Pandemia: o que o coronavírus pode nos ensinar?

O coronavírus trouxe mudanças inestimáveis ao planeta. Não há dúvida: nós, que hoje vivenciamos isso, não nos esqueceremos jamais. Contudo, o presente artigo não tem viés informativo ou quantitativo relacionado aos casos; o que proponho - sendo fiel ao que represento - é uma reflexão: o que podemos aprender com o vírus?

Estamos sozinhos?

O século XXI proporcionou diversas mudanças às sociedades contemporâneas. Vivemos o que alguns chamam de "a era da informação", "industria 4.0", entre outros exemplos que poderíamos listar. Além disso, a tecnologia também abriu margem para novas comunicações, sem limites geográficos. Apesar disso, o que era para representar uma proximidade maior entre os relacionamentos interpessoais, está se afastando um pouco de seu objetivo. Uma pesquisa da BBC Loneliness Experiment, que contou com 55 mil participantes ao redor do mundo, mostrou que 40% dos jovens declararam que com frequência ou muita frequência se sentem sozinhos. 27% dos participantes com mais de 75 anos sentem solidão com frequência ou muita frequência. . Mesmo antes da pandemia (como demostrado na pesquisa) - e apesar de todo o aparato interativo - as pessoas já sentiam solidão. É importante trazer e ponderar esses dados, visto que algumas medidas tomadas pelo Estado implicaram no "isolamento social". Um passeio pelas redes é suficiente para identificar mensagens como: não vejo a hora disso acabar para... Um dia, quando isso tudo acabar, vamos... Que saudade de fazer isso... A nostalgia está no ar, mas cabe uma provocação: será que nós estamos aproveitando o que está em nosso entorno? O isolamento, como demonstrado pela pesquisa, não trouxe o sentimento de solidão - apesar de ser um forte gatilho, não estamos falando da mesma coisa. A solidão implica em uma desconexão: você pode estar rodeado de pessoas e se sentir sozinho. O vírus, no meu ponto de vista, traz consigo uma reflexão para se fazer nos tempos de pandemia: o que fazer para não me sentir sozinho? isso serve para o presente como para o pós-pandemia.

O quanto conhecemos?

A medicina é uma das ciências com maior número de avanços. Para listar alguns deles, temos o tratamento com prótons, novos fármacos no combate ao câncer de mama, robôs cirúrgicos, entre outros exemplos. Entrementes, uma pandemia pode nos fazer refletir sobre algo mais importante ainda: o que ainda não sabemos?

A técnica e a ciência são ramificações de suma importância para os humanos, mas essas mesmas ramificações podem nos tornar reféns de seus saberes, ou melhor, do seus "não saberes". Todos confiamos no trabalho dos médicos, das grandes organizações, dos especialistas e tantos outros que contribuem para o conhecimento, mas uma pandemia coloca tudo isso em xeque, pois vemos, ao longo do tempo, tratamentos falharem, recomendações errôneas, entre outros exemplos. Tudo isso coloca um ponto de interrogação gigante em nossa mente: será que eles sabem o que estão fazendo? Mas a resposta pode ser ainda mais assustadora: se eles não sabem, quem saberá?

Bom e ruim?

O impacto do vírus é mundialmente conhecido . Muitos já deram o seu último suspiro, perdendo o combate para o vírus. Entretanto, apesar de toda tragédia, será que o vírus só trouxe o "mal"? Segundo a agência espacial europeia, os níveis de poluição diminuíram em 50% em países da Europa. Esse fenômeno serviu como gatilho para discussões com relação à industria, e novas alternativas menos agressivas ao ambiente começam a surgir. O impacto é péssimo para os seres humanos: em termos humanísticos e econômicos, mas o planeta parece ter se beneficiado com tudo isso. Isso tudo me faz pensar: seria o bem e o mal apenas abstrações, conceitos criados pelos homens para nomear acontecimentos? Seria uma forma da natureza revidar e mostrar para o homem que um microrganismo é capaz de resultados macroscópicos? Em todo o caso, verdadeiramente, só nos resta inferir.

Política

Quer queira, quer não, o vírus se tornou alvo político no Brasil. Todos cobiçaram a glória de vencê-lo: seja por meio de medicamento milagroso, seja por meio de afastamento; todos queriam o papel de protagonista na história. O vírus ressuscitou discussões proferidas por autores como Burke, Hayek, George Orwell, Marx, entre outros. Os indivíduos passaram a pensar no que o Estado estava fazendo, mas também pensaram em algo ainda mais importante: o que o Estado "não está fazendo". Discussões como liberdades, propriedade privada, direitos e garantias fundamentais, fomentam os debates nas redes. O vírus pode não trazer nenhuma mudança nos políticos (impeachment, renúncia ou algo do tipo), mas certamente mudou o pensamento e a perspectiva de como as coisas deveriam ser administradas. O resultado? Só o tempo dirá...

Nada voltará a ser como era

O título poderia ser feito em forma de pergunta, pois vejo que é algo que paira o cenário dos debates: da pra voltar a ser como era? Se você pergunta em termos físicos, eu tenho que te decepcionar e dizer que é impossível voltar a ser como era. O mundo está em constante mudança. Só existe um hoje, só existe um agora, só existe um 2020, mas alguns se esquecem disso. Maldita procrastinação! Nós dizemos: não vou sair esse sábado, mas vou no próximo, sem falta. O gozado é que nem sabemos se estaremos vivos até lá, mas o complexo de Deus nos toma naquele momento. Voltando à pergunta, é possível fazer tudo igual, do mesmo modo? Talvez não.

Eu acredito que o que vivemos hoje entrará para história, pois trata-se de um fenômeno mundial, todos pararam, por isso é compreensível esse deslocamento e provocação filosófica. Mas não há razão para acreditar que voltaremos a ser o que eramos, pois primeiro é preciso definir o que "eramos" e, além disso, repensar se é possível ser o que eramos mesmo sem aqueles que um dia estiveram conosco. Será possível? creio que não

Seremos melhores?

O futuro é algo que só podemos inferir, ele beira apenas análises especulativas, por isso acredito que não exista ninguém - pelo menos não em sã consciência - que possa dizer: seremos melhores. A grande preocupação não deve ser massiva, isto é, não deve estar conectada às massas. O grande questionamento aqui é: posso ser melhor? Se posso ser melhor, como faço para ser melhor?

Há um provérbio chinês que diz:

"Antes de começar o trabalho de modificar o mundo, dê três voltas dentro de sua casa"

É quase que irrelevante saber se o meu vizinho irá mudar. Se realmente considero importante o processo de mudança, se acho que ela se faz necessária, por que não começar por mim?

O contrário também ocorre: seremos piores? modifiquemos nossa pergunta: o que fazer para não ser pior? A virtude, segundo Aristóteles, é prática. Posso acreditar ser essencialmente bom e fazer o bem, posso acreditar ser essencialmente mal e fazer o mal: mas, cabe refletir: não sou capaz das duas coisas? Reside em mim, pois, duas naturezas? Essa é a grande questão. Moralmente falando, não há como saber se seremos bons ou maus, melhores ou piores, até por ser algo subjetivo, isto é, o que é bom pra mim? o que é bom pra mim é bom para o planeta?

Conclusão: o valor das coisas

Se eu lhe perguntasse agora: o que a pandemia tirou de mais valioso de você, seria quase impossível mensurar a quantidade de itens. A pandemia tirou de alguns a liberdade, o amor, a paixão, alguém, entre outros. A lição mais importante de todas que o vírus pode trazer é: qual é o valor das coisas? A tua família, a tua liberdade, os teus amigos, os teus sonhos, os teus desejos. O que é inegociável para você? Se você refletiu sobre essas provocações, você certamente sabe o valor das coisas.

Para além de todos os acontecimentos nefastos que o vírus trouxe, que possamos refletir sobre o que ainda possuímos, o que ainda nos resta: vida, família, esperança. Se existem pessoas e virtudes que você não deseja negociar, lute por tudo isso, conserve, proteja. Aproveite ao máximo o tempo que você tem com aqueles que ama, pois, como a pandemia nos mostrou, tudo pode acabar. Todos vivemos tempos de incerteza, mas existe uma certeza que possamos extrair de tudo isso: o tempo não para e nem vai parar. O tempo não se limitará às ações de um vírus ou suas consequências, ele seguirá sua trilha. Nossa responsabilidade, portanto, é prosseguir e viver um dia de cada vez - talvez até meio utópico da minha parte - não adiantar o sofrimento de um dia, nem viver o outro, viver apenas o agora, que é o que o tempo nos permite.