Presunção de santidade

PRESUNÇÃO DE SANTIDADE

Eu fui convidado a falar a um auditório sobre um assunto de espiritualidade bem complicado: santidade. O “público-alvo” era um grupo de pessoas pertencentes a um desses “movimentos de leigos” que reúne cristãos da classe média com desejos obter progresso espiritual.

A dinâmica proposta consistia em três etapas: uma exposição de meia hora, vinte minutos para debates em grupos, e mais meia hora para as conclusões e o fechamento do preletor.

Eu comecei falando nos processos históricos de santidade desde a saga dos juízes e dos reis de Israel até a produção literária dos profetas, onde todos freteniam suas vozes proclamando o projeto de Deus. Depois me detive nos anúncios de Jesus Cristo, que preconizou a todos uma santidade igual a do Pai. Ora, como Jesus não faz promessas impossíveis nem jogo de palavras, suas mensagens são verazes, e suas propostas plenamente exequíveis. A santidade é atingível, sem dúvidas.

Depois, na conclusão dos grupos, a chapa esquentou. Um cidadão se revelou alguém livre de pecados e por consequência já entronizado no processo de santidade que Jesus recomendou. Sua fala se caracterizou pela arrogância, como se já vivesse o céu aqui na terra, e todos tivessem nele o modelo acabado de perfeição e santidade. O discurso do homem que, por uma questão de caridade não recebeu apartes, criou um mal-estar no auditório.

Em matéria de santidade sabemos que se trata de um processo dinâmico, um conjunto de etapas concêntricas que vão aos poucos se realizando. Perfeição, conversão e santidade são esforços nunca acabados; nós estamos sempre nos convertendo, nos santificando e buscando perfeição. Essa busca nunca se acaba, até o dia do encontro, quando nossas ações serão julgadas e provadas. Até lá somos míseros mortais, pecadores em busca de perdão, peregrinos a procura de um caminho novo. Nós nunca estamos convertidos, justificados ou santificados, mas sempre a caminho. Julgar-se santo e perfeito nesta vida é vaidade e soberba;

A estratégia do diabo é sagaz e traiçoeira. Quando ele não consegue nos fazer cair nos grandes pecados, ela suscita um desejo de superação, santidade e perfeição. Assim iludido o homem peca pela arrogância, pela vontade de ser mais santo que os outros, de ser mais perfeito. É salutar buscar a santidade, sim, mas sempre com a consciência de nossas fraquezas e limitações.

O exacerbado desejo de santidade pode, em alguns casos, pelas razões acima, trazer consigo uma inspiração diabólica. Toda a presunção implica em falsidade. Na presunção de santidade se pode enxergar o dedo do diabo.