A intervenção inevitável
É possível que existam pessoas que deplorem a intervenção federal. Por se tratar de uma intervenção militar. No entanto, se a reação dessas pessoas não pauta, de certo modo, por um saudosismo aos idos de 64, ela incorpora um discurso que hoje se afigura como anacrônico. Isto é, o poder vigente é civil. E o decorrente da intervenção militar que no dia de hoje se instaura, restringe-se à área da segurança.
Depois de vinte longos anos de torturas, desaparecimentos de pessoas, barbárie, arbítrio, ausência de democracia, sob o regime militar, o poder foi devolvido aos civis. E o que se sucedeu? O aprofundamento da corrupção, que chegou a atingir níveis de institucionalização. Com a participação, inclusive, de figuras de proa da esquerda, que não se identificariam em 64 com procedimentos dessa natureza. Uma tragédia que não se limitou a figuras secundárias dos meios empresarial e político, mas a influentes deputados, senadores e ministros de Estado. E até presidentes da República, como o atual e alguns que o antecederam.
A metástase, portanto, não é apenas da “ação do crime organizado”. É também da prática corruptiva.
O foco da ditadura militar era ideológico. O da ditadura civil e mercadológico.
Em 64, o sistema perseguia o indivíduo pela sua opção marxista, por exemplo. Hoje, de certo modo, o sistema tem como foco a realização de operações financeiras que podem até ser ilícitas. Não só em termos de desvio de recursos públicos, mas de tráfico de drogas e de armas, por exemplo, que não têm sido interrompidos. Porque há pessoas que deles se beneficiam. No âmbito do colarinho branco ou de qualquer cor.
Nesse sentido, ou na ditadura civil de hoje, o cidadão comum é perseguido por um sistema opressor que não lhe garante condições mínimas de atendimento médico, de saneamento, emprego, moradia e nenhuma condição de segurança. Como os moradores do Rio, capital e estado.
Isso pode ser atestado pelas condições de penúria a que foram submetidos cariocas e fluminenses durante o governo Sérgio Cabral. Que teve como sucessor o governador Pezão – que admitiu ter perdido o controle do estado – e o apoiamento entusiástico do ex-presidente Lula – exemplares da direita e da esquerda, portanto. Penúria que se desdobrou nas condições de insegurança total, determinantes da intervenção federal que nesta data se inaugura.
Rio, 16/02/2018