NATUREZA DE ESCORPIÃO

Que somos um povo politicamente imaturo parece ser um pressuposto inegável. Salvo a monarquia, que durou mais de sessenta anos (1822-1889), nós não conseguimos, até agora, estabelecer um regime político estável que conseguisse sobreviver, sem traumas, por mais de trinta anos. Por que será que isso acontece? Não vale invocar nossa juventude como estado independente (que não chega a duzentos anos) como justificativa para tantas cabeçadas políticas, pois há estados mais jovens que já alcançaram estabilidade há muito tempo e conseguiram desenvolver instituições sólidas o suficiente para agüentar as intempéries que a ordem social e política sempre agasalha em suas entranhas. 
Nossas crises são endêmicas e cíclicas. Ocorrem de vinte em vinte anos, e sempre que surgem, o primeiro pensamento para resolvê-las recai em soluções radicais, que atentam contra a ordem constitutiva que tanto se tem procurado afirmar, desde que conquistamos a nossa independência. Dilma apelou para o general Villas Boas, quando as manifestações de rua começaram a engrossar as vozes pelo seu impeachment.
Felizmente ele foi sensato e não surfou na onda dela. Agora é o Bolsonaro que dirige suas baterias tuiteiras contra professores e estudantes que reclamam contra sua política de desmonte da educação. Prefere devolver a agressão ao invés de ver o que está errado.
Os constituintes de 1988 optaram por um modelo de estado que pudesse dar proteção constitucional a tudo que, na cabeça deles, representasse direito do cidadão. Redigiram um catálogo de direitos impossível de ser assegurado por um Estado ainda pobre em recursos econômicos. Ao mesmo tempo em que catapultaram o cidadão brasileiro para um salto sem pára-quedas, engessaram o Estado numa camisa de força burocrática e num modelo tributário e trabalhista que impedem o país de andar com suas próprias pernas em busca de um desenvolvimento econômico sustentável.
As manifestações desta semana contra os cortes de verba para a educação nos dão bem a idéia do “monstrengo” criado pelo pacto político que resultou na Constituição de 1988. E ao longo da crise que se instalou no país, percebe-se claramente que corremos o perigo de uma nova ruptura da ordem constitucional, pois o equilíbrio das contas públicas e a construção de uma matriz econômica que possa sustentar, pelo menos uma parte básica dos direitos que o cidadão brasileiro sabe que tem, mas não pode exercer por falta de recursos, implicará em uma reforma profunda no próprio modelo de Estado que hoje temos. E evidentemente, quem se sentir prejudicado reagirá.
Ninguém está pensando no país. Todos estão brigando pela própria fatia do bolo. Um bolo que míngua cada vez mais á medida que os ânimos se exaltam. Por mais mesquinhos que possamos ser, chega uma hora que é preciso ter um pouco de juízo. Fora disso só vamos provar que somos todos como os escorpiões da fábula, que nem para salvar a própria vida foi capaz de ter bom senso.