A verdade que vos digo é que no Maranhão não há verdade- Padre Antonio Vieira.
O jesuíta Padre Vieira foi o pioneiro da literatura brasileira. Mestre do discurso, das palavras rebuscadas, tinha língua ferina e uma pena não menos contundente. Suas homilias causavam estragos nas reputações dos farisaicos senhores da sociedade colonial, que pensavam comprar o perdão de Deus doando á Igreja gordas ofertas, feitas com dinheiro ganho com trabalho escravo.
A língua e a pena do Padre Vieira sempre lhe causaram constrangimentos. Expulso de Portugal por causa dos seus viperinos sermões denunciando os vícios da alta sociedade da época, ele foi mandado para o Maranhão, onde verificou que a tendência corrupta do ser humano só muda de lugar. Onde o dinheiro fala mais alto, a virtude se cala e a moral se enfurna no mais recôndito dos esconderijos.
Ao Maranhão, onde viveu de 1652 a 1661, dizia ele, com sua verve insuperável, se tivesse que ser identificado no abecedário de Drexélio, (colega jesuíta de Vieira que viveu entre 1581 e 1638 e bolou um dicionário onde os vícios expressos em língua portuguesa são listados), caberia uma longa lista que começaria pela letra M, tais como malsinar, mexericar, mentir, maldizer, melindrar, e por aí afora.
Essa tirada do Padre Vieira vinha de uma lenda que dizia que o Diabo, saindo do inferno, espalhou-se pela Europa inteira, em cada país deixando um pedaço de si. A cabeça teria ficado na Espanha, daí os espanhóis terem a cabeça quente; os pés caprinos na França, daí o gosto dos franceses pela agitação e pela dança; o ventre satânico teria ido para a Alemanha, razão da eterna gula daquele povo; e a língua do demo foi parar em Portugal. Por isso a língua portuguesa teria tantas palavras para representar coisas ruins.
Se Drexélio e o Padre Vieira vivessem hoje, o que eles não poderiam falar do Maranhão depois de por lá passarem a família Sarney e o novo diretor da Polícia Federal, Fernando Segóvia? Quantos verbetes mais, com a letra M, eles não poderiam acrescentar ao abecedário dos vícios expressos em língua portuguesa, depois da ação deletéria desses personagens na vida pública brasileira?
Dos Sarneys viria, por exemplo, os verbetes miséria, malandragem, malversação, mancomunar, mistificar: do Dr. Segóvia, pelo menos o neologismo “mala” para definir a aceitabilidade de uma prova. Pois para esse bizarro policial não basta uma mala cheia de dinheiro sujo para comprovar a prática de um ato de corrupção.
A Polícia Federal, até agora, tem sido uma esperança real de passar este país a limpo. Mas com esse “mala” na direção da PF não sabemos como ficará. Tomara que não vire uma vassoura de empurrar sujeira para baixo do tapete. E não faça a gente pensar que o Maranhão, esse lindo estado, que já nos deu tanta gente boa, seja considerado, de fato, um lugar que só produz aquela coisa mal cheirosa que também começa com M.