IMAGENS, METÁFORAS E SIMBOLOS.

Por Carlos Sena

 
Há pessoas que dizem não ter medo de barata, mas nojo. Nojo, neste caso, serve para as duas versões: “se alguém sente nojo de barata, logo nunca irá matá-la. Se sente medo, da mesma forma não irá matá-la” – essa é a tese. Simbólica tese que reflete muito bem o tipo de sociedade eminentemente simbólica que vivemos, mas que precisamos ter a consciência disto. Eduardo Mascarenhas, conhecido psicanalista global, num dos seus livros foca bem a questão do medo da barata. Ressalta que há pessoas que têm medo verdadeiro de cobra, de leão, de onça, etc., mas de barata? O motivo é simples: nunca se soube notícia acerca de uma barata que, como uma cobra matou alguém. Mas há quem tenha medo e esse medo é simbólico, segundo o psicanalista já falecido e que ficou famoso por ter tido um caso com uma importante atriz da rede globo de televisão. Concordar ou não com a colocação simbólica de Mascarenhas é direito de cada um, mas reconhecer que o simbolismo norteia nossas relações sociais é razoável. Outro ponto, já fazendo um gancho, é a questão da sexualidade no viés da simbologia e da projeção. A sexualidade em suas diversas versões é um pouco de tudo isto e de tudo isto é ainda muito mais quando a gente se encontra dentro da questão. O homem não nasceu homem nem mulher. O homem nasceu SER HUMANO que é sexualizado. Essa sexualização acredito, diante da necessidade histórica do homem a tudo mistificar, dividir, separar, contextualizar, simbolizar... No processo histórico a sexualidade humana virou mais símbolo do que precisaria para ser o prazer da vida acrescido pela iniciativa da amorização. Parte-se a sexualidade na conveniência simbólica das culturas e das sociedades. Homem, mulher, LGBT – Lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros. A rigor, só existem HOMEM E MULHER, se considerarmos a sociedade como “madura” para a convivência dos diferentes. Esse patrulhamento que ainda hoje, em pleno século XXI, subsiste, originou-se, dentre outros, nos porões das igrejas e nas latrinas dos palácios. Podemos até arriscar dizer que o preconceito foi estabelecido como forma de dominação dos poderosos supostamente “normais”. Eles, dentro das suas “anormalidades” ficariam imunes a respeito do que de fato são, dentro da lógica do “não basta não ser, mas é preciso demonstrar”... 

“Jogar o lixo pra debaixo do tapete”, “por debaixo dos panos”, dentre outros jargões populares representam o simbolismo da falsa moral que tão bem se utiliza dos símbolos. Gay do armário é um símbolo. Homem chifrudo é outro. Frango, Baitola, bicha, viado, etc., são outros designativos da sexualidade masculina pouco ortodoxa. “Tapar o sol com a peneira” é mais um símbolo que os populares utilizam para comunicar sua sabedoria. Como se vê, somos eminentemente simbólicos. Um simples olhar de soslaio poderá nos levar a mudança de comportamento importante. Assim, desfruta a sexualidade humana de componentes deveras fortes para que a simbologia se torne mais evidente aos nossos olhos, embora haja controvérsias. Isto se estrutura em função de que o homem em sua trajetória sempre se escondeu em sua sexualidade. Diferente das atitudes sociais, por exemplo, de se discutir em plena hora do almoço acerca dos problemas do trabalho. Da sexualidade poucos abordam enquanto tema de conversa em família, por exemplo. 
A “surdina” com que a sexualidade foi tratada no processo histórico reflete as estruturas de poder autoritário que sempre norteou as civilizações. Sabe-se que, no fundo, não há mistérios entre homem e mulher que se gostam, mas tudo é passado em forma de mistério, pois os mistérios são factíveis às dominações. Por isto talvez que hoje a gente tente, nem sempre com maestria, falar tanto em sexo como se fosse sexualidade e em sexualidade como se fosse sexo. Na verdade as fontes são parecidas, mas não são a mesma correte de “eletricidade” afetiva. 

Percebe-se que o ser humano, eminentemente simbólico como tudo faz crer, projeta-se no outro em forma de simbolismo até pra se proteger. Essa proteção nem sempre é consciente, mas permite a um interlocutor experiente que logo se detecte, via simbolismo, elementos questionáveis de sexo e sexualidade. Exemplo disto, grosso modo, pode ser aquela atitude conhecida de alguns homens que exageram no patrulhamento contra gays. No geral, está embutida uma projeção simbólica de algo que, provavelmente lhe incomode por dentro. Ver um gay passando por perto, pode representar inconscientemente, para alguém, um modelo que carregue dentro de si. A homofobia, na maioria dos casos, representa “matar a bicha que tem dentro do homofóbico”... E não poderia ser diferente, posto que a quem mais interessaria matar uma pessoa que nenhum perigo representa e que, no caso de fazer mal, seria exclusivamente a ele? Portanto, a tese de que os homofóbicos matam, simbolicamente, os gays que tem dentro de si é bastante difundida nos meios acadêmicos. 

Mas e a barata, perdeu-se por falta de chinelo por perto? Não. As baratas continuam sendo os insetos mais resistentes do mundo. Nem mesmo diante da bomba atômica e diante do extermínio da humanidade por conta de explosão nuclear, a barata morreria. O simbolismo dela estaria na lógica do chinelo. Ter medo de barata seria, no entender psicanalista, ter medo de ser pisado, passado pra trás. Diante de uma barata a atitude mais comum e pisar e matar. Logo, ter medo de barata é próprio (SIC) dos que não gostam de ser pisados, humilhados. O difícil é achar quem goste disto, mas há quem de fato goste. Certamente que não deve haver meio termo nessa significação, pois tudo leva a crer que ter medo de barata implica também ter nojo e ter nojo o contrário, não nessa mesma ordem, mas nessa analogia psicanalítica que poderá ser seguida, perseguida ou esquecida em nome da simbologia.