(De um artigo publicado em 2014, salvo erro)


LULA EM NEW YORK
 
Lula esteve cá. O jornal New York Times de 13 de Fevereiro dava conta duma visita que o ex-presidente do Brasil fez ao grande jornal americano e de uma entrevista dada por ele a alguns dos seus  editores.
Uma das perguntas que lhe foi posta tinha de ver com a aparente incapacidade do Brasil em atrair o investimento da alta tecnologia para o Brasil, à semelhança do que acontece na China.
A resposta de Lula da Silva a esta questão resume, em poucas palavras, toda uma dinâmica de vida que foi a sua e que o guindou da extrema pobreza em que decorreu a sua infância, até tornar-se numa das mais influentes personalidades do mundo, e possivelmente o mais capaz político brasileiro de sempre. Com doze anos Luiz Inácio da Silva era um pobre engraxador nas ruas de São Paulo, e hoje, com 68 anos,  o mesmo Luiz Inácio, agora já Lula da Silva, é o 35º (ex)presidente do Brasil e um dos mais influentes políticos da cena internacional. 
            Nem a imaginação de Horácio Alger foi capaz de criar, nos seus célebres romances de rags to riches, tão consumado herói.
            Porque é que o Brasil tem dificuldade em atrair os investimentos das grandes empresas da tecnologia moderna, como faz a China? A resposta de Lula, segundo o citado New York Times foi esta: “Nós não queremos ser competitivos como o é a China, onde não há  assistência social, onde não há obrigações para com os trabalhadores, onde não há  pensões, onde não há sindicatos, onde as pessoas ganham salários muito baixos. Nós não queremos esse modelo para o Brasil...”
            A vida de Lula foi isso. Desde menino pobre a engraxar sapatos nas ruas da grande cidade, até presidente do Brasil, a vida de Luiz Inácio Lula da Silva, foi uma luta constante pelos direitos dos trabalhadores, uma luta contra a injustiça social, contra a pobreza, uma luta pela dignidade humana. E uma luta, graças a Deus, bem sucedida, vitoriosa mesmo, em muitos aspectos.
            Aos 14 anos Luiz Inácio era aprendiz de torneiro numa fábrica de cobres. Aos 19 trabalhava numa fábrica de peças para automóveis e foi aí que perdeu o dedo mínimo da mão esquerda. Terá sido este acidente que o atraiu para a vida sindical que havia de tornar-se no cenário onde decorreria a maior parte da sua vida profissional, e na arena onde ele viria a travar (e a vencer) as grandes batalhas pelos direitos dos trabalhadores.
Luiz Inácio, com um dedo esmagado por uma prensa fabril, teve de correr para vários hospitais antes de ser atendido.  O sindicato apoiou-o e despertou-lhe o interesse pelo sindicalismo. Dedicou-se ao movimento laboral e foi crescendo no respeito e admiração dos seus companheiros.  Em 1975, com 30 anos, foi eleito presidente do Sindicato dos Metalúrgicos  de São Bernardo do Campo e de Diadema duas das quatro cidades que formam o centro da indústria automóvel do Brasil.
O facto de se viver então debaixo do punho de ferro da ditadura militar (1964-1985) criou ao movimento laboral momentos muito difíceis. O próprio Lula esteve preso... Mas há males que vem por bem.  O presidente do Sindicato dos Metalúrgicos (e futuro presidente do Brasil) foi aprendendo um dos traços mais importantes do seu perfil politico, o sentido prático e a arte de transigir, de contemporizar, de negociar que informou toda a sua actividade política.
A melhor definição de política que conheço diz exactamente isto: a politica é a arte do possível. E se me pedissem para apontar dois políticos que foram realmente exímios no exercício dessa arte, eu indicaria, sem qualquer hesitação, a Nelson Mandela e a Lula da Silva. Dois homens que, de um e outro lado do Atlântico, presidiram, nos seus países, à mais radical transformação da respectivas histórias.  Mas que o fizeram com arte, com verdadeiro génio, transigindo, insistindo...
A transformação do Brasil durante os dois mandatos presidenciais de Lula da silva (2003-2010) arrancou às garras da pobreza cerca de cinquenta milhões de brasileiros. A maneira como essa “revolução” foi levada a cabo foi complexa e não cabe na pequenez deste artigo. Mas eu quero deixar aqui para os meus sobrinhos curiosos duas palavras sobre um dos vários programas de segurança social a que presidiu o 35º presidente do Brasil e que realmente contribuiu para a transformação radical do grande país da América do Sul.
Em Março de 2009, pouco depois da reeleição de Lula para o seu segundo mandato, o Social Security Department do ILO publicou em Genebra um documento intitulado Bolsa Família in Brazil : Context, concept and impacts. Umas 25 páginas de texto, gráficos e listas que constituem uma excelente e breve descrição do talvez mais arrojado e, sem duvida, mais inteligente programa de segurança social do Brasil. É um programa de redistribuição de riqueza e por isso mesmo tem os seus críticos e os seus inimigos. Consiste a dar às famílias mais pobres acesso a uma  pensão suplementar que lhes permite furar as malhas da indigência e assumir um papel activo na vida económica local. E é exactamente aqui que está a virtude da Bolsa Família.
A participação no programa é condicionada a certos comportamentos da parte das famílias beneficiadas  que passam pela frequência escolar, vacinação dos filhos,