UMA EXPERIÊNCIA
Numa manhã de setembro de 2010, após uma caminhada no nas trilhas das montanhas próximas da cidade de Lambari, encontrei um pé de pitanga extremamente florido e com muitas abelhas com as patas estufadas de pólen. Aproximei-me.
Estava sozinho, mas queria falar, comentar aquela visão maravilhosa. Não me contive e comecei a falar ao vegetal florido:
— Você é melhor do que eu... Forrarei o chão com as suas folhas e sobre elas poderei dormir muitas noites e, com certeza, não serei incomodado com nenhum cheiro desagradável... E eu, meu amigo? 24 horas após a minha morte, por questão de saúde e higiene, terão de me isolar num local lacrado com concreto ou terra. Mas não se empolgue tanto! Olhando bem para você, acabo de descobrir que o perfume de suas flores, para atrair as abelhas, você não tem capacidade de produzi-lo por si só!... Sem querer diminuí-lo, acredito que essa beleza que você exibe vem de alguma sabedoria distante; inclusive a disciplina perfeita dessas abelhas que nesse momento ajudam você, também não vem delas. Vocês dois não sabem de nada. Não têm a menor noção do que fazem, mas fazem...
O fato é que resposta à pergunta que sempre me atormentou pareceu-me que começava a nascer. Então cheguei mais perto do pé de pitanga e segurei em dos seus ramos. Passei a respirar pausadamente, procurando ouvir a entrada e a saída de ar nos pulmões. Num primeiro momento, os sentidos ficaram aguçados, tentando me tirar do caminho que começava a me levar para dentro do meu eu mais profundo. Prossegui insistindo. Sem querer, arrumei um feixe de perguntas, mas para minha satisfação não consegui nenhuma resposta. Devagar procurei abandonar as perguntas. Conclui que elas eram elaboradas por uma mente condicionada pelos ensinamentos gravados na minha memória, portanto, não tinham valor espiritual. Continuei, de repente parei diante do NADA. Aos poucos, vi-me como uma gota de orvalho que se deslocava da ponta de uma folha e caía sobre o oceano. Naquele instante, o meu e o eu deixaram de existir. Então pude misturar a toda água e a todas as coisas. Dissolvido, consegui parar sobre a ponte que liga o passado ao futuro. Imóvel no momento presente, consegui espalhar-me no geral, no todo — a vida, a morte e o tempo deixaram de ter importância. A paz simplesmente existia e ponto final.
Navegando naquele mundo de compreensão e entendimento, acho que repousei ou amoldei-me ao inexplicável. Não ouso fazer qualquer questionamento sobre o ocorrido. Não há como descrever o que experimentei...
Não sei com precisão quanto tempo permaneci naquela situação. O fato é que, sinceramente, gostaria que o caminho de volta tivesse sido apagado.
Dessa experiência posso dizer o seguinte: procure e um dia encontrará algo surpreendente... O que procuramos pode estar mais próximo do que imaginamos.
jorge lemos autor do romance "São Tomé das Letras e o Pacifista"
@lemos1122