.
Há escritores destituídos de talento, autores de livros bem chinfrins, vendendo seus livros aos milhões, e são seus livros niilistas, recheados de imundícies escatológicas, de obscenidades sem fim?! Que se dê a conhecer, então, os livros de Tolstói, os de Machado de Assis, os de Cervantes, os de Jane Austen, os de Nathaniel Hawthorne, os de Jorge Luis Borges, os de Melville, os de Balzac, os de Camilo, os de Selma Lagerlof, os de Ésquilo, e os de tantos outros gênios da literatura universal. Hoje em dia ouve-se músicas da pior espécie?! Que se dê a conhecer as de Beethoven, as de Berlioz, as de Pixinguinha. Os que se dizem cantores e de quem se diz que cantam são tipos desgraciosos, de voz de taquara rachada, pessoas destituídas de talento, muitas delas de intelecto simiesco que lhes permite, se muito, repetir, irritantemente, uma frase, ou uma palavra apenas, ou, o que não é raro, emitir unicamente sons guturais comuns aos mais primitivos crocodilianos?! Então, que se apresente o Agnaldo Rayol, a Inezita Barroso, o Sílvio Caldas, a Elis Regina, o Francisco Alves, a Dalva de Oliveira. São tantos os bons cantores! Por que não se dá a conhecê-los?! As pinturas expostas em museus de arte moderna - se se pode chamar de arte tais pinturas (e se se pode chamá-las de pinturas) são, nada mais, nada menos, do que poluição visual?! Onde estão as pinturas de Michelângelo, de da Vinci, de Caravaggio, de Victor Meirelles, de Pedro Américo, de Vermeer, de Rembrandt?! Não têm as pessoas acesso às pinturas originais dos maiores gênios da pintura?! Que se lhes apresente reproduções, oras bolas! E a arquitetura, que hoje só produz prédios que se parecem com caixas de fósforos com janelas e portas?! Que se apresente o Taj Mahal, as catedrais góticas, o Louvre.
Para que se apresente o que há de bom, o que há de melhor, o que de mais genial o ser humano já criou, têm-se de se esforçar para se conhecer o que se quer apresentar. Pode uma pessoa que jamais leu um bom livro dar a conhecer um bom livro?! Não. Não pode. Quem nunca leu Shakespeare pode falar do gosto que é ler Hamlet, e a Comédia dos Erros, e A Tempestade?! Não. Não pode. Quem nunca leu Cervantes pode, com um sorriso no rosto, falar dos divertidos disparates de Dom Quixote e do Sancho Pancho?! Não. Não pode. Quem nunca leu Melville pode falar da aventura suicida do capitão Acab, história assustadora que Ismael nos contou?! Não. Não pode. Quem nunca leu um bom livro não pode, com agrado, com paixão, falar de bons livros. O mesmo se diz de quem nunca admirou uma boa pintura, uma boa escultura, de quem nunca ouviu uma boa música. Então, que se esforcem, sacrifiquem-se para se conhecer o que merece ser conhecido, que é o que é bom, para que se possa falar com propriedade, com gosto, com encanto do que merece ser conhecido.