JUSTIÇA CRIMINOSA
Para uma convivência harmoniosa e de fraternidade os seres humanos se organizam politicamente em sociedades. Entende-se que estas sociedades se assemelhem a organismos, em que existam diversos setores que as dirijam para seu objetivo, que é o bem comum de seus sócios. Em seu livro sobre o “Espírito das Leis”, Montesquieu, no séc. XVIII, apresentou um modelo político em que os poderes de uma sociedade civilizada deveriam ser três: o Executivo, o Legislativo e o Judiciário. Seriam poderes independentes, mas organicamente sincronizados, para a obtenção do bem comum de todos os cidadãos. Se algum destes poderes não buscasse este objetivo final do Estado, não teríamos mais uma sociedade civilizada, mas uma tirania.
Mas, para que as considerações acima? Simplesmente porque os três poderes de um Estado republicano e democrático, organicamente, devem exercer o seu poder em função do bem comum de todos os cidadãos. O referencial supremo é o bem social, e não o bem individual. O bem individual é uma consequência do bem social. A partir deste princípio, surge o conceito de crime. Criminoso é aquele que ofende o bem social. Todo criminoso, quando ofende o indivíduo, pratica um ato delituoso contra o bem social, pois o indivíduo é parte integrante da sociedade.
A Constituição Brasileira segue o modelo dos três poderes de Montesquieu. Baseia-se também no princípio do bem comum, do bem estar social, donde flui, como consequência, que o Judiciário somente faz justiça quando coloca como horizonte de seu exercício a justiça social. Para isto, o Legislativo põe à disposição do Judiciário as Leis. Como exemplos, temos a Lei 10.741 de 01/10/2003, que assegura aos idosos (60 anos), com absoluta prioridade, o respeito, o não constrangimento, a não humilhação, uma vida digna em todos os sentidos; a Lei 8.069 de 13/07/1990, garante às crianças e aos adolescentes o respeito a todos os direitos fundamentais: moradia digna, alimentação sadia, cuidados com saúde, educação, etc. Há também claras indicações constitucionais quanto aos cuidados para com as mulheres, as gestantes e as mães, para que possam evitar constrangimentos para seus filhos.
Diante disto, não é humilhante, constrangedor e constitucionalmente criminoso quando autoridades judiciárias determinam despejos de crianças, mulheres (grávidas) e idosos de seus lares? “Despejo” significa: jogar algo no lixo. Onde fica a justiça social, a justiça do bem estar social, que antecede o individual, quando friamente se despeja centenas de pessoas: entre elas crianças, mulheres grávidas, idosos? Quem assim ordena, não passa de “justiceiro”, não passa de criminoso para qualquer sociedade civilizada. Com certeza, nem a sociedade brasileira e, muito menos, a pernambucana merecem uma tal “justiça”!Que os índios dos Mato Grossos ,os posseiros pelo Brasil a fora e os moradores da Vila Oliveira do Pina/Recife o digam!
Inácio Strieder é professor de filosofia- Recife- PE