Barriga Cheia
Pessoas ligadas e arraigadas ao PT consideram que os condenados pela Ação Penal 470 (o Mensalão) são presos políticos e que teriam sido vítimas de um julgamento de exceção.
É de se desconfiar que sejam extremamente ridículas essas considerações petistas. Em primeiro lugar porque não foram essas as experiências com as quais nos deparamos na época da ditadura. Tendo alguns de nós sofrido na pele as sandices e perversidades de um regime, esse sim, declaradamente de exceção. Regime cujos tentáculos estiveram muito próximos (ou até mesmo atingiram) de alguns dos que hoje se acham condenados.
As pessoas na ditadura eram presas não por cometerem ou participarem de atos de corrupção. Mas por defenderem ideias incompatíveis com a cartilha militar. Houve quem fosse preso apenas porque tinha em casa um livro de Mao Tsé Tung ou publicações com os nomes de Guevara, Ho Chi Minh ou Fidel Castro. Teve também gente que foi presa, ou prejudicada em sua vida profissional, simplesmente porque falava russo!
E não tinha muitos advogados dispostos a defender essas pessoas. Porque não havia vantagem alguma em se tornar antipático ao regime militar.
Deve ser lembrado que, após a instituição do AI-5 – a marca maior do regime de exceção –, era extremamente penosa a obtenção do habeas corpus. O que só eminentes juristas, com o saber e talento de um Sobral Pinto, por exemplo, devem ter conseguido.
Em segundo lugar, não pode ser considerado um julgamento de exceção o desenvolvimento de uma Ação Penal em que aos réus foi concedido amplo direito de defesa. A partir, inclusive, da atuação de alguns ministros do STF em defesa quase que declarada de determinados réus, como foi o caso do ministro Ricardo Lewandowski. Para não nos cingirmos à nomeação do presidente do STF feita pela presidência petista do país.
E finalmente, o que de mais ridículo pode haver nessa questão é a espetacular reação que esse julgamento vem provocando junto a determinados eleitores brasileiros. Porque face à romaria que se verificou após as prisões ao Presídio da Papuda, pelo menos, ao que parece teria aumentado o número de filiações ao PT. A se confirmar essa possibilidade, o que seria uma derrota para o partido, acaba, na verdade, se tornando uma vitória.
Também pode, de certo modo, ser considerado um reflexo desse julgamento do Mensalão e das prisões que se sucederam o fato de pelo menos um dos condenados ter conseguido empregar-se com o belo salário de R$ 20.000,00 como gerente de hotel.
E ainda, como prova da total ausência de excepcionalidades nessa história toda, ficamos sabendo que um dos condenados consegue valer-se de seu estado de saúde para merecer o tratamento respeitoso que não se pode negar a um cardíaco. Apesar de, submetido a exames médicos específicos, ter sido constatada uma gravidade apenas relativa. Que não o impediria de cumprir a pena sob o regime para ele estipulado.
Se todo esse caso e suas consequências configuram-se num sistema de algum tipo de exceção, o que dizer dos tempos paradisíacos da ditadura? Será que não há ninguém chorando de barriga cheia?
Rio, 26/11/2013