A história da humanidade é marcada profundamente por este conceito: "Eucatastrophe". "Eucatastrophe é um termo criado por J.R.R Tolkien que se refere à súbita mudança de eventos no final de uma história que garante que o protagonista não é a vítima de um terrível, iminente e provável destino. Ele formou a palavra adicionando o prefixo grego "Euro", que significa "bom", uma "catástrofe", a palavra usada tradicionalmente na crítica literária para se referir ao resultado clássica ou conclusão de um teatro." Bem vindos a "Boa catástrofe".
     Por estarmos em um mundo caído, proveniente da consequência de uma livre escolha dos nossos antepassados, de tempos em tempos percebemos que nossa existência antifragil é abalada, e quebrada diante das tragédias a qual somos expostos por vivermos consequências da queda no Éden, a ''grande'' escolha de Adão e Eva, que faz de nós miseráveis, desgraçados, imperfeitos e traz a tona o que já somos em essência: insuficientes.
     Essas consequências constantemente tentam minar a esperança manifesta naquela relação profunda que observamos na viração do dia, onde o próprio Criador e sustentador do universo dialogava com nossos representantes no jardim de forma profunda envolvidos pela perfeição. Eles viviam em perfeita comunhão com o Criador. Até que de repente o cenário muda. A perfeição é banhada de tragédia.
     Ao olhar para trás com nossa essência insuficiente, afetada pelos efeitos noéticos da queda (o pecado afetou a razão humana), ao fazermos este sobrevoo histórico encontramos nesta cena a maior catástrofe que o mundo pôde conhecer. O pecado nasce gerando a morte em todo seu aspecto destrutivo, seja no que é da ordem da interioridade humana, como também no cosmo.
     No cenário pós queda conseguimos perceber diante da revelação especial que a dinâmica da vida humana consiste em um Deus trino que transborda de amor e que constantemente desce ao nível humano, isso acontece porque jamais conseguiríamos chegar ao nível dele por nossos esforços. Um Deus totalmente bondoso e poderoso em busca de sua criatura que insiste em ser o que não foi criado para ser. Vivemos essa recusa do ser quase que diariamente. "Somos a única criatura que luta para não ser o que somos."
     "A relevância da visão eucatastrófica de Tolkien para a apologética começa com o fato de que ela inclui, necessariamente, o reconhecimento da catástrofe. Vivemos em um mundo despedaçado, caído, e sofremos os efeitos do pecado. Qualquer apresentação do evangelho que tente ignorar tal realidade será banal, rasa e, em última instância, tanto desinteressante como pouco convincente. Jesus é o nosso amigo, mas não o nosso “amigão”. Temos esperança, mas nossa fé não é um tipo de passe livre do sofrimento."
     O servo sofredor na revelação especial "desce" voluntariamente para viver entre os homens, o que convencionamos chamar de encarnação. De uma vida simples em seu nascimento até sua ascensão. A partir deste ponto a humanidade jamais seria a mesma, se seu sacrifício na cruz traz a tona um profundo sofrimento, uma "eucatastrophe", seu nascimento é onde reside o sofrimento máximo, é Deus encarnando, é Deus entre nós, se submetendo a um corpo mortal, mesmo que sem pecado.
     Trazer à memória a cena do Cristo ressurreto descrito nas escrituras com chagas nas mãos em um corpo glorificado me traz uma certa angústia, ainda mais por saber que lá na eternidade o corpo dEle estará marcado, e o nosso corpo estará totalmente restaurado. Isso só nos faz compreender ainda mais o amor com que Ele nos amou.

Ninguém tem maior amor do que este, de dar a vida em favor dos seus amigos. João 15.13

     Ao refletir sobre tragédias dentro da cosmovisão cristã, percebo que essa eucatastrophe é sempre seguida de redenção, o processo para aqueles que vivem em submissão ao autor e consumador da fé se mostra trágico, mas logo tudo muda sem perder a realidade do que é redentivo, a redenção sempre chega. Não somos redentores, mas nossa natureza geme por redenção. Em Cristo reside tudo que necessitamos para não perder de mente essa boa catástrofe que é amar a Ele acima de todos as coisas e perder a vida para poder achá-la.
     O evangelho é esta Boa catástrofe. Nos deparamos com Ele e jamais seremos a mesma pessoa. Somos convocados a morte que gera vida, a uma renúncia que gera identificação com o Cristo, o servo sofredor, o homem de dores que prova em sua jornada que dar é melhor que receber.
     “O Nascimento de Cristo é a eucatastrophe da história do Homem. A Ressurreição é a eucatastrophe da história da Encarnação. Essa história começa e termina em alegria. Tem preeminentemente a ‘consistência interna da realidade’. […] Essa história é suprema; e é verdadeira.”
     O evangelho é por si só essa boa catástrofe, e Cristo mais uma vez nos convida a Ele e por meio do arrependimento podemos passar pelo que é trágico em nós e sermos transformados no que é redentivo nele.

"Porque nele nos encontramos e a Ele nos devolvemos."
Abra a Porta e Osvaldo Santos
Enviado por Abra a Porta em 24/02/2021
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