Qualquer um que ame ou tenha amado algum dia sabe das belezas e complexidades do amor. Por que? Como? O que amamos? De que forma nós, dentro de nossas inconstâncias e corrupções, somos capazes tal nobreza? Esses e outros questionamentos demonstram o quanto o amor por vezes pode se revelar uma arte preciosa, porém complexa de se compreender.
Para aprendermos a respeito do amor, então, é preciso que, primeiro, nós pensemos no amor de Deus por nós. Em sua eterna completude e perfeição Ele nos cria pelo puro prazer de manifestar seu transbordante amor. Em seu filho unigênito perdoa nossa rebeldia dolorosamente crucificando em si nossas transgressões. Tão grande Ele é que, pacientemente, nos ensina dia após dia a amá-lo, pois nisso reside a plenitude que nosso coração anseia sem cessar.
Nós, todavia, somos necessidade pura, sem nada a poder oferecer-Lhe. Até mesmo nossa capacidade de amar é Sua dádiva. Assim, em face à perenidade da graça divina, nossa inaptidão fica ainda mais evidente. Desta maneira, ao conhecer e reconhecer as maravilhas de Seu grande amor é possível que nos encantemos apaixonadamente. Como no sentimento adolescente até os movimentos da outra pessoa são poesia, ao compreender a mensagem da cruz, a tão grande Salvação que encontramos em Cristo, ficamos transbordantes e encantados com tamanha beleza.
Segundo C.S. Lewis, nós podemos, em parte, chamar isso de “amor-necessidade”. Embora seu título não pareça tão sublime, para o autor a necessidade é também uma forma de amar. Como o recém nascido ama a mãe mais do que tudo, afinal, ela é claramente sua fonte de vida e alimento, amamos por reconhecer-nos frágeis e completamente dependentes de Deus. Amamos como quem aceita com humildade ser incondicionalmente amado. Amamos com a gratidão de quem sabe que não fez nem pode fazer nada para merecer. E, se entre as pessoas esse amor-necessidade pode passar quando a necessidade passa, no caso de Deus, nossa necessidade Dele jamais vai passar. É um amor realista.
Entretanto, o mesmo autor nos apresenta ainda um outro tipo: o “amor-doação”. Para ele, somente almas muito exaltadas são capazes de amá-Lo assim. Ao ponto de dar sua vida por Ele. O que traz à memória alguns momentos da vida do Apóstolo Pedro. Quando Jesus disse que ele o negaria, Pedro respondeu: “Senhor! Estou pronto a ir contigo, tanto para a prisão quanto para a morte” (Lc 22: 33). Não obstante, ele o negou.
Mesmo assim, é preciso que pensemos que muito antes deste episódio, o apóstolo já havia deixado tudo para seguir o Salvador. Diante disso, é possível inferir que, ao invés de faltar sinceridade nas suas palavras, talvez tenha lhe faltado consciência a respeito de sua própria capacidade de amar para além de suas necessidades. No entanto, após a ressurreição, Jesus lhe pergunta se ele O ama, Pedro sabiamente responde: “Senhor, tu sabes todas as coisas e sabes que te amo” (Jo 21:17). Neste momento, consciente da onisciência de Cristo, o apóstolo entende que só o Senhor sabe de seu amor.
Ao refletir sobre tais eventos podemos perceber que, como Pedro, nem sempre temos consciência da profundidade do que dizemos ou sentimos. Assim sendo, assumir a fragilidade e inconstância de nosso caráter no que diz respeito a amar para além de nossas necessidades é o primeiro passo para o amadurecimento do amor. É esplêndido poder reconhecer que nossa eterna necessidade está suprida em Deus. É melhor ainda poder saber que até nossa capacidade de amá-lo vem Daquele que a conhece melhor do que nós. E, se reconhecer as maravilhas de ser amado é um privilégio, amar é como Paulo disse no mais belo texto sobre o amor: “um caminho sobremodo excelente”.
Talvez o “vazio do tamanho de Deus” nas palavras de Dostoiévski, ou o “desassossego do coração que amou tardiamente” da fala Agostinho, sejam, por fim, pelo fato de que, tendo sido criados à imagem e semelhança de um Deus que é amor, o caminho para a completude de nosso ser seja aprender a ser por Deus amado e também a desfrutar do maravilhoso privilégio de amar.