O Cristianismo e sua relevância
Meditar sobre o Cristianismo é, ao mesmo tempo, meditar sobre a definição do homem sobre o qual sempre se tentou articular a dimensão corporal e a dimensão espiritual através do sentido da vida.
A priori, o homem é o único ser que apresenta as seguintes características: inteligência/razão; abstração e reflexão. A partir dessa ideia, percebe-se que o homem é o único ser capaz de progredir intelectualmente e, ao mesmo tempo, fazer a sociedade evoluir devido a sua enorme capacidade inventiva que se modifica de geração a geração, uma vez que a atual tem a oportunidade de possuir mais conhecimentos que a anterior. Destarte, o homem em si tem a consciência que os outros animais não contem. Fala-se da capacidade de independência das leis biológicas do mundo animal: consciência reflexiva pertencente apenas ao homem. Para ilustrar essa demarcação, o homem é o único ser capaz de utilizar a matéria imediata: o homem investiga objetos os quais lhe possam ser úteis instantaneamente.
Sobre todas essas características, Platão afirma que o homem é formado pela psique, alma e espírito. Sendo assim – e de acordo com essa ideia -, não pertence a este mundo, colocando-se em um patamar mais elevado ao da natureza. Segundo a corrente filosófica do Materialismo, só existe o corpo sem espírito no homem, podendo este ser reduzido apenas à matéria, pois há uma diferença entre corpo e consciência a qual emerge dessa matéria. Aristóteles, assim como Platão, contrapõe as funções corporais e espirituais: o homem é um todo cujas funções físicas, vegetativas, sensitivas e espirituais não pertencem ao corpo, mas ao homem como um todo.
Para o Cristianismo, há um modo de ser-homem através do qual existe uma forma de comportamento, de falar, de relacionar-se com Deus e com os outros e com a natureza. Ou seja, a existência do indivíduo somente vai ocorrer mediante ao contato com outros individuo, tornando-se o Outro e diferenciando a sociedade dele mesmo, uma vez que, por meio do pensamento do Existencialismo cristão, o universo liga-se paradoxalmente às coisas e consente a união do homem e de Deus através de Jesus.
Esta compreensão permitiu, segundo esta antropologia, dar ao homem uma visão sobre o mundo e ele mesmo. Com sua extensa habilidade de compreensão, abstração e reflexão, comportaram-se na esfera da civilização três etapas desenvolvimento socioeconomicamente: a da visão teocêntrica, em que ocorria a sacralização da natureza; a filosófica, que corroborava a uma visão contemplativa individual e sociopolítica; e a etapa científico-técnica, que evolui em favor da relação profana à natureza admitindo o homem como centro da natureza e ativo da subjetividade a partir de um pensamento progressivo, dinâmico e mecanicista, cujo racionalismo instrumental resultava em uma autonomia, independência e liberdade do sujeito.
A ultima etapa , dominada pela civilização industrial, deu origem às consequências antropológicas indesejáveis: comercialização das relações humanas; ambição pelo progresso ilimitados; as leis da seleção natural aplicadas às sociedades humanas (nações industrializadas eram mais aptas); o tempo começou a ser visto de forma linear (o grande valor do serviço era dado à evolução, ao progresso e ao crescimento econômico); fome, miséria e inúmeras doenças não foram erradicadas como se esperava; depredação da natureza; o processo cientifica-técnico, segundo Th. W. Adorno e M. Horimer, escravizou o ser humano, a mecanização toma conta da vida do ser humano e a racionalidade toma conta da natureza e do ser humano.
Logo, além da própria marginalização (econômica, social, política, cultural, etc.), o sistema de colonização e neocolonização provocaram uma consciência oprimida caracterizada pelo mutismo, pela passividade, pelo fatalismo e pela submissão, ou seja, as estruturas de opressão dominam a consciência das pessoas que chegam a comprometer o desenvolvimento das características básicas das pessoas. Resultado: a situação de dominação acaba sendo um dado natural para o ser oprimido e este se assume incapaz e inferior, intensificando a injustiça e o peso esmagador das estruturas de opressão, das relações de dominação formadas em sistemas.
Este sonho da modernidade acaba estruturando um parricídio: nega-se Deus e a religião que, segundo Nietzsche, está fora da filosofia. De acordo com este filósofo, a “morte de Deus” forma um super-homem que é o criador de novos valores – que também podem ser destruídos. Essa visão niilista identifica o super-homem com Dionísio: um deus epícureo que é um tipo de homem divinizado e a encarnação da vida que dá rédeas soltas aos impulsos do prazer. Por conseguinte, o niilismo acaba por privar um gosto de empenhar por uma razão mais alta tornando a sociedade atual, acarretando a falta de filhos mais livres e mais iguais, mas que produz dependências dramáticas e origina guerras, limpezas étnicas, fornos crematórios, fomes, etc.
A principal necessidade do homem - de acabar a diferença e a falta de paixão pela verdade - se torna a nostalgia do Totalmente Outro o qual vem à tona para não disseminar o horizonte de desigualdades e do sentido da violência. Neste sentido, seria necessário percorrer a uma definição de sentido do sagrado contra a afirmação niilista para se resgatar os ideais do sagrado que dão luz ao retorno do amor pelo próximo, uma solidariedade, e põe fim a miséria social ocasionada por manipuladores de ideologias.
No Cristianismo, Jesus foi considerado o “filho do homem”, cuja condição humana incide sua aproximação aos excluídos e desamparados com a intenção de ser servidor e não dominador. A realidade atual ainda não mostra todas as ações cristãs de forma completa. Ainda existem grandes dominações de grandes nações sobre outras distanciando países pobres dos ricos, não ocorrendo, logo, a plena hominização do homem a qual se supõe a humanização de Deus.