O Papa Francisco diz que sonha com uma Igreja pobre para os pobres. Até aí não vemos nenhuma novidade nesse sonho do novo Papa. Pois isso é o que a Igreja de Roma sempre fez desde o início de sua história. Pregar a pobreza como a principal virtude de seus fiéis. Com isso, elevaram a cláusula pétrea o postulado segundo o qual “ é mais fácil um camelo passar pelo fundo de uma agulha do que um rico entrar no Reino dos Céus.”
Esse postulado, Jesus pregou aos seus discípulos porque não os queria apegados aos bens do mundo, mas sim, totalmente comprometidos com a causa a qual ele servia. Já os bons padres da Igreja de Roma souberam usá-lo muito bem para disseminar a filosofia do “pobre de espírito” que herdará o Reino do Céu em troca da pobreza e da ignorância em que viverem na terra. Enquanto isso, o conhecimento e a opulência não seriam interditos aos membros do clero, que, ao que se sabe, nunca passaram necessidades na vida. Aliás, a carreira eclesiástica, até bem pouco tempo atrás, era tão concorrida, que toda família importante sempre quis ter um padre nos seus quadros. Os cargos mais altos na Igreja eram comprados a peso de ouro.
Portanto, não é nenhuma novidade esse sonho do Papa em querer uma Igreja pobre, para os pobres. Isso é o que a Igreja de Roma sempre quis. E sempre teve sucesso nessa filosofia. Para os outros. Não é a toa que a grande maioria dos católicos está entre a população dos chamados países subdesenvolvidos. E na Europa, os países mais pobres são justamente aqueles onde a maioria da população é constituída de católicos.
O povo é pobre, a Igreja é rica. Isso não tem nada de estranho. Toda estrutura de poder que se fundamenta em dogmas apresenta essa característica. aliás, o dogma existe justamente para isso. Para evitar que coisas que não podem ser explicadas sejam discutidas.
É necessário que o poder se revista de pompa e circunstância para que o seu brilho ofusque os olhos das pessoas e os impeça de ver o que existe dentro da estrutura. Como bem diz o carnavelesco Joãozinho Trinta, o povo gosta de ostentação e luxo. Ele não se curva ao simples, ao que parece igual a ele. Não é toa que os primeiros deuses da humanidade foram o sol a e lua. Eles brilham. Eles estão no alto.
Assim, pregar o instituto da pobreza sempre foi uma filosofia da Igreja de Roma. Claro que não para o clero, nem para a própria Igreja enquanto instituição. Pois sabidamente, o Vaticano nunca teve nada de pobre.
Todavia, há uma coisa boa na eleição do novo Papa. Ele é jesuíta. Os jesuítas sempre foram o que de melhor a Igreja de Roma produziu até hoje. Sua filosofia humanitária e realmente preocupada com a felicidade do povo, já lhe rendeu vários conflitos com os donos do poder e com a própria cúpula da Igreja. A Ordem dos Jesuítas já foi, inclusive, suprimida pela Igreja em 1773 pelo Papa Clemente XIV, em virtude da sua conduta, tida pelos católicos conservadores e pelos governos déspotas como excessivamente envolvida em assuntos políticos. Conseguiu recuperar suas prerrogativas, mas volta e meia alguns de seus membros são vítimas de perseguição política ou eclesiástica em virtude de alguma “rebeldia”. Um exemplo de perseguição e intolerância, ocorreu com o Padre Pierre Teilhard de Chardin, um dos maiores intelectuais que a humanidade já produziu. Os jesuítas, a propósito sempre tiveram um histórico de luta e resistência contra alguns institutos que envergonharam a história do ser humano, como a escravidão e o genocídio de raças e minorias.
Torço para que o Papa Francisco honre a história da Cia. de Jesus. Como fizeram os Padre José de Anchieta e Manuel da Nóbrega, por exemplo. E quem sabe talvez não esteja na hora da Igreja Católica mudar essa cantilena: pobreza não é virtude e não leva ninguém para o céu. Ao contrário, a elegia da pobreza mantém um inferno sobre a terra. Que o diga a maioria dos países africanos e latino-americanos. Estes últimos, todos de maioria católica, diga-se de passagem. Todo mundo tem direito de ter uma vida digna e sonhar com o que de melhor ela pode oferecer. Desejar um clero pobre, vá lá, mas o povo não precisa ser. Essa é uma música que ninguém quer dançar mais.