A REBELIÃO DAS MASSAS
O título desta reflexão equivale ao título do livro “A Rebelião das Massas”, do filósofo espanhol José Ortega y Gasset (1883-1955). Livro que ele começou a publicar a partir de 1926.
Ortega Y Gasset analisa, em seu livro, o fenômeno das multidões nas grandes cidades, que começaram a se aglomerar e destacar, especialmente a partir do século XIX. Multidões perambulando pelas ruas. Tudo cheio de gente: ruas, trens, ônibus cheios; estádios cheios, teatros cheios; hospitais cheios, prisões cheias; shoppings e praias cheias de gente. Em comícios políticos, e em manifestações religiosas, multidões se aglomerando... Nestas aglomerações o indivíduo já não interessa, reduz-se à multidão, à massa. Esta realidade faz surgir o homem-massa, um homem comum igual a todos. Na massa, ser diferente é ser indecente. A partir da época das massas as construções começam a ser colossais. Tudo se torna colossal, pois nada mais se destina a indivíduos, e sim às multidões.
Ortega y Gasset tenta entender o que esta formação de massas significa para a humanidade. Primeiramente diz que o homem-massa “é aquele que não se valoriza a si mesmo – no bem ou no mal – por razões especiais, mas que se sente ‘como todo o mundo’, e, no entanto, não se angustia, sente-se à vontade ao sentir-se idêntico aos demais”. Por outro lado, ele também constata que o fenômeno das massas faz crescer a mentalidade democrática. Até leva a uma hiperdemocracia. Se todos são iguais por nascimento, por que existem minorias privilegiadas, aristocracias e diferenciações legais? Com esta mentalidade, as massas começam a exigir tratamentos iguais em todas as relações sociais.
“A Rebelião das Massas”, embora seja um livro da primeira metade do século passado, ainda merece ser lido. É verdade, muitos acadêmicos não gostam de Ortega y Gasset, pois o consideram um pensador predominantemente aristocrático, conservador e direitista. Quanto aos conceitos de “direita e de esquerda”, Gasset diz: “ser de esquerda é, como ser de direita, uma das infinitas maneiras que o homem pode escolher para ser imbecil”. Para ele: “As direitas prometem revoluções, e as esquerdas propõem tiranias”. Portanto, honestamente, não podemos classificar Ortega em nenhum destes paradigmas. Ele se considera um filósofo educador de seu povo.
E o que permanece da “educação” de Ortega y Gasset? Ele constata o fenômeno das massas e do homem-massa. Neste fenômeno há o positivo e o negativo. As massas exigem mais democracia, com igualdade perante as leis, com iguais oportunidades de educação, saúde, cultura, trabalho, moradia e participação política. Mas há também o perigo da manipulação de massas, sem consciência crítica. Ortega adverte: “É difícil salvar uma civilização quando caiu sob o poder dos demagogos”. Por isto aconselha que os mais experientes e sábios da sociedade tenham uma função educadora e de liderança no mundo das massas humanas. Do contrário, políticos inescrupulosos se apressarão em “apagar as luzes para que todos os gatos sejam pardos”. “Apagar as luzes” nada mais é do que fazer dos cidadãos “massa de manobra”, com falsas promessas e meias verdades. O único que lhes interessa é o poder. Um falso poder, sempre será um poder de opressão, semelhante ao poder das baionetas. E, segundo registro em Ortega y Gasset: “Com as baionetas pode se fazer tudo, menos sentar-se sobre elas”. Um poder sentado na força, ou em falsidades, não se sustenta.
Inácio Strieder é professor de filosofia- Recife/PE