1- Analisando os nossos hábitos, surpresos perceberemos que a atitude insana nos acompanha quase sempre.
 
Todos nós somos loucos?
Parece que sim.
 
Podemos admitir, entretanto, que a normalidade jamais existiu.
Ou talvez seja mais lógico concluir que o normal é ser louco.
 
Será que estou exagerando?
 
Veremos, a partir de agora, que não.
 
2- Na fase infantil, é comum a criança ter um amigo imaginário.
 
Esse amigo some quando o garoto ou a garota cresce.
 
Se ele era um amigo, alguém que nos apoiava, incentivava e consolava nos momentos dolorosos, como pode simplesmente deixar de existir?
 
Refletindo melhor, afirmaremos que as crianças dialogam com “colegas” da imaginação.
 
3- Quando o colega, que jamais foi amigo, é desprezado e descartado, o que começamos a fazer?
 
As pessoas crescidas trocam o colega invisível pelos botões.
Afinal de contas, quem nunca conversou com os botões?
 
A expressão, interpretada literalmente, possui dois erros.
Não estamos o tempo todo vestindo roupas com botões.
Além disso, nós não conversamos, pois há uma fala unilateral.
 
O correto é afirmar que a gente costuma falar sozinho, ou seja, as pessoas gostam de jogar palavras fora.
 
Parece que elas estão dialogando com os botões, com o sofá (eu adoro conversar com o meu sofá) ou com o ser inanimado o qual vê.
Não existe, todavia, diálogo algum, mas um monólogo.
 
4- Há uma frase que diz “o travesseiro é o melhor conselheiro”.
 
Percebam que a pessoa, quando alcança esse grau bem avançado de insanidade, passa a escutar o que ninguém disse, ouvindo o travesseiro oferecer conselhos os quais objetivam solucionar os problemas.
Não são simples opiniões de botequim ou bar, são os mais confiáveis e melhores conselhos.

Nesse caso, a pessoa tem a impressão de que ouve a voz do tagarela, o travesseiro sábio e prudente.
 
5- Eu vou esclarecer o tipo de loucura contido nessa história.

Conversar com os botões ou escutar o travesseiro aconselhando disfarça uma só verdade.
 
Não existe sofá, travesseiro, colega ou coisa alguma.
Tudo isso é papo furado.
Falar ou conversar sozinho é a raiz dessa loucura.
A pessoa produz um incrível monólogo, inventando que está papeando.
 
Ela necessita de um interlocutor para abafar a sua solidão.
Não basta a ilusão de conversar, é necessário também fantasiar ouvir vozes inteligentes.
 
6- As pessoas que sofrem insônia também enlouquecem fácil.
 
Dizem elas que passaram a noite inteira “contando carneirinhos”.
O grau de loucura agora é assustador.
.
Notem que a pessoa não conta, por exemplo, o número de objetos do quarto ou tenta contar algo existente no local.
Ela conta carneirinhos, passando a visualizar um monte deles.
 
Talvez indaguem o porquê dos carneirinhos.
Não poderia contar ursinhos ou patinhos?
Eu não sei explicar porque escolhem carneirinhos, contudo garanto que sempre há muitos carneirinhos, pois a contagem jamais termina e a insônia permanece.
 
Tais pessoas precisam ser internadas já!
 
7- Sem dúvida alguma, a paixão estimula uma loucura perigosa.
 
O apaixonado, quando pensa na outra pessoa, vê uma terceira.
A pessoa real desaparece.
Ele enxerga alguém perfeito, sem defeitos, sem qualquer chatice.
 
Ela vê o príncipe encantado refinado, no entanto o careca feio cospe no chão, diz mil palavrões, coça o saco, não lê, fala com a boca cheia, é um craque no campo da grosseria.
 
As ilusões, nessa fase, apontam uma maluquice quase irrecuperável.
 
8- A loucura, certas vezes, pode ser confundida com mau humor.
 
Caso esteja chovendo demais, lamentamos e ficamos aborrecidos.
Vem o verão trazendo bastante calor, o que passamos a dizer?
“Que calor” “Não aguento mais!”
 
Nos ônibus lotados o calor sufoca.
De repente começa a chuviscar, as pessoas, que suavam aflitas, fecham as janelas imediatamente.
 
A forte loucura faz o indivíduo perder toda a sensibilidade.
Ele não consegue perceber o que é frio ou quente.
 
9- Vou encerrar narrando um estágio gravíssimo de loucura.
 
Quem cria cachorros declara  o seguinte:
“Eu não considero o meu cachorro um animal, eu falo com ele como se estivesse conversando com uma pessoa estimada.”
 
O tratamento agora sugere o uso de choque elétrico.
 
Notem que a pessoa confunde o fedor que segue o cachorro com a pele cheirosa de um ser humano.
As pulgas não são percebidas e os latidos soam como frases de amor.
 
É necessário agir rápido, pois, se o cachorro passar a dormir ao lado da pessoa, a cura talvez se torne impossível.
 
10- Como recuperar a sanidade, Ilmar?
 
É importante identificar o início dos distúrbios mentais.
 
Não podemos aceitar os “colegas invisíveis” dos nossos filhos.
Uma opção é tirá-los da fantasia, apresentando amigos visíveis.
Interagindo com pessoas de carne e osso, as crianças automaticamente esquecem esses colegas imprestáveis.
 
Conversar sozinho tem jeito?
Enquanto a pessoa apenas conversa com os botões, sofás e paredes, há esperança.
Quando ela começa a receber conselhos dos travesseiros, no entanto, é muito mais difícil deletar o problema.
O limite para a demência, nesse momento, é bastante sutil.
Não podemos vacilar.
 
E os carneirinhos?
Combatendo a insônia, com sucos de maracujá e bingoladas, os doces carneirinhos sumirão.
 
As loucuras dos apaixonados, quando a namorada passa a morar na casa do rapaz querido, somem sem demora.
Geralmente a visão enlouquecida muda radicalmente.
Ela descobrirá que o “Tom Cruise” é um cidadão horrível, desdentado e deseducado.
Dá vontade de sair correndo.
 
11- Eu sugiro um remédio eficaz demais contra a loucura.
 
Leiam poemas!
 
Após ler bastante poemas, as antigas loucuras virarão fumaça.
Só restarão as metáforas, os versos suaves e a expressão da emoção.
 
A sanidade voltará a brilhar
 
12- Antes a pessoa conversava com os botões ou sofás.
Agora dialogará com as estrelas.
 
Antes a pessoa escutava os conselhos dos travesseiros.
Agora ela ouvirá somente a gentil voz da inspiração.
 
Antes ela dormia com cachorros.
Agora ela dormirá abraçando livros de poetas brilhantes.
 
Antes ela estava apaixonada pelo Tom desdentado e sem educação.
Agora ela só pensa em Drummond e Bandeira.
 
Enfim, se todos amassem a poesia, a loucura deixaria de existir.
 
** Peço licença para encerrar, pois, enquanto molho minhas plantas, preciso saber se elas gostaram do meu mais novo texto.
 
Um abraço!
Ilmar
Enviado por Ilmar em 19/09/2013
Reeditado em 19/09/2013
Código do texto: T4488126
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