A Burrice que Reinaldo de Azevedo não viu

O artigo a seguir procura desenvolver outra perspectiva da ideia de "burrice da direita", que o jornalista da Veja Reinaldo de Azevedo intitulou e tratou num artigo de poucas semanas atrás. Ele procura entender o que esta levando Lula a retomar as preferências de voto para 2018 mesmo diante de denúncias e contumaz publicidade que a mídia dá às mesmas. Escrevi um texto longo, mas creio bem claro e com muitos argumentos para endossar a proposta apresentada no título.

> A Psicologia do Ódio ao Lula

É interessante como uma figura como Lula, que não é presidente tem pelo menos 6 anos, nem participou de cargos no governo Dilma, consegue despertar tanto ódio e interesse de certas pessoas em seus problemas com a justiça.

Não que seus problemas com a justiça não seja de interesse público, mas se a questão é esta ladrões de merenda, construtor de aeroporto em fazenda de tio, presidente com cheque nominal suspeito e 40 delações deveriam incomodar muito mais do que tráfico de influência.

Se o Lula foi o chefe da quadrilha, como gostam de dizer, a quadrilha continuou agindo e organizada mesmo neste governo. Aliás tais esquemas, empreiteiras-propina-governo, remontam o tempo da ditadura militar. Enfim, era pra ele ser um dos odiados, um odiado tanto como seria Collor, FHC, Dilma e Temer.

No entanto ele é visto como uma figura central, como um pai fundador da corrupção no Brasil.

Não foi no governo de Lula que a classe média teve mais perdas ou achatamentos. O que explica este ódio seletivo ao Lula é algo mais sociológico do que econômico.

É preciso imaginar que a tarefa mais preocupante a classe média é manter seu próprio status. Um auxiliar de limpeza, assistente de alguma coisa, motoristas, atendente possuem um investimento na conquista e manutenção de suas carreiras muito menor do que os empregos de classe média.

O governo do PT garantiu ganhos reais no salário mínimo que garantiu não só uma renda maior para as classes baixas como deu ás mesmas acesso a bens de consumo e serviços antes reservado as classes médias. Viagens de aviões, aquisição de imóveis e carros por pessoas historicamente distanciadas deste tipo de consumo incomodaram muita gente.

A classe média ainda sofre a pressão por grupos ascendentes que pretendem concorrer com ela, por meio de investimentos em educação e formação, que o governo do PT garantiu por meio de expansão

universitária, política de cotas, financiamento estudantil e outras ações.

Este é o fundo sociológico ao ódio que a classe média possui contra o Partido dos Trabalhadores. O aspecto psicológico do ódio ao Lula precisa ser pensado a partir deste fundo.

Vamos comparar duas figuras públicas emblemáticas Joaquim Barbosa e Luiz Inácio Lula da Silva.

O primeiro, filho de empregada doméstica, ascendeu acadêmica e profissionalmente dentro de uma estrutura excludente - sem cotas ou políticas de afirmação. Especialistas chamam isto de superseleção, visto dos tantos negros existentes no Brasil, ele é uma minoria visível até mesmo quando víamos a origem dos outros ministros do Supremo.

Joaquim Barbosa aprendeu e dominou o português culto, a gentileza, os gostos, a cultura e o fino trato que distingue os cidadãos de classe e a elite "pensante" do país. Teve seu lugar garantido.

Luiz Inácio Lula da Silva, ainda com origem semelhante, galgou o caminho reservado aos pobres. Fez curso de torneiro mecânico no Senai para melhorar sua renda, tornou-se sindicalista buscando melhorias e direitos aos companheiros de luta das fábricas do ABC paulista.

Passou a década de 90 inteira se candidatando a presidente e sendo derrotado. Ele foi deputado constituinte e só. Não seguiu carreira parlamentar como muitos candidatos que fizeram disto uma profissão.

Chegou a presidência no início dos anos 2000, depois de anos de estagnação econômica e salarial do governo FHC. Eu vivi os governos de Fernando Henrique Cardoso, desemprego, salários baixos, inflação controladas mas sem dinheiro no bolso pra comprar.

Lula chegou a presidência sem mudar o estilo, o jeito, a cultura sindical, o traquejo com o povo que o permitiu ser o sindicalista que lotava estádios e falava com multidões sob a mira de metralhadoras de helicóptero do Exército Brasileiro.

Aquele "desleixo" com o português, sem empostação de voz, dando exemplos que o povão pudesse entender o tornou muito popular e acessível a população. Mas algo incomodava os que não se consideravam povão.

Agora vem o aspecto propriamente psicológico que quero ressaltar. Imagina o sujeito de classe média, que cresceu achando que quem não sabe inglês hoje em dia é analfabeto, que pra ser alguém precisava ser educado, culto, ter bom gosto e colecionar diplomas. Este sujeito vê como presidente um sujeito que é avesso disto tudo e pior vê seu governo sendo bem sucedido.

É evidente que existencialmente isto o afeta. É como se ele tivesse se enganado ou sendo enganado. Este mesmo sujeito acredita que o PT piorou o Brasil em termos de emprego e economia, como se

o Brasil fosse bem melhor na época do FHC ou anteriores.

Na visão deste sujeito, antes do PT tínhamos muito emprego, bons salários e crescimento econômico razoável. Mas isto não é verdade até o fim dos anos 70 no Brasil. Se conhecemos algum período de maior prosperidade até então fora no governo Lula.

Se ele desperta este incomodo existencial na classe média, que a leva ser pouco inteligente nas suas conclusões sobre economia e politica social nos últimos anos, por outro lado Lula tem muito apelo com o chamado povão.

> A meia crítica de Reinaldo de Azevedo

Um crítico e jornalista liberal chamado Reinaldo de Azevedo, acusou a direita no Brasil de burrice. Detalhe é que parte desta direita o segue como oráculo. Creio que ele não tenha atingido o cerne da questão na sua crítica. O que esta fazendo o Lula crescer mesmo com denúncias

publicadas a exaustão na mídia? Onde está a burrice da direita?

Primeiro, a direita esta se identificando e defendendo um governo que se reconhece como impopular que esta tomando as medidas mais drásticas já tomadas contra a economia popular. Ameaçando direitos

mexendo em aposentadoria de assalariados, congelando gastos em saúde e educação das quais o povão é diretamente dependente.

Não só a mídia esta fazendo isto apostando que o povo não esta percebendo que ela é contra seus direitos. Odiosos tem postado a cada notícia sobre esta política de cortes comentários debochados contra os que reclamam e elogiosos ao governo. Estes mesmos odiosos que comemoram indiciamentos e debocham de Lula e dos que defendem políticas sociais.

Segundo, vejamos o que trabalhador que lê estes comentários, o jovem filho deste trabalhador, sua esposa também trabalhadora, o que eles começam a pensar? Ou melhor. A sentir em relação ao Lula e em

relação a esta direita que se diz muito equivocadamente liberal?

Estas pessoas que ligam a TV, que leem manchetes de jornais, que comentam e leem comentários odiosos no facebook. O que elas pensam?

Quando estas pessoas veem aqueles que elogiam o governo e a política de cortes debochando do PT e do Lula? Elas pensam "o Lula poderia voltar". Pois justamente o governo dele ficou marcado pelo inverso em relação a direitos.

Esta burrice estratégica não é compartilhada por toda a direita. Por que tem jornais, antes apoiadores do governo Temer, que hoje estão mais críticos? Não é por que estão apoiando o PSDB necessariamente, mas como vender o jornal para trabalhadores tentando fazê-los engolir aposentadorias impossíveis, facilitação de demissões, congelamento na saúde.

Quanto mais aqueles que defendem congelamentos e outras medidas deste governo falarem mal do Lula, mas mostrarão que este se opõe as esta políticas. Que este é uma alternativa a austeridade.

Não estou entrando no mérito destas políticas, estou tratando de questões de estratégias políticas e ideológicas que a direita não está dominando e que a esta levando a buscar em golpes institucionais a sobrevivência política.

> As razões da burrice

Não me refiro a questões cognitivas quando falo de burrice aqui. Mas é algo evidente em estudos de psicologia como deturpamos a realidade, que se tange através da lógica e da coerência de pensamento e julgamento, quando nos encontramos envolvidos ou dominados por alguma paixão.

Ódio, inveja, desejo, competição e sentimento de inferioridade nos levam facilmente a transgredir as regras que nos orientam a evitar contradições e incoerências no julgamento do outros e de si mesmo.

A sensação de ter algo roubado não se limita a bens materiais. Me sinto roubado quando sinto que outros tem mais do que merecem. Quando tem mais do que eu, sem ter se esforçado o mesmo. Quando sinto que aprendi tanta coisa e o outro que não aprendeu o que aprendi esta melhor e mais reconhecido que eu.

Este é o sentimento que a classe média tem em relação ao petismo e sua figura emblemática que é Luiz Inácio da Silva.

Esta sensação que os leva a julgarem de forma seletiva, escandalizar-se mais com a corrupção de uns do que de outros, a serem egoístas a ponto de profissionais qualificados, bem pagos e respeitados se incomodaram com quem depende de 150 reais de bolsa família, a ponto de pedirem volta da ditadura, de aplaudirem torturadores, de chamarem de "mimimi" a luta de mulheres, negros e homossexuais por sua dignidade. De acharem bem feito que pessoas precisem aposentar mais tarde para terem alguma dignidade nos seus recebimentos.

*Segue um link para um dos artigos que Reinaldo de Azevedo trata da burrice da direita: http://veja.abril.com.br/blog/reinaldo/desastre-direita-burra-faz-lula-recuperar-prestigio-eleitoral/

ou http://veja.abril.com.br/blog/reinaldo/a-direita-burra-faz-o-seu-trabalho-burro-datafolha-prova-isso/

> Ele defende que a estratégia de escândalo político esta atingindo mais o governo do que o Lula e seu partido. Achei que ele não aprofundou muito a questão, mas isto o leitor pode ir no seu artigo e ver por si mesmo.

Wendel Alves Damasceno
Enviado por Wendel Alves Damasceno em 17/12/2016
Código do texto: T5856053
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