Falta de Higiene
O Brasil carece de uma higienização política. Talvez há 500 anos. Se pensarmos um pouco, não houve durante esse período mudanças significativas na vida brasileira que pudessem alterar substancialmente uma situação que se repete indefinidamente. Ou seja, os pobres continuam sendo pobres, e cada vez em maior número, com o crescimento populacional. E os ricos se esforçam para manter suas fortunas e repassá-las aos descendentes. Com a agravante de que as condições de vida – ou a sua qualidade – dos menos favorecidos não foram tão favorecidas. Em que pese todo o avanço tecnológico ou o aperfeiçoamento das leis sociais e trabalhistas.
Com relação aos negros, também grandes alterações não foram substanciais. O problema criado com a abolição da escravatura, com eles não tendo onde comer ou onde trabalhar, embora livres, de certo modo, apesar de sutil, ainda permanece. Na medida em que as oportunidades que têm não são as mesmas que têm os que não são da cor. Se assim não fosse, não haveria a necessidade da arbitração de cotas para o estudo universitário.
O desrespeito aos cidadãos comuns, ou aos de segunda categoria em diante, talvez hoje seja ainda maior. A partir do próprio governo, que promove uma incidência de massacrantes impostos à população numa proteção eterna ao capital. Favorecendo a conhecida máxima segundo a qual “no capitalismo o lucro é privado e o prejuízo é público”.
As agências nacionais, incluindo-se o Banco Central, têm compromissos maiores com os empresários do que com os contribuintes em geral. É comum um banco ser socorrido pelo governo quando se encontra em delicada situação de saúde financeira. O mesmo socorro não ocorre em relação à população, quando é submetida a aumentos inexplicáveis em planos de saúde, contas de luz, de telefone, etc. Ou às taxas cobradas pelos bancos de varejo.
Ninguém nunca viu um prefeito ou governador se posicionar contrariamente aos preços extorsivos cobrados pelo estacionamento de veículos em shoppings e supermercados. O que é até natural. Enquanto você elege o político com um voto, os shoppings contribuem para a eleição dele com fabulosas somas em dinheiro.
Na época da ditadura, os militares no governo usurpado tiveram a ajuda de empresários e notórios empresários do jogo do bicho na execução do plano bem sucedido, e concebido no exterior, de impedir a implantação no país de uma república socialista. Como se isso pudesse ter sido pior do que o esfacelamento da educação e do ensino nos mais de 20 anos de autoritarismo.
Aliás, ironicamente hoje, uma esquerda dissimulada se preocupa com o retorno de uma ditadura de direita, com a qual ela agora costuma flertar, como se esse tipo de governo fosse uma tradição brasileira. Ou não fosse repelido como foi, embora veladamente, desde o primeiro momento após o fatídico 31 de março de 1964.
O aumento das passagens de ônibus que foi sustado no ano passado a partir de inúmeras manifestações públicas, será agora autorizado, com o respaldo das autoridades municipais ou estaduais.
O povo tem sempre que pagar. Os empresários e o governo é que não podem deixar de receber. Com aumento.
Parece-nos que o problema é que nessa relação não se procura o equilíbrio. E esse equilíbrio jamais será alcançado enquanto não houver o aperfeiçoamento moral do político brasileiro. Cujos compromissos com o povo só existem antes das eleições. Depois de eleitos, prevalecem as benesses do cargo.
Que deveriam ser substancialmente reduzidas. Aproximando-se a condição do eleito à do eleitor comum para que o político pudesse efetivamente se comprometer com o povo.
Rio, 07/02/2014