O DIABO, ANTECIPADAMENTE, AGRADECE
 
Uma velha piada forense diz que o Diabo foi levado ás barras de um tribunal para ser julgado. Mas como era cidadão com passaporte de todas as nações da terra, ele invocou o direito de ser julgado no país de sua escolha, pois seus crimes eram contra a humanidade e não contra pessoas ou legislação de um estado em particular. Então ele pediu para ser julgado no Brasil, pois aqui, segundo seus advogados, seria mais fácil defendê-lo. Além da proverbial bagunça do nosso sistema jurídico, se ele fosse condenado, a execução da pena poderia ser prolongada eternamente. Além do que, quando o processo fosse para o STF, sua absolvição estaria garantida.
Então o velho Sartrana, como o chamam os italianos, foi extraditado para o Brasil e aqui submetido a julgamento.  Os advogados dele alegaram perseguição política por parte de Jeová, que segundo eles, era um patriarca misógino, autoritário, chauvinista e arrogante, que não admitia qualquer oposição á sua autoridade. Condenava sem julgamento, prendia sem processo, censurava a imprensa, impunha um regime de terror ao seu povo; enfim, era um ditador de carteirinha, cruel, insensível e malvado. Por isso Satanás promovera uma rebelião com o objetivo de abrir os olhos do povo, escravizado e ignorante, que por não ter qualquer outra opção, era obrigado a se submeter a um regime de exceção tão perverso. Nessa condição foi preso e considerado subversivo. Portanto, seu crime era político e como tal devia ser julgado.
Sua defesa citou exemplos nacionais e estrangeiros de outros rebeldes que foram condenados em seu tempo e depois acabaram sendo reverenciados como heróis nacionais. William Wallace, Nelson Mandela, Che Guevara, Tiradentes e outros foram lembrados.
O tribunal está discutindo o seu caso até hoje. Enquanto isso Satanás está solto. Trabalha livremente assessorando empreiteiros e políticos, cabalando muitas almas para o seu rebanho.
Sem dúvida, a estratégia do Diabo em pedir para ser julgado no Brasil foi genial. Só não gostaria de servir como jurado nesse julgamento, pois depois de tudo que eu ouvi do Ministro Marco Aurélio e do Gilmar Mendes a respeito do chamado garantismo constitucional que permite a libertação de criminosos perigosos e contumazes só por causa de uma filigrana jurídica, todos os meus valores seriam abalados. Para uma Corte Suprema que tem ministros como esses (incluindo Lewandowsky e Toffoli), eu posso acabar me convencendo de que o Diabo realmente é inocente e Deus é mesmo um ditador impiedoso.
No Apocalipse, São João disse que Satanás ficou preso por mil anos. Não sei localizar na régua do tempo quando isso aconteceu. Mas se aconteceu, ou ainda está para acontecer, tenho certeza de que esse julgamento não foi feito, nem será, num tribunal brasileiro. Nem foi parar nas mãos de um dos Ministros acima citados. De qualquer modo, o Diabo, antecipadamente, agradece.