A fraqueza dos planos de segurança de Bolsonaro e Doria (II)

No artigo anterior, examinamos aquilo que chamamos de "porta de entrada" da segurança pública e vimos a inadequação do plano político de Bolsonaro para o combate ao crime, nessa dimensão mais básica.

Mas ainda há uma outra porta, a de entrada, que precisa ser monitorada, se se quer um trabalho eficiente de combate ao crime organizado. É o lado do recrutamento de pessoal, por criminosos: eles aliciam e corrompem jovens (e mesmo adultos desesperados), seduzindo-os para os seus esquemas ilícitos - o tráfico de drogas, por exemplo.

Note bem, se você perguntar a alguma criança o que ela gostaria de ser quando crescer, nenhuma responderá que deseja ser trombadinha, traficante ou ladrão. Portanto, se elas caem para esse caminho depois, algum fator as induziu - e são esses fatores em conjunto que precisam ser enfrentados, por constituírem a porta de entrada no mundo da marginalidade. Geralmente são causas de ordem social ou pessoal, como pobreza extrema, ambição material por ostentação e por ai vai ...

Dirá você, com razão, que conhece muitos garotos pobres que não foram para essa vida, o que é verdade. Mas muitos vão, e em quantidade suficiente para termos a situação desesperadora que hoje se vê, na segurança pública.

Então, investir em uma educação de qualidade que ensine o valor da vida, dos valores éticos e do civismo; que incentive os jovens a buscar a riqueza do saber, da cultura e dos esportes; e finalmente, investir em programas sociais concretos que incluam estes jovens no mercado de trabalho, com um futuro à vista, são algumas - apenas algumas - das muitas medidas socioeconômicas que tomaria um bom estadista em favor de seu povo, para evitar o desencaminhamento e o fornecimento de mão de obra jovem, gratuita e descartável para o crime organizado, bem como para evitar a morte da população e de policiais, como está a ocorrer agora.

A dimensão de entrada também inclui reavaliar as finalidades da Justiça e das leis - por exemplo, as muitas brechas que permitem a advogados regiamente pagos por criminosos defendê-los de maneira escandalosa, ou a traficantes montarem seu escritório na própria cadeia.

O conhecimento das relações orgânicas entre as duas dimensões da segurança deveria estar explicitado no programa de Bolsonaro, cristalinamente - o que, infelizmente, não se verifica. Existe uma ruptura entre as propostas sociais e as de segurança de Bolsonaro, o que significa que o crime organizado não perderá recursos humanos, em que pese toda a ação repressiva contra ele, pois, acredite, o banditismo está preparado para resistir a qualquer fortalecimento da polícia. Os traficantes têm grana, poderio militar e até empatia com setores das população onde o Estado está ausente. Não importa o quanto a polícia esteja armada, ela vai perder a luta contra o banditismo - e com isso, nós, a população, também, devido ao governo continuar a não admitir os vínculos entre o âmbito social e o futuro dos jovens.

Essa é uma verdade que mesmo o general do Exército Eduardo Villa Bôas reconheceu, ao comentar a falta do Poder Público em implementar medidas socioeducativas contra o baixo desenvolvimento humano, no Rio de Janeiro. (1)

O governo ficou surdo todos estes anos e permanecerá assim com Bolsonaro (se eleito), a julgar pelo seu programa de governo míope e pelos seus discursos inflamados, porém vagos. (Continua ...)

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(1) www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2018/08/para-comandante-do-exercito-aparentemente-so-militares-se-dedicam-ao-rio.shtml

Fabio Rush
Enviado por Fabio Rush em 04/10/2018
Reeditado em 04/10/2018
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