Prioridades
PRIORIDADES
Vamos brincar de coisas sérias? Vamos montar uma imagem mental, como um grande slide-show. O leitor está preparado para encarar essa realidade? É coisa comum, você já viu essas imagens antes. Certamente até já se acostumou com elas. Começa com aquelas crianças famintas da África. Aquelas com os ossos visíveis por baixo da pele. Lembra? Aquelas com moscas nos olhos, e uma ave de rapina por perto aguardando a morte do menino desnutrido. Recorda? Os slides se sucedem. Êxodos de populações inteiras. Gente faminta, muito pobre. Gente sem rumo, sem roupa, sem futuro.
Durante décadas, vimos essas imagens. No Discovery Channel, na National Geographic, nos mais concorridos concursos de fotos. Algumas viraram até objetos de arte, em livros de fotógrafos renomados. São imagens de miséria que comovem. São imagens que criam plataformas de governo. Criam Ongs. Criam entidades. Criam movimentos sociais. Geram protestos nos parlamentos, nas universidades, nas igrejas. Protestos, nada mais que protestos...
A miséria pelo mundo, seja em Uganda ou no Ceará, na Índia ou em Bogotá sensibiliza. Ano após ano, discutiu-se, teorizou-se o que fazer. Anos de indignada pressão para sensibilizar uma infinidade de líderes que se sucederam nas nações mais poderosas do planeta. Dizem que 40 bilhões de dólares seriam necessários para resolver o problema da fome no mundo. Resolver? Não, extinguir! Com essa grana toda não haveria mais nenhum menininho terrivelmente magro e sem futuro, em nenhum canto do planeta. Não sei como os burocratas calcularam este número. Mas digamos que esteja subestimado. Digamos que seja o dobro. Ou o triplo. Com 120 bilhões o mundo seria um lugar mais justo, sem violência, prostituição ou miséria humana. O fato é que não houve passeata, discurso político ou filosófico ou foto que sensibilizasse a quem tinha o dever de sensibilizar-se. Não houve documentário, ONG, lobby ou pressão que resolvesse... E tudo ficou, se não pior, pelo menos do mesmo jeito.
Mas em uma semana, vejam bem, em uma semana, sete dias, os mesmos líderes, as mesmas potências, tiraram da cartola 2,2 trilhões de dólares (700 bi nos EUA, 1.5 tri na Europa) para salvar da fome quem já estava de barriga cheia. Aqui no Brasil o Congresso não quer corrigir a renda dilapidada dos aposentados e pensionistas, mas injetou – mais uma vez – de forma criminosa uma mala de dinheiro em bancos suspeitos de gestão temerária. Os pastores evangélicos, que coordenam igrejas do tipo verticalista, só olham para o umbigo. Um deles tem um carro blindado de 600 mil dólares. Outro, comprou um avião de 800 mil. Um terceiro, o mais rico deles, que está fugido lá pelos Estados Unidos tem uma mansão que nem Obama tem.
Quando levantei este assunto, uma pessoa comentou, que é uma pena que esse texto só esteja em pequenos canais e não na mídia de massa, essa mesma que sabe muito bem dar tapa e afagar, cobrir o sol com as peneiras de um capitalismo excludente e imoral. A comparação dessa distorção não vai sair em nenhum grande noticiário nem nas colunas desses “formadores de opinião”. Sabem por quê? Porque o almoço deles está garantido.