A Cartilha
"Para impedir que os infiéis sigam logicamente uma ideia até o fim, lhes desviaremos a atenção para as diversões, os jogos, os desportos, o luxo e as casas públicas. Estes prazeres lhes impedirão que se ocupem de questões sérias, pelas quais, em outro caso, lutariam conosco. Ao passo que se forem perdendo o hábito de discorrer por conta própria, os homens se nos irão entregando cada vez mais, porque só nós seremos capazes de lhes oferecermos continuamente ideias novas...”
Ensinamentos como os acima descritos configuram-se numa estratégia de domínio ou controle de uma sociedade e, por extensão, da alma humana. Interessante notar a peculiaridade de que se revestem em relação ao nosso momento atual – o Carnaval. Com a exacerbada campanha de divulgação conduzida pela maior rede de TV do país. A mesma que conseguiu alterar os horários das partidas de futebol – outro tipo fundamental de divertimento – em função da programação de suas telenovelas.
É evidente que com tal tipo de apelo, até mesmo pessoas que se consideram não alienadas não conseguem se ocupar de questões mais sérias como, por exemplo, a reiteração, em altos níveis, do processo corruptivo enraizado no país há bastante tempo. Ou do que deixam de fazer em prol da comunidade os políticos por ela eleitos.
Esse desvio compulsório da atenção da população para a festa momesca tem um efeito anestesiador sobre os problemas que atingem diretamente a comunidade. E funciona também como uma trégua aos governantes, além do exercício de domínio sobre o conjunto dos munícipes.
O mais engraçado é que esse quadro não tem chance de ser alterado facilmente. A menos que fossemos vítimas, durante o período festivo, de um tsunami ou de uma falta de água absoluta.
É preciso que se entenda que o propósito aqui não é o ensejo de uma campanha contra o Carnaval. Até porque seria totalmente inócua. O Carnaval está em nosso sangue, em nossa alma. Quase que nascemos sambando. Trata-se apenas de chamar a atenção para o reconhecimento de uma estratégia. Tendente a anestesiar a sociedade através de uma festa tradicionalmente brasileira. Com grandes possibilidades de representar a atrofia dos cérebros daqueles que, sob o ponto de vista dos dominadores, são considerados infiéis.
Rio, 15/02/2015