1920

Li o livro "Mentes ansiosas" de Ana Beatriz Barbosa e Silva e fiz a seguinte reflexão:

Preciso de férias! Férias de tudo: trabalho, sociedade, pais, amigos, tudo mesmo! Estou exausta. Preciso de chance para relaxar, parar o jogo, zerar a vida. Mas como, se nunca tenho tempo? Minha vida está escorrendo entre meus dedos, uma vida fluida sobre a qual não tenho o menor controle! Queria gritar, espernear, chorar, socar, sumir... Pra onde? Quando? E depois?

Eu não tenho as respostas. Enquanto isso vivo no meu mundo “Anne with an E” pensando que a humanidade teve um sonho: um século XXI repleto de tecnologia, com menos trabalho, mais prazer, mais igualdade, mais conforto, cheio de muita paz e felicidade. Acordamos do sonho e vemos que sim, temos todas as informações, literalmente na palma da mão, para tornar nossa vida mais fácil. Mas não é.

E o mais louco disso tudo é comparar com o século passado. Pensar em 1920 me dá até uma certa nostalgia em ver uma época onde reinava a simplicidade. Andar a cavalo, comunicar-se por cartas escritas à mão, participar de saraus, realizar refeições em família, tomar a fresca ao entardecer, não ter excesso de informação o tempo todo... Fala sério, aquela vida tinha lá o seu charme! Mas será que eu trocaria viver com o que tínhamos naquela época pelo que temos hoje? Talvez não porque só de pensar em ter que trocar o vaso sanitário pela fossa, não rola! Mas pensar no estilo de vida de outrora e o de agora tão complexo, acelerado e cheio de pressões, me faz ficar em dúvida.

Pensa bem: Quanto mais temos coisas à nossa disposição para facilitar nossas vidas e a nossa rotina, tudo parece ficar cada vez mais difícil. Temos uma variedade interminável de aparelhos domésticos, pedimos comida sentados no sofá pelo ifood, enquanto pagamos as contas no banco e ouvimos o disco que acabou de lançar da Marisa Monte no Spotify. Nosso celular virou nossa fada-madrinha digital, disponível 24h por dia, disposto a te dar o que você desejar.

Temos tudo. Temos muito.

E com tanta tecnologia muito mais velozes que a capacidade do nosso cérebro processar tanta informação é que deixa uma antiga amiga minha muito alegrinha. Ela responde por ANSIEDADE, mas eu já a batizei de vários apelidos: dor no estômago, medo, fome, sobrepeso/compulsão alimentar, cansaço, pressão alta... É que dentro desse rodamoinho da competitividade, da pressa, das exigências, do consumismo sem freio e das informações que são atualizadas por minuto - impossíveis de serem acompanhadas, essa minha amiga que tanto já me ajudou a crescer, ela chega chegando "pocando" (capixabas entenderão) e cruza as fronteiras entre o saudável e o patológico.

É o feitiço contra o feiticeiro: A ansiedade e o medo são respostas emocionais que estão cravadas em nosso DNA para nos ajudar a sobreviver desde que existimos como espécie humana. Só que essa benção pode facilmente se tornar uma maldição. O truque é encontrar a dose certa, a poção mágica da tranquilidade que cria uma bolha enquanto o mundo faz uma rave lá fora. Mas como?

Dar conta de todos os afazeres modernos sem que tenhamos de adoecer com isso é um desafio e tanto! Talvez o maior de todos, desses nossos tempos tão estressados.

- Oh, e agora quem poderá me defender?

- Euuuuu... o autoconhecimento!

Meu super herói favorito!!! Ele tem o poder de me dar o bem mais valioso que Google nenhum pode dizer uma resposta pronta: quem eu sou.

Ele me ensina que viver é sim se deparar o tempo todo com um incalculável número de novidades, riscos, acertos e erros. Mas se eu realmente quero mudar a minha vida, preciso descobrir um jeito de estabelecer uma relação amigável com essa festa de sentimentos que sempre morou em mim e que minha amiga adora gerenciar. E não tem outra escolha, porque senão só me resta a resignação de viver um estilo de vida ansioso, conflitivo e adoecedor e isso definitivamente não combina com meus propósitos e com os planos de Deus para minha vida.

É isso. Viver é um significativo caminho terapêutico, que nos confronta com o medo e nos impele na direção do autoconhecimento e do amadurecimento.

E olha que Adultecer é diferente de Amadurecer. O primeiro é uma consequência natural do tempo, mas o segundo só acontece graças ao poderoso poder do autoconhecimento. Maduros, transformamos as experiências de medo e de ansiedade em algo frutífero, que nos ajuda a revelar novas versões da vida a partir da compreensão de nossas próprias identidades, num processo simultâneo de reestruturação e construção. É o exercício mágico e transcendente de se reinventar a cada supetão de sofrimento.

Só que nem tudo são flores. Há um mercado enorme voltado para o autoconhecimento, o que para um ansioso pode ser um prato cheio para desenvolver algum sintoma patológico. É que se conhecer depende só de você. Nenhum “cinco passo para...” vai responder ao seu CPF. E é aí que mora o perigo.

Esse lance de “seja a melhor versão de si mesmo” gera um desespero danado, uma verdadeira vigorexia psicológica, onde não é possível se alimentar de coisas que não te levam ao seu propósito. Seria muito mais legal se fosse “seja a melhor versão POSSÍVEL de si mesmo”, porque muitas vezes o ideal anula o possível e a gente acaba se frustrando com as metas que nós criamos para nós mesmos.

Eu não quero voltar no tempo e viver em 1920 (principalmente pelo banheiro). Eu só queria me encaixar nesse mundo e viver em paz - por mais paradoxo que isso possa ser.

Felicidade em dia
Enviado por Felicidade em dia em 06/07/2022
Código do texto: T7553591
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