O IDOSO ENTRE A LEI E O DESCASO

O Estatuto do idoso é uma grande conquista social e jurídica do idoso. O tema deste artigo será o fornecimento de medicamentos, sendo certo que referido Estatuto – Lei 10.741/2003 – garante a todos os idosos a proteção à vida e à saúde, tudo com o objetivo de lhe ver assegurado um envelhecimento saudável e digno (art.9º), assim compreendido, dentre os demais direitos, o fornecimento gratuito de medicamentos no sistema único de saúde (par 2º,art.15).

No espírito da lei, vê-se que se trata de uma medida grandiosa. Na prática, contudo, o que se vê é um grande descaso, pois, a sua eficácia – na maioria das vezes – só ocorre através de ações judiciais. O que era para ser bom vem se tornando penoso e desumano.

Um grande parceiro dos idosos, na garantia desse direito, é o Ministério Público, vez que já se tornou pacífico o entendimento de que o mesmo detém legitimidade para propor ação civil pública em defesa e direito individual indisponível à saúde do idoso, cuja obrigação é tanto da União, quanto dos Estados-Membros, Distrito Federal e Municípios, e o SUS é composto por todos eles, existindo aí – em função da solidariedade – o chamamento judicial de qualquer um deles, ou de mais de um, numa eventual ação para a obtenção do fornecimento de medicamentos. O idoso pode, assim, mover ação contra o Município e o Estado para figurarem solidariamente no polo passivo da ação por ele impetrada.

Mas, o bom é que nada disso ocorresse. Veja o seguinte: o cidadão que está doente precisa, muitas vezes, urgentemente, de um medicamento de uso contínuo, que precisa ser tomado todos os dias, como é o caso, por exemplo, de pacientes diabéticos que necessitam da insulina do tipo básico Lantus. Dias atrás, li uma reportagem na qual a presidente da Associação dos Diabéticos, aqui em Cuiabá, denunciava a falta do medicamento e alertava para o fato de que a sua suspensão poderia causar cegueira, lesionar os rins e levar o paciente para uma hemodiálise, além de correr o risco de amputação de membros, acidente vascular, infarto e derrame.

A melhor solução, como é óbvio, seria a obtenção do medicamento de forma imediata. A Justiça, por mais rápida que seja (e nesses casos o Juiz é bastante célere), ainda não é um bom caminho porque vai exigir do doente que ele entre com uma ação, quando o que ele tudo deseja, naquele momento, é apenas ter o remédio que é de uso contínuo, e que ele não pode deixar de tomar nenhum dia, como é o caso do exemplo acima. Mesmo que o pedido judicial seja acolhido, em sede de pedido liminar, no mesmo dia (já tive muitos casos), o seu cumprimento levará muito mais tempo porque a autoridade competente nem sempre a cumpre com a urgência que o caso requer; e a demora no seu atendimento, nesses casos, poderá representar sérios e graves prejuízos à saúde do idoso, o que nem sempre é levado em consideração pelas nossas autoridades, numa evidente demonstração de indiferença ao problema. Não fosse assim, o remédio nunca faltaria.

O caso, contudo, é sério e o idoso, a exemplo de outros, só consegue fazer valer o seu direito através da Justiça. Recente balanço do Conselho Nacional da Justiça nos dá conta da existência de cerca de mais de 240 mil processos na área da saúde. Em Mato Grosso, o que se sabe é que entre novembro de 2010 a abril de 2011 a Secretaria de Saúde do Estado recebeu 1.912 decisões judiciais, e deste total 1.021 se referem a fornecimento de medicamentos. Por dia, ela recebe uma média de 10,6 liminares/dia. A impressão que se tem é triste e péssima, sendo certo que parece que a coisa só funciona à base de decisão judicial, o que é uma lástima.

O fornecimento gratuito de medicamentos é um dever constitucional que o Estado não consegue cumprir satisfatoriamente na sua integralidade, e o bom em tudo isso é que a lei fosse cumprida sem necessidade de nenhuma ação judicial. Se a demanda é grande, os nossos governantes precisam se esforçar para adequar a realidade ao espírito da lei, garantindo o fornecimento imediato de medicamentos.

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