MENTES RETRÓGRADAS
Eu cresci numa época em que falar da libido ou qualquer assunto relacionado com sexo era tabú.
Se tinhamos dúvidas, não podiamos fazer perguntas porque esse assunto era visto como pecado e quem falava sobre isso eram as mulheres de vida fácil, era assim que pensava a maioria das pessoas e nas aldeias o estigma era mais acentuado.
Vida fácil foi um rótulo que se colou á pele das prostitutas. Na minha opinião não concordo, acho que de fácil não tem nada, há um mundo misterioso e agreste nos calabouços dessa vida.
As mães não falavam com as filhas sobre sexo e nós não ousávamos fazer perguntas porque a vergonha instalava-se na primeira fila. Assim cresciamos sem aproveitar muito da nossa sexualidade.
Não estou a falar em fazer sexo com outra pessoa, estou a falar em masturbação e como podiamos ter explorado mais o prazer do nosso próprio corpo. É uma prática normal e saudável. Os falsos moralistas, ainda hoje ficam escandalizados ao ouvir falar no assunto.
O princípio moral da época era que as meninas tinham que ir virgens para o casamento e quanto mais ingénuas melhor. Apesar de tanto cuidado, muitas já iam grávidas e depois diziam que as crianças tinham nascido prematuras, muito convenientemente de sete meses.
Claro que também havia as lésbicas, mas essas viviam fechadas a sete chaves dentro delas, lutando estoicamente contra ciclones, enxurradas e vulcões.
Sempre houve pouca transparência e muita falsidade em todas as épocas, diferindo apenas no conteúdo conforme a evolução do tempo.
Não ficava bem ás cachopas, falar sobre sexo e havia certas posições, quer deitada quer sentada que não eram permitidas por lembrarem talvez, posições do Kamasutra ou se calhar nem eram do Kamasutra. Será que nessa altura alguém conhecia este livro? Eu nunca tinha ouvido falar. Mas acredito que sim que outras pessoas o conhecessem. Este livro não era propriamente a Cartilha Maternal de João de Deus.
Em relação aos rapazes, não sei se os pais falavam com eles sobre a sexualidade, de qualquer modo, os homens tinham um lugar privilegiado na sociedade de então e não estavam sujeitos ao condicionalismo que as mulheres estavam. O povo usava uma expressão estupida e obsoleta para desculpar os homens. “ O homem sacode as calças e nada se lhe pega”, era até como que um enaltecimento, já ás mulheres, pegava-se a desonra vinda da gravidez fora do casamento.
A sociedade até via com bons olhos que os rapazes tivessem muitas namoradas, ou frequentassem os bares de alterne, ou casas de meninas, como vulgarmente eram chamados. Isso servia como garantia para provar a sua virilidade, era o chamado macho latino.
Os pais temiam que os seus rapazes fossem gays, isso constituía uma grande afronta, uma ignomínia e os rapazes por sua vez, aqueles que o eram, escondiam a todo o custo a sua inclinação sexual por vergonha e medo do julgamento da família, dos amigos, dos vizinhos.
Vivia-se numa sociedade muito fechada, retrógrada e tacanha, principalmente nos meios pequenos.
Como sempre não há regra sem exceção e felizmente já havia algumas pessoas informadas e de mente aberta, que aceitavam e compreendiam os seus filhos e filhas com inclinação sexual pelo mesmo sexo.
Claro que estes também tiveram medo da rejeição, mas ganharam coragem e assumiram-se. A luz da aceitação iluminou-lhes o caminho.
Agora é tudo muito mais fácil. Os caminhos estão abertos e iluminados e ainda bem que assim é.
Tiro o meu chapéu aos gays e lésbicas, assim como ás suas famílias e amigos, por terem tido a coragem e a ousadia de se imporem e afirmarem contra gente preconceituosa, mesquinha e malévola.
Vivemos na era da cibernética e é muito comum o flirt online que normalmente não dá em nada, mas sabe bem ouvir, eu te amo e sentir-se cortejado, quiçá desejado. Isto serve tanto para homem como para mulher.
Também sei, ou antes, é intuição minha, que na internet o mesmo cara é capaz de dizer eu te amo a uma centena de mulheres.
Anotem isto, se o relacionamento é meramente virtual não se acorrentem nem se iludam, levem a coisa com suavidade e savoir faire e ninguém se machucará.
A libido estará em alta, envolvam-se na maré e desfrutem o prazer da interação e daí nenhum mal virá ao mundo, digo eu!
©Maria D. Reis
31/08/21