Fala, Senhor!
FALA, SENHOR!
Eu sempre costumo dizer em meus escritos e falas, que os cristãos sabem muito pouco de oração. Sabemos rezar, mas uma boa parte de nós não sabe orar. Como temos uma coletânea de orações que aprendemos desde a infância, ficamos presos à recitação decorada desses textos, atropelando as palavras como um narrador de futebol, sem dialogar com Deus, chegando à distração e ao esquecimento.
Diferente de rezar (repetir), orar é conversar (dialogar) com Deus. Um místico medieval afirmou que orar é conversar com Deus, amando-o e escutando-o. Quando nossa espiritualidade dilata devidamente nosso coração e nossa inteligência, aprendemos a, no silêncio da oração, escutar o que Deus quer nos dizer. Muitas vezes o Senhor quer dizer algo ao nosso coração, mas nosso palavreado não nos permite escutar o que ele tem para nos falar. Sob esse aspecto, Jesus nos adverte que não se deve pensar que é pela repetição de palavras, como fazem os pagãos, que seremos ouvidos pelo Pai (cf. Mt 6,7). Na oração, como em tantas coisas da vida, vale mais a qualidade do que a quantidade.
Samuel era um menino judeu que foi entregue por seus pais ao sacerdote Eli para que se tornasse um servidor no templo de Javé. Uma noite, depois de ouvir mais de uma vez seu nome ser chamado, ele respondeu: “Fala, Senhor, teu servo escuta!” (cf 1Sm 3,10). Deus não fala conosco no barulho, mas espera que nosso coração se acalme para, no silêncio fazer ouvir a sua voz. Orar é falar com Deus, mas também é ouvi-lo.
Conheço uma pessoa que, antes de dormir, faz suas orações simples, rápidas e sucintas, e logo adormece. Na madrugada, Deus o acorda para conversar com ele. É a hora da grande, espontânea e profunda oração. Você já notou que muitas vezes, sem qualquer explicação e sem motivo aparente, perdemos o sono no meio da noite? É Deus que quer conversar conosco, e aproveita o silêncio e o escuro do quarto para falar ao nosso coração. O curioso é que essa pessoa é despertada, mais ou menos à mesma hora todas as noites. Ora, quem acorda e começa a ruminar todos os fatos do dia, repassando a agenda do dia seguinte, não vai conseguir escutar a voz de Deus.
Os especialistas em oração (Santos Afonso, Agostinho e Bernardo, mais os teólogos Jacques Loew e Anselmo Grün) costumam recomendar que se procure, para a eficácia desse encontro, entrar em “espírito de oração”, esvaziando-nos de tudo que possa nos distrair, para criar um grande espaço interior, onde o Infinito possa penetrar e nos tomar em seu abraço. Se não preenchemos nossos momentos de silêncio e solidão para escutar Deus, caímos no perigo de nossa mente ser conduzida e manipulada pelo Adversário.
Sempre que nos abrimos, no “espírito de oração” é salutar clamar, como fez o jovem Samuel:
Fala, Senhor, teu servo escuta!